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Extrema direita

Fascismo não surge de ‘machos inseguros’, surge do imperialismo

Jornalista alega que a extrema direita é decorrência da insegurança masculina, transferindo um problema da política para esfera da psicanálise

O artigo “O mundo dos héteros inseguros de Tallis Gomes é o mesmo de Pablo Marçal”, assinado por Moisés Mendes e publicado no Brasil 247 neste domingo (22), é mais um exemplo de como setores que se dizem de esquerda abraçam a censura para solucionar quaisquer desacordos, mesmo os mais banais, como uma diferença de opiniões.

Para se falar, pelo jeito, é preciso que existam pré-requisitos. Mendes questiona: “Um sujeito que teme a liderança das mulheres pode falar de crise climática, empreendedorismo e preparação do mundo para as novas pandemias? Pode vender seu modelo de liderança como inspirador de condutas, inclusive entre as mulheres?”. O que uma coisa tem a ver com a outra é que constitui um mistério. Digamos, um sujeito especialista em medicina preventiva que, por algum motivo, tema a liderança de mulheres não pode falar sobre prevenção de pandemias? Por quê? Qual é o nexo?

Pelo jeito, para a esquerda beata será preciso ter a ficha limpa, não ter passagem na polícia de costumes para se obter o direito à palavra. Se descobrirem que um sujeito, quando tinha oito anos, chamou o coleguinha de gordo, será o suficiente para ser cancelado e condenado ao purgatório.

Segundo Moisés Mendes, se nós considerarmos que Tallis Gomes não tem direito de falar em liderança, tentar ser inspirador de condutas, seria o mesmo que dizer que “Pablo Marçal não está habilitado a tratar de questões éticas e morais, ou que Malafaia não pode falar em nome de Deus”. Se alguém pertence a determinado grupo característico de pessoas, pode ser impedido de falar.

Na verdade, Mendes diz que sim, eles podem falar e falam, o que quiserem “Pablo Marçal não está habilitado a tratar de questões éticas e morais, ou que Malafaia não pode falar em nome de Deus”. E não apenas isso, mas que “eles só não existiriam como são se o brasileiro levasse em conta regras mínimas do que é sensato e razoável, como as que ainda existiam no século de 20, mesmo que precariamente. E se a idiotia não tivesse se alastrado”.

Até onde se sabe, o “século de 20” não era lá aquela maravilha, então, esse saudosismo não corresponde, não cabe. Tivemos ditadura militar, censura, grupos defendendo a tradição, a família e a propriedade. Seria o caso de se listar quais seriam as tais “regras mínimas”.

Cancelamento

Tallis Gomes proferiu a frase “Deus me livre de mulher CEO”, o que ocasionou seu “cancelamento”, “perdeu o cargo de CEO de uma das suas empresas, a G4 Educação. Foi substituído por uma mulher”. Uma punição “exemplar”, “didática”, alguns diriam.

Moisés Mendes se mostra indignado porque “basta que seja um empreendedor de sucesso, incapaz de refletir não só sobre mulheres, mas sobre a vida em seu sentido coletivo. Basta que tenha lições de como ficar rico. Que saiba contar como ficou milionário e consiga convencer os outros de que, com esforço individual, qualquer um também pode”. Ora, bem-vindo ao liberalismo. Não era justamente o que se vendeu por décadas?

Isso que Mendes critica, talvez ele não se lembre, estava presente no século passado, e vem de antes.

As eleições

Neste ano eleitoral, no qual o PT resolveu apoiar um candidato do PSOL à prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos, e este vem tendo um desempenho ruim, a esquerda resolveu atacar Pablo Marçal, um dos candidatos que ameaça Boulos, de todas as maneiras possíveis. Contra ele, vale tudo. Mendes diz, por exemplo, que “Thallis Gomes e Pablo Marçal são diferentes apenas nos detalhes, mas na essência vendem os mesmos sonhos. Mesmo que os aplicativos de Thales funcionem e os cursos de Marçal sejam acusados de pilantragem na Justiça, ambos são da mesma turma”. Seria algo como afirmar que a frase infeliz da “mulher CEO” não foi dita por Marçal, mas teria sido.

É preciso usar desses expedientes para tentar melhorar a situação de Boulos de qualquer maneira, uma vez que o candidato não empolga. Quanto mais Guilherme Boulos fala, mais a classe trabalhadora percebe que o sujeito que surgiu na política imitando a voz de Lula é, na verdade, um imitador de FHC (Fernando Henrique Cardoso). Está mais para um Gabriel Boric, que se elegeu com o voto popular se fingindo de esquerda e que não passa de um fantoche do imperialismo.

A esquerda no divã

Uma das manias da esquerda pequeno-burguesa é tentar psicanalisar tudo, inclusive a política. É por isso que encontramos pérolas como esta, que afirmam que “desprezar as mulheres não é um detalhe, é da essência da maioria dessas figuras, porque o ativismo ultraconservador só existe por ser liderado por machos brancos. A extrema direita é também um fenômeno da insegurança de héteros vacilantes ativistas ou não de facções de red pills.

Desde quando o fascismo, a extrema direita, seria um problema de “insegurança de héteros vacilantes”? Se isso fosse verdade, fazer política não seria necessário, bastaria colocar um psicanalista no poder – ou melhor, uma psicanalista, para não nos acusarem de misoginia – que tudo estaria resolvido. Hitler teria seguida sua inclinação para pintura em vez de se tornar um ditador e Mussolini, talvez, preferisse tentar a sorte cantando ópera.

A opressão da mulher também não tem relação com insegurança de machos, é uma decorrência do desenvolvimento econômico que as relegou a um papel secundário na produção. Não existe empreendimento moral capaz de reverter essa realidade. Não é a igrejinha identitária que trará de volta a igualdade das mulheres, ou das minorias, na nossa sociedade, mas uma mudança profunda nas relações econômicas e sociais. Apenas uma revolução socialista será capaz de realizar essa tarefa.

Os Pablos Marçais, os Tallis Gomes, essa gente vem crescendo não por conta do abandono de “regras mínimas” do passado, mas pela falência da esquerda, que a cada dia se confunde mais com o sistema, com a defesa das instituições do Estado burguês, como o Judiciário. É a insistência da esquerda em tornar heróis sujeitos como Alexandre de Moraes que tornam o terreno fértil para o surgimento de direitistas que se dizem contra o sistema e que vendem a promessa de um mundo melhor.

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