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Eleições municipais

Banir um direitista dos debates contribui mais para o fascismo que deixá-lo falar

Se o autoritarismo de Marçal tem algum perigo, é justamente por encontrar eco em uma pequena burguesia já disposta a aceitar a repressão como forma de resolver problemas políticos

O artigo Nuances nas eleições municipais, assinado por Adilson Roberto Gonçalves e publicado no Brasil 247, revela de forma crua e direta as tendências autoritárias que há tempos vêm contaminando parte da esquerda pequeno-burguesa. Disfarçada de preocupação democrática e social, essa postura tem se mostrado uma linha auxiliar das práticas repressivas e antipopulares, muito úteis para pavimentar o caminho para uma ditadura fascista que o autor diz combater.

A primeira observação feita por Gonçalves, questionando a participação de Pablo Marçal nos debates eleitorais, é um exemplo claro desse comportamento. “Não consigo entender por que convidam Pablo Marçal para os debates, uma vez que a legislação eleitoral não obriga”, afirma, quase que pedindo por mais censura aos já limitados debates políticos.

Ora, nada mais democrático do que os cidadãos conhecerem todas as correntes políticas que disputam um cargo eletivo. O fato de a lei não obrigar é antes um indicativo de que a Justiça Eleitoral não existe para garantir a lisura do processo eletivo, mas sua manipulação. Se for para seguir à risca as limitações impostas pela burocracia eleitoral, estaríamos simplesmente eliminando o debate e transformando o processo político em um espetáculo para poucos, restrito apenas àqueles considerados “aptos” pela visão estreita da classe média.

Ao sugerir a exclusão de Marçal dos debates, Gonçalves se iguala àqueles que clamam pela censura como forma de proteção contra ideias e figuras indesejadas. Ele não se dá ao trabalho de responder às ideias do candidato com argumentos ou de propor um contraponto; ao contrário, prefere esconder o adversário embaixo do tapete, como se isso fosse resolver o problema.

Essa atitude é sintomática de uma classe média que, sempre que se vê ameaçada, clama por mais repressão, seja na política, na economia ou no comportamento da população. No mesmo texto, Gonçalves demonstra esse fenômeno ao abordar a questão da crise hídrica. Critica o “rodízio branco” – nome dado à prática dos prefeitos de cortar a água sem aviso prévio para não se desgastarem politicamente –, mas logo desvia o foco para o que realmente lhe interessa: a possibilidade de denúncias de suposto consumo excessivo de água e de cidadãos lavando calçadas, como se esse fosse o problema da falta de água em algumas regiões. Ele lamenta que não seja possível fazer denúncias com fotos e vídeos de pessoas “infratoras”, uma fala que denuncia a verdadeira mentalidade do autor e da classe a que representa.

Em vez de exigir que a prefeitura forneça o serviço de água e invista o necessário para que a população disponha desse item essencial à vida, a política dele é delatar a população e colocar o povo na mira da repressão estatal. É um comportamento extremamente autoritário e antissocial, revelador das tendências fascistas da pequena-burguesia que se diz progressista.

Em referência ao clássico de Ingmar Bergman, “O Ovo da Serpente”, Gonçalves caracteriza a participação de Marçal nos debates como trampolim ao nascimento de um novo fascismo, como se o candidato fosse capaz de contaminar a sociedade ao ponto de eclodir uma nova ordem autoritária. A metáfora é claramente exagerada e ilustra um medo irracional e histérico do autor, que não percebe que, ao propor a exclusão de um candidato sob o pretexto de “proteger a democracia”, é ele próprio quem está chocando o ovo da serpente. Eclode aí o fascismo daqueles que se dizem antifascistas.

Se Marçal está disposto a qualquer loucura, como o autor sugere, então o que dizer da própria esquerda, que naturalizou a perseguição política e a censura de figuras que não se enquadram em seus estreitos moldes ideológicos? Parece que Gonçalves esquece que não é a presença de Marçal nos debates que ameaça um regime democrático, mas a tentativa de suprimir e censurar vozes indesejadas. O verdadeiro perigo está na mentalidade da própria esquerda, que tanto fala em antifascismo enquanto reproduz práticas autoritárias.

O trecho que segue é um exemplo ilustrativo dessa política:

“Nessa questão, chama à atenção também a crise hídrica pela qual estamos passando. A seca impera próximo às eleições municipais e muitos prefeitos estão fazendo o rodízio branco, em que os candidatos à reeleição, para não ficarem mal com a população, estão interrompendo o fornecimento de água sem aviso. O voto fala mais alto do que a economia de água. Além disso, não é possível fazer denúncias com fotos e vídeos de gente lavando calçada, porque o que vale é o consumo mensal. Os que possuem imóvel em outro lugar, na praia por exemplo, se dão ao luxo de desperdiçar sem medo de multas.”

Se os gestores públicos, ao invés de cortarem o fornecimento de água, tratassem de resolver o problema da seca por meio dos investimentos necessários para isso, esse tipo de situação nem existiria. Ao invés de apontar para a responsabilidade dos políticos direitistas que Gonçalves alega criticar, ele prefere desviar a culpa para o cidadão comum. A classe média representada pelo autor só enxerga o problema quando é o “povão”. E como resolver? Com mais punição! Vamos delatar quem lava a calçada! Quem se importa se o pobre está apenas tentando manter o lugar onde vive minimamente habitável? Como se vê, essa é a receita da repressão a qualquer custo, e a esquerda pequeno-burguesa se tornou mestre em disfarçá-la como “preocupação social”.

Por medo de perder seus poucos privilégios, a classe média defende a expansão da repressão mesmo que isso signifique sufocar as massas populares. É uma classe que, se pudesse, instituiria um Estado policial sob o pretexto de manter a ordem e a justiça, mas que, na prática, só empurra a população para o arbítrio e a violência. Sob essa ótica, não é exagero afirmar que o comportamento de Gonçalves já é a manifestação de um fascismo latente, presente mesmo em setores que se identificam com a esquerda.

É o caso de se perguntar: quem são realmente os “ovos da serpente” aqui? Se o autoritarismo de Marçal têm algum perigo, é justamente porque encontram eco em uma pequena burguesia já disposta a aceitar a repressão como forma de lidar com qualquer tipo de problema social. E é exatamente esse o comportamento que Gonçalves exemplifica.

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