Na quinta-feira (1º), o ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou que as emendas parlamentares individuais que permitem a transferência direta de recursos públicos, chamadas de “emendas Pix”, devem atender aos requisitos da transparência e da rastreabilidade e ser fiscalizadas pelo Tribunal de Contas da União e pela Controladoria-Geral da União. A determinação vale inclusive para transferências feitas antes da decisão do ministro e será submetida a referendo do Plenário entre os dias 16 e 23 deste mês.
Dino determinou ainda que o Poder Executivo somente poderá liberar esse tipo de recurso aos destinatários após os parlamentares inserirem na plataforma Transferegov.br informações referentes às transferências, como plano de trabalho, estimativa de recursos para a execução e prazo da execução, bem como classificação orçamentária da despesa. As “emendas Pix” liberadas para a área da saúde, por sua vez, somente poderão ser executadas após parecer favorável das instâncias competentes do Sistema Único de Saúde.
Ainda segundo a decisão do ministro, a destinação dessas emendas deve ter “absoluta vinculação federativa”, ou seja, deputados e senadores só poderão indicá-las para o estado ou para município integrante do estado pelo qual foi eleito. A exceção existe somente no caso de o recurso beneficiar projeto de âmbito nacional cuja execução ultrapasse os limites territoriais do estado do parlamentar.
Em resumo, aprovando por completo essa resolução do STF, o governo Lula terá muito mais dificuldade de utilizar esse recurso que foi utilizado por todos os governos antes deles. Para Lula, isso é especialmente importante, pois a sua relação com o Congresso é muito difícil e esse mecanismo facilita a interação do presidente com os deputados.
O governo Lula então suspendeu o pagamento de todas as emendas de comissão e dos restos das emendas de relator para cumprir decisão do ministro Flávio Dino. A decisão do governo também suspende o pagamento de emendas individuais de parlamentares que enviaram recursos para estados pelos quais não foram eleitos. Isso só não tera um impacto tão grande, pois devido à lei eleitoral, o governo não pode iniciar processos de pagamentos de emendas a partir dos três meses antes as eleições. Mas a partir de outubro, a crise deve se abrir. Este prazo eleitoral começou em 6 de julho.
O governo ainda tem a possibilidade de derrubar a suspensão na terça-feira (9). Flávio Dino marcou para esta data uma reunião técnica entre assessores do STF, do Congresso Nacional, do Governo Federal, do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União. Nela, serão discutidos quais os procedimentos todas as partes envolvidas na execução das emendas parlamentares devem adotar para cumprir a decisão.
Orçamento secreto
Flávio Dino também determinou a adoção de regras para indicação de recursos públicos por meio das emendas parlamentares RP9, conhecidas como “Orçamento Secreto”. As medidas foram determinadas após audiência de conciliação realizada com representantes do Congresso.
Pela decisão do ministro, as emendas só poderão ser pagas pelo Poder Executivo mediante total transparência sobre sua rastreabilidade. Dino também definiu que as organizações não-governamentais (ONGs) deverão seguir as mesmas regras quando atuarem como executoras das emendas.
Segundo o ministro, a Controladoria-Geral da União (CGU) deve realizar uma auditoria de todos os repasses realizados pelos parlamentares por meio das emendas do “orçamento secreto”.
Em dezembro de 2022, o STF definiu que as emendas chamadas de RP9 são inconstitucionais. Após a decisão, o Congresso Nacional aprovou uma resolução que mudou as regras de distribuição de recursos por emendas de relator para cumprir a determinação da Corte.
Greve na CGU e no Tesouro Nacional
O cumprimento das ordens de Dino, no entanto, será prejudicado devido à greve na CGU e na Secretaria do Tesouro Nacional (STN), que se inicia na próxima terça-feira (6). O Comando Nacional de Mobilização e Greve do Unacon Sindical emitiu comunicado nesta sexta-feira (2) com as ações de mobilização previstas.
A greve, neste primeiro momento, será dividida em duas etapas: 48h de paralisação total das atividades nos dias 6 e 7 de agosto e, novamente, nos dias 13 e 14.
Outra medida que terá grande impacto na capacidade operacional dos órgãos é a entrega definitiva dos cargos de chefia, tanto na Secretaria Tesouro Nacional, quanto na Controladoria-Geral da União. A formalização começa nesta sexta-feira (2) e será concluída até o dia 13 de agosto. Os primeiros a pedirem exoneração dos cargos e funções serão Auditores e Técnicos Federais de Finanças e Controle lotados na STN, seguidos pelos lotados nas secretarias da CGU sede e nos estados.
Além disso, em ambos os órgãos, os servidores iniciam, já na segunda-feira (5), uma Operação Padrão com intensidade máxima, o que significará o atraso em todos os processos, como realização de auditorias e entrega de relatórios, no caso da CCU, e operações financeiras de transferências e pagamentos, no caso do Tesouro.
A mobilização é uma resposta à intransigência do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) na mesa de negociação. A categoria pleiteia, segundo o Unacon Sindical: “a retomada das tratativas e o aperfeiçoamento da proposta final, com o atendimento de pautas não remuneratórias, como a mudança no requisito de ingresso no cargo de Técnico Federal de Finanças e Controle e a manutenção dos atuais 13 níveis da tabela de progressão da carreira, além da revisão do percentual estabelecido com vistas à recuperação da simetria remuneratória com carreiras de mesmo nível”.
A greve pode adiar a disputa política entre STF e Governo Federal, mas diante da situação de Lula, ela é inevitável. O governo do PT se apoia sobre as ferramentas institucionais para governar, retirar uma delas é um ataque direto ao governo que depende de todos os recursos que tem para governar nesse momento de crise.