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Apostas esportivas

Pior que o vício em apostas é a repressão pelo Estado

Advogada usa estratégia da chantagem emocional tipicamente direitista para defender mais repressão contra a população

Em artigo publicado no jornal burguês Folha de S. Paulo e intitulado É urgente agir contra o vício em apostas online, a advogada Maria Inês Dolci, defende que “as apostas online e seus impactos já chegaram aos adolescentes, provocando danos variados, tanto psicológicos como financeiros”. “O avanço indiscriminado das bets e seus efeitos na vida dos adictos fez com que o senador Omar Aziz sugerisse, há cerca de uma semana, suspensão dessas empresas até que essa atividade seja regulamentada”, destaca Dolci, recorrendo a um artifício típico da extrema direita. E continua:

“A invasão das bets ganhou novos contornos com a acusação de pré-instalação de aplicativos de casas de apostas em telefones celulares. É muito grave, caso se confirme, que seja tão facilitado, assim, o acesso ao jogo, que já está contribuindo para o endividamento dos brasileiros. Mas é ainda mais absurdo que esses apps estejam disponíveis em aparelhos que podem ser usados por menores de idade. A Senacon (Secretaria Nacional do Consumidor) solicitou esclarecimento aos fabricantes de celulares até o final deste mês.”

A advogada demonstra conhecimento do manual da extrema direita ao evocar a demagogia em torno da proteção de crianças e adolescentes para justificar uma proposta repressiva contra as apostas online, conhecidas como bets. O que a autora faz, de forma superficial, é utilizar o velho estratagema de manipulação emocional, ao focar em menores de idade como vítimas indefesas de um mal social.

Não é novidade que esse tipo de discurso seja empregado como uma arma para justificar medidas autoritárias, afinal, quem pode ser contra a “defesa das crianças”? Esse expediente de ocultar interesses muito mais profundos por trás de uma retórica moralista é típico de setores da extrema direita, que buscam com tais argumentos avançar em políticas de controle social e repressão.

A questão das apostas online, no entanto, deve ser encarada com outra perspectiva. A autora quer fazer crer que a verdadeira ameaça reside nos aplicativos que podem estar instalados nos celulares, acessíveis a adolescentes e a outros segmentos vulneráveis da sociedade.

O foco em questões psicológicas e financeiras, atribuídas ao vício das apostas, é a cortina de fumaça usada para obscurecer a real intenção: fortalecer uma campanha burguesa contra um setor que se apresenta como concorrente direto das tradicionais formas de extração de dinheiro da população. Ao levantar o fantasma do vício entre jovens, a advogada apenas reforça a velha tática moralista de justificar a repressão estatal sob o pretexto de “salvar” a sociedade de seus próprios vícios.

O mais problemático de tudo isso, porém, não são as apostas ou o impacto que possam ter na vida dos jogadores, mas sim o fato de o Estado utilizar artifícios morais para implementar políticas repressivas. A intervenção estatal sob a justificativa de combater o vício em apostas é a ponta de lança de uma política que, em essência, visa controlar e reprimir a população.

Ao invés de buscar soluções econômicas que enfrentam as verdadeiras causas das pressões econômicas e da miséria, Dolci defende que o governo invista em controle, policiamento e ataques a direitos, sempre embasadas em justificativas moralistas e paternalistas. Essa prática não é nova e sempre ganha força nos momentos em que as tendências fascistas da direita afloram.

Historicamente, a burguesia e seus representantes no governo se aproveitam de crises ou “epidemias” sociais, como o jogo, para justificar a repressão e desviar o foco do verdadeiro problema: a situação econômica que empurra milhões para situações desesperadoras. O moralismo sempre foi o manto sob o qual se esconde o caráter reacionário de muitas dessas políticas, que, na prática, só aprofundam o controle sobre os setores mais vulneráveis da sociedade, enquanto os verdadeiros causadores da miséria social – os banqueiros, empresários e seus aliados no governo – seguem intocados.

O grande erro da abordagem de Dolci é justamente acreditar que a repressão resolverá o problema. Assim como outros tipos de dependência, o vício em jogos é um reflexo direto das condições de vida da população.

Num cenário onde a economia está afundada em crise, com salários rebaixados e o desemprego em alta, muitos veem nas apostas a única saída para melhorar suas condições de vida, ainda que de forma ilusória. Não são as bets, isoladamente, que criam o vício, mas sim a pobreza e a falta de perspectivas. A repressão, nesse sentido, é apenas uma tentativa fracassada de maquiar o problema sem enfrentar suas causas.

Dolci e outros moralistas de plantão nunca mencionam, entretanto, o papel da política econômica na proliferação desse tipo de problema. Afinal, é muito mais fácil apontar o dedo para as bets do que para a verdadeira raiz da questão: o aprofundamento da desigualdade social, causado por políticas que privilegiam os lucros dos grandes capitalistas, enquanto a população é jogada na miséria.

A crise econômica, agravada por um sistema que enriquece banqueiros como Luiz Frias, proprietário do Grupo Folha, é a verdadeira responsável por levar tantas pessoas a buscar alternativas desesperadas como o jogo. Enquanto isso, a burguesia, através de seus veículos de comunicação, promove campanhas moralistas para desviar a atenção daquilo que realmente importa.

O que se vê, portanto, é um esforço coordenado para manter o foco no que há de mais superficial. O discurso moralista contra o jogo é uma cortina de fumaça para encobrir a incapacidade – ou, mais precisamente, a falta de vontade – de resolver os problemas econômicos que empurram a população para o desespero.

Ao invés de atacar as casas de apostas, o Estado deveria estar preocupado em garantir condições de vida dignas, com salários que permitam à população viver sem a necessidade de recorrer a jogatinas. O moralismo burguês, no entanto, prefere sempre a via da repressão, porque ela mantém intacto o sistema de exploração.

É a política econômica que empobrece os trabalhadores que deve ser responsabilizada pelo “vício” em apostas, não os próprios jogadores, e isso não será resolvido com a repressão, mas com um programa de desenvolvimento. É preciso deixar claro que qualquer medida repressiva contra as apostas online não resolverá o problema.

A questão central é a pobreza e a falta de oportunidades, e isso só pode ser enfrentado com uma política econômica que coloque os interesses dos trabalhadores em primeiro lugar, ao invés de proteger os lucros dos grandes capitalistas. Enquanto essa política não for alterada, não haverá solução real para o que é, na verdade, um problema de desigualdade social. Só haverá a boa e velha solução favorita da direita, que é a repressão.

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