Nessa sexta-feira (19), o presidente nacional do Partido da Causa Operária (PCO), Rui Costa Pimenta, prestou depoimento à Polícia Federal (PF) em razão de um inquérito que investiga a prática de suposta “intolerância e/ou injúria racial, de cor e/ou etnia”. No dia anterior, Francisco Weiss Muniz, também membro do Comitê Central Nacional do PCO, depôs à PF.
As oitivas decorrem de um conjunto de três processos abertos junto à polícia civil: a investigação 2024.0016636, aberta pela Frente Ampla Democrática Pelos Direitos Humanos (Faddh); a investigação 2024.0015170, aberta pela Confederação Israelita do Brasil (Conib); e a investigação 2024.0018518, aberta por José Ivanilson Ramos. Nas peças apresentadas pelos acusadores, os dirigentes partidários, bem como outros integrantes do PCO e seus órgãos de imprensa, são acusados de “incitar” o racismo por suas posições a respeito do genocídio em curso na Faixa de Gaza.
Por repetidas vezes, os acusadores apresentam a reivindicação de “fim do Estado de ‘Israel'” e a defesa da legítima resistência palestina como prova de um suposto “antissemitismo” – isto é, um ódio dirigido aos judeus, que vem sendo equiparado ao racismo segundo as recentes decisões dos tribunais brasileiros. Essa interpretação, no entanto, não tem respaldo legal.
Em declaração exclusiva feita ao Diário Causa Operária (DCO), logo após o depoimento, Rui Costa Pimenta explicou que a oitiva consistiu, basicamente, em “perguntas banais” sobre as posições do Partido. Pimenta afirmou ter respondido a todas as perguntas e ter entregue um documento explicando as posições do Partido sobre as liberdades democráticas e sobre a situação no Oriente Médio.
Rui Pimenta classificou como “um fato preocupante”, “uma coisa grotesca” que o inquérito gire em torno de “dissecar quais são as opiniões do Partido”. O dirigente trotskista ainda destacou que “ninguém deveria ser levado diante da PF para explicar sua posição política”.
Esse mesmo método já havia sido criticado pelo próprio presidente Lula, nos anos anteriores à sua prisão. Em discursos públicos, Lula denunciou que havia sido constrangido a responder aos motivos que teriam o levado a escolher os diretores que escolheu para empresas públicas. Corretamente, Lula explicou, à época, que as indicações em um regime como o brasileiro muitas vezes são o resultado de acordos políticos – e que, portanto, deveriam ser discutidos no âmbito da política, e não da polícia.
O presidente do PCO também afirmou que explicou detalhadamente à Polícia Federal o entendimento do Partido sobre temas como o racismo e o terrorismo. “Somos contra o terrorismo individual, isto é, produzir alguns atentados na luta política como método de luta nosso”, disse ele. “Somos a favor do método de luta da mobilização das amplas massas, ou seja, um método democrático”, completou Pimenta, destacando que o Hamas nunca foi considerado uma organização terrorista, mas sim um grupo que luta pela libertação nacional. Ele também lembrou que o PCO apoia a luta do Hamas há décadas.
Nossa equipe também conversou com Francisco Weiss Muniz, interrogado no dia 18 de julho. Para o dirigente partidário, o depoimento teve “um caráter bastante burocrático”, uma vez que a defesa de Muniz enviou à Polícia Federal o mesmo depoimento mencionado por Rui Costa Pimenta.
“Na verdade, o delegado mesmo falou: ‘bem, vocês enviaram uma declaração para a gente, né? Aquela declaração já tem a resposta para tudo o que eu ia perguntar'”, revelou Muniz.
Em seu depoimento, Francisco Muniz explicou “que a nossa oposição ao Estado de ‘Israel’ é uma oposição política, ao Estado, ao sionismo, ao governo de ‘Israel'”, deixando claro que o Partido não tinha nenhuma oposição “aos judeus enquanto povo, nação ou raça”.
Segundo o dirigente partidário, o delegado teria se mostrado incomodado com o fato de ter de inquirir alguém devido a suas posições políticas. “É representação atrás de representação”, teria se queixado o delegado, indicando que os processos por crimes de opinião não param de chegar às delegacias.
Nem Rui Costa Pimenta, nem Francisco Weisss Muniz fizeram comentários sobre o prosseguimento do Inquérito. Apenas disseram que as perguntas feitas pela Polícia Federal já haviam sido devidamente respondidas pela declaração enviada previamente.
“Os nossos acusadores apresentam como crime, a realização de reunião do presidente nacional do PCO com o líder do Hamas, Ismayil Hanyeh em Doha, capital do Qatar”, diz o documento. “É importante dizer que o Hamas lá detém residência oficial sob a proteção do governo do Qatar, sendo considerado, portanto, uma organização legal. O encontro se deteve na discussão política, na solidariedade à luta palestina e no recolhimento de declarações e entrevistas com os líderes da organização e nada mais”.
A declaração também destaca que “os acusados têm flagrantes divergências políticas conosco e nosso partido e querem tornar essas divergências de cunho político num caso de polícia”. Essa prática, conforme apontado na declaração, consiste no chamado “Lawfare”, que o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Cristiano Zanin, define como uma instrumentalização do sistema jurídico para “servir como uma espécie arma de guerra”.
Leia, na íntegra, a declaração de Rui Pimenta e Francisco Muniz: