O deputado federal e candidato à prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, do PSOL, em sabatina realizada no dia 17 de outubro, afirmou que “deixamos de falar com a parcela que foi buscar sua prosperidade de outra forma, por conta própria. Virando MEI, virando Uber”.
A defesa do empreendedorismo é uma política neoliberal e não é possível tergiversar sobre isso. Ideologicamente, é uma propaganda utilizada pela direita para destruir a economia nacional, jogar a população na miséria, acabar com os empregos e os direitos trabalhistas, diminuir os salários, e depois dizer que o cidadão que faz qualquer coisa para sobreviver nessas circunstâncias, na verdade, é um empreendedor.
Por outro lado, a esquerda brasileira, em geral, costuma criticar essa ideia pelo ângulo errado. A propaganda e a situação da economia brasileira é culpa de uma burguesia nacional subserviente ao imperialismo, não da pessoa que encampa essa ideia na tentativa de sobreviver.
É comum ver pessoas de esquerda criticando o Uber que se considera um empresário. Usa-se muito a expressão “pobre de direita” para ridicularizar essas pessoas que, muitas vezes, são capturadas pelo discurso bolsonarista que, embora falacioso, apresenta alguma política para essas pessoas. Esses setores da esquerda colocam no povo a culpa das ilusões impostas a ele pela burguesia.
De fato, é necessário travar uma luta ideológica contra a direita, denunciando que a ideia do empreendedorismo não passa de um engodo. É preciso mostrar para os trabalhadores, tenham eles carteira assinada ou não, que essa farsa é uma política contra os direitos de toda a população. No entanto, é uma postura muito arrogante achar que quem tem essa ilusão a tem por um problema de capacidade cognitiva ou coisa que o valha.
Do ponto de vista do programa político dos setores da esquerda que defendem Boulos, essa declaração revela o nível de oportunismo desses grupos. Primeiro, atacam todo trabalhador que acredita que é um empreendedor, ao invés de buscar desfazer a ilusão apontando a política correta. Mas, ao mesmo tempo, no desespero das eleições, não veem nenhum problema em jogar no lixo suas próprias ideias e passarem eles mesmo a defenderem o empreendedorismo.
Para esses setores, os votos que Pablo Marçal (PRTB) teve foram porque ele defende essa ideia. Nada poderia ser mais distante da realidade. Marçal se destacou por se apresentar como um candidato diferente do resto, que não tem os mesmos discursos prontos, que se apresenta como um cara “de fora” da política. Ao contrário de Boulos, Nunes e cia, ele se apresentou como alguém que detesta essas manobras políticas como defender uma política quando parece oportuno, mas defender a política inversa no momento seguinte. Boulos e seus apoiadores mostram não só uma grande dificuldade de fazer uma análise política concreta, como aproveitam para revelar o mais alto grau de oportunismo.
Para atacar as pessoas que têm essa ilusão, não tem problema ser agressivo. Mas se for para ganhar um ou outro voto, vale até mesmo incentivar a ideologia neoliberal.
Ainda, essa posição de Boulos em defesa do empreendedorismo, que poderia ter sido expressa por Ricardo Nunes ou até mesmo pelo próprio Bolsonaro, vem na sequência das várias posições direitistas que o candidato do PSOL colocou desde que se apresentou como candidato às eleições municipais. Boulos disse a infame frase “não sou candidato a prefeito de Telavive” quando questionado sobre o genocídio em curso na Faixa de Gaza, mas mesmo sem ser candidato a prefeito de Caracas, criticou duramente o governo venezuelano, de Nicolas Maduro, em sua luta contra o imperialismo. Seu programa inclui dobrar o efetivo da Guarda Civil Metropolitana (GCM) de São Paulo, conhecida por reprimir violentamente os trabalhadores. Sobre as ocupações, seu principal cavalo-de-batalha como esquerdista, Boulos disse que não vai “prevaricar”, o que, na verdade, significa que não vai se opor aos despejos.
Já tendo incorporado o programa político do PSDB e parte importante do programa repressivo do bolsonarismo, agora Boulos incorpora também as propostas neoliberais demagógicas de Pablo Marçal, que supostamente seria o maior inimigo da esquerda.