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América Latina

Quem está se isolando, a Venezuela ou o Brasil?

Articulista petista no 247 ataca a Venezuela, os BRICS, a Rússia e a China, enquanto atiça e oculta os interesses dos EUA em gerar um conflito entre Brasil e Venezuela

Na última quinta-feira, 31 de outubro, o portal Brasil 247 publicou a coluna “Alguns esclarecimentos sobre a Venezuela”, assinada por Marcelo Zero, sociólogo e assessor da liderança do PT no Senado. A peça se soma aos ataques que vem sendo desferidos ao país pelo governo Lula.

De início, o autor parece tomar a posição de defender a soberania nacional e a cooperação entre os países da região, o que, contudo, é desmentido já no terceiro parágrafo:

“A imprensa conservadora está comemorando a crise diplomática entre Brasil e Venezuela. Não deveria. Relações diplomáticas são estabelecidas entre países; não entre governos. Crise diplomática, especialmente com vizinhos, é sempre ruim para os interesses nacionais. 

Além disso, essa crise bilateral é negativa também para a integração regional. Temos de evitar qualquer importação de conflitos geopolíticos para nossa região.

Ao contrário do que alguns ‘analistas’ desinformados afirmam, o governo Lula nunca deu ‘cheque em branco’ para o governo Maduro.”

Ou seja, de relações diplomáticas, interesses nacionais e integração regional, Marcelo Zero passa a falar em “‘cheque em branco”, ou seja, em determinações do governo brasileiro ao governo venezuelano e, pior, em temas de política interna daquele país. Em outras palavras, Zero defende a imiscuição da diplomacia brasileira em assuntos sobre os quais não tem qualquer jurisprudência, que fogem de sua alçada completamente, e cujo único propósito é minar as relações diplomáticas entre Brasil e Venezuela, o que igualmente vai contra os interesses nacionais dos países e a integração regional latino-americana. Não há cheque algum a ser dado, pois ao Brasil não cabe sequer comentar a política interna da Venezuela, quanto mais exigir qualquer coisa do país vizinho.

O articulista chega então ao nível do ridículo, ao falar de um acordo proposto e mediado pelo imperialismo e supostamente destinado a levantar as sanções contra a Venezuela. O objetivo formal do Acordo de Barbados seria estabelecer o diálogo entre o governo venezuelano e a oposição fascista financiada pelo imperialismo:

“O Acordo de Barbados não foi inventado pelo Brasil.

Tal acordo foi mediado pela Noruega e recebeu apoio de muitos países. Recebeu apoio da Espanha, do México, da Colômbia, da União Europeia etc. etc. Até mesmo os EUA, que voltaram a precisar do petróleo venezuelano, apoiaram o acordo. O Brasil simplesmente somou-se a um esforço internacional para pacificar a Venezuela e levantar as duras sanções que tanto mal causam ao povo venezuelano.”

Ora, as sanções são impostas à Venezuela pelo imperialismo com vistas a debilitar e abrir margem a um golpe de Estado no país. Não há diálogo possível, pois o método do imperialismo, a dominação imperialista, não o admite. Por que um acordo do tipo levaria ao fim das sanções? Indicado no Brasil 247 como um “especialista em Relações Internacionais”, Zero parece ter uma compreensão a mais infantil possível das relações diplomáticas. Então, justificada a iniciativa golpista, Zero segue à ofensiva contra Maduro e o povo venezuelano:

“Todo o mundo esperava que o processo desse certo e que as eleições fossem lisas e transparentes. Infelizmente, isso não aconteceu. O Brasil, seguindo sua tradição diplomática, apostou em negociações e na paz.

Portanto, culpar o Brasil pelos desmandos do governo Maduro e pelo fracasso do processo é simplesmente ridículo.

Quem está sendo derrotado é o próprio governo Maduro, o qual está cada vez mais isolado.

O Brasil, em contraste com as agressões descabidas e surreais do governo de Maduro contra Lula e Celso Amorim, continua a apostar na continuidade das relações diplomáticas, no diálogo e na paz.

O governo Maduro, contudo, parece querer investir no antigo isolacionismo regional, que caracterizou, por muito tempo, a política externa venezuelana.”

Veto a entrar nos BRICS, disse o governo Lula. Negociações e paz, diz Marcelo Zero. E ninguém demonstra onde está a tradição diplomática brasileira, de respeitar a soberania dos povos. Frente a tal medida absurda, as críticas justas do governo venezuelano são tratadas por “agressões descabidas e surreais”, o que é demonstração ainda maior do grau de especialização que possui Zero quanto às relações internacionais.

O pueril analista ainda tem a coragem de falar em derrota e isolamento do governo Maduro, que, diferente do governo Lula, tem a coragem de enfrentar frontalmente os interesses imperialistas na região. Segundo Zero, Maduro “investe no isolacionismo”, o que nada mais é que uma declaração do nível de cara-de-pau do articulista. A desfaçatez é tanta, que o sociólogo busca inverter a situação:

“Na década de 50 do século passado, a Venezuela já havia se convertido no segundo produtor e no primeiro exportador mundial de petróleo. Essa notável afluência econômica foi obtida numa relação de estreita dependência com os EUA, o principal comprador do óleo venezuelano.

Dessa forma, a política externa venezuelana, durante décadas, apostou apenas nessa relação bilateral privilegiada. Virou as costas para seu entorno.”

Ou seja, não é o Brasil que atenta contra a Venezuela, mas ela é que teria uma tradição isolacionista. Não se trata aqui de ingerência imperialista, que subordinou o país durante um longo período a ter relações quase exclusivas com os EUA. Para onde vai isso, porém?

“Já no período chavista, houve modificação profunda da política externa venezuelana, e Chávez passou a ser um entusiasta da integração regional. Tinha boas relações até mesmo com a Guiana.

Agora, o governo Maduro parece estar desinvestindo na integração regional e apostando em suas relações com potências extrarregionais, como China e Rússia.”

Marcelo Zero não só ataca a Venezuela, como revela seu alinhamento: ataca a Venezuela, e na sequência, a China e a Rússia. Trata-se de uma peça inegavelmente direcionada pelo imperialismo norte-americano. O articulista equivale a postura da Rússia e da China à dos EUA na América Latina, a posição de um verdadeiro capacho do imperialismo. Então, retorna aos ataques sobre as eleições, como se tivessem qualquer significado real que não o mais puro golpismo:

“Com efeito, Maduro está brigando com a maioria dos países da nossa região, mesmo com os amigos tradicionais, em razão dos justos questionamentos sobre as eleições.

É uma espécie de volta ao isolacionismo regional, com sinais geopolíticos trocados.

Isso é muito ruim para os interesses brasileiros e para toda região.”

Em sua conclusão, fica ainda mais claro o alinhamento de Marcelo Zero:

“A América do Sul e a América Latina não podem ser palco de conflitos e disputas geopolíticas. Temos de fugir da agenda estéril e contraproducente da nova Guerra Fria.

Temos de investir em integração, diálogo e paz.

A diplomacia brasileira tem de persistir em tolerância e racionalidade. 

Os celerados que gritem sozinhos. Isso não vai resolver nada. As sanções não serão levantadas e ninguém vai entrar no BRICS insultando o Brasil.”

Toda a intervenção, golpes, massacres perpetrados pelo imperialismo na América Latina são desconsiderados pelo autor. A região não pode ser palco de conflitos e disputas, como se isso dependesse dos interesses locais. Uma farsa.

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