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Eleições na França

A esquerda francesa venceu?

Para colunista de Brasil 247, Macron foi "flagrantemente derrotado", mesmo após o golpe de mestre que mobilizou a esquerda para apoiá-lo de novo e para derrotar Le Pen

Na coluna intitulada A esquerda venceu na França e o povo quer levá-la ao poder (Brasil 247, 8/7/2024), a jornalista Denise Assis apresenta um curioso balanço dos resultados eleitorais no país europeu, apontando que o “tremendo desencanto” com o neoliberalismo levou os trabalhadores, “cegos de revolta”, a errarem “da esquerda para a ultradireita, provocando estragos fatais”. “O fenômeno”, continua, “assustou até mesmo os estudiosos, que não conseguiam entender como trabalhadores revoltados podiam pender para a ponta radical da ultradireita – o fascismo -, quando teriam amparo nos partidos de esquerda”. Será?

A própria jornalista reconhece um problema percebido pelos trabalhadores que a assusta, ao lembrar que, na França, “muitos declaravam que votariam num ou noutro (esquerda ou ultradireita), abandonando de vez os partidos que em sua maioria carregam em sua sigla a classificação de ‘socialistas’, mas na verdade agem para retirar-lhes direitos”, uma perfeita descrição não apenas do Partido Socialista, mas de quase a totalidade dos partidos de esquerda europeus, incluindo o trabalhista britânico.

Não é apenas que as direitistas agremiações ditas de esquerda “retira-lhes” direitos. François Hollande, por exemplo, fez uma espécie de governo Michel Temer piorado na França. No plano interno, um duro programa neoliberal, com isenções para as empresas e uma reforma trabalhista que antecipou a do próprio mandatário brasileiro em seus piores pontos marcaram os cinco anos de Hollande no Palácio do Eliseu (sede do Executivo francês). No exterior, nada menos que sete países africanos (Mali, Mauritânia, Níger, Burquina Faso, Chade, República Centro-Africana e Líbia) e dois países árabes (Síria e Iraque) foram invadidos pelo imperialismo francês, a pretexto de combater o terrorismo, no que produziram o verdadeiro terror.

Atenuar desta maneira os inúmeros crimes cometidos pelo PS francês dizendo que ele “retirou-lhes direitos” é quase uma cumplicidade. Os ditos socialistas franceses atacaram duramente a população e mandaram jovens soldados à morte nas inúmeras guerras que só interessam aos monopólios, e pelas quais as massas trabalhadoras pagam a fortuna que lhes é negada em salários e benefícios. Se “retira-lhes direitos” é a caracterização, como chamar um governo infinitamente menos belicoso do que Hollande, como o do fascista Donald Trump?

O texto prossegue com uma análise superficial do resultado eleitoral francês, com a autora dizendo “nem Marine Le Pen, tampouco Emmanuel Macron” são o que resultou da conclusão das eleições, que tiveram o segundo turno no último dia 7:

“A esquerda jogou toda a sua força, fruto dessa insatisfação com o ‘mais ou menos’ – muito mais para menos do que para mais -, do ponto de vista das pautas sociais, de Macron. Equivocado, ele partiu para uma manobra radical, a de chamar eleições ainda a três anos do fim do seu mandato (2027).

Numa tentativa de recuperar a própria imagem e preservar algum restinho de prestígio, fez acordo com Jean Luc Mélenchon, da França Insubmissa ou, como preferem alguns, da ‘esquerda radical.’”

Chama atenção o fato de Assis perceber a armadilha orquestrada por Macron, que como ela reconhece, buscou Mélenchon, líder do partido França Insubmissa (FI), mas demonstra uma incapacidade incrível de ver isso como parte do que a autora chama de “equivocada manobra radical”. Se há algo certo, observado o desfecho, é que não houve um “equívoco”, mas uma jogada arriscada que deu certo para o Eliseu.

Do impressionante desempenho da extrema direita francesa nas eleições para o Parlamento europeu, seguiu-se um primeiro turno avassalador. Mobilizando a esquerda, o imperialismo francês deu a volta por cima e ainda manteve o FI amarrado a uma coalizão direitista, a Nova Frente Popular, fazendo com que o PS e os igualmente pró-imperialistas do partido Europa Ecologia – Os Verdes capitalizassem também a tendência dos votos à esquerda. Uma jogada de mestre, por mais detestável que seja o inimigo, que, como demonstrado no resultado das duas últimas eleições europeias (França e Reino Unido), não deve ser subestimado.

“Paris fez a opção pela esquerda, mesmo sabendo que ao lado da Nova Frente Popular caminhou o macronismo, sem nenhuma garantia de que cumpriria – como agora dá mostras de que resiste ao resultado das urnas -, os compromissos assumidos.

Levou adiante o apalavrado, até a página dois. Sim, é certo que retirou candidaturas, tal como os seguidores de Mélenchon, onde havia perigo de o vencedor – em caso de três correntes postulantes ao parlamento -, ser da ultradireita. A estratégia funcionou e a França conseguiu barrar a assunção do fascismo. Flagrantemente derrotado, Macron regateia entregar o poder para a esquerda, apesar de pela regra do jogo, devesse fazê-lo.”

Ora, a opção da França pela esquerda genuína é antiga, tanto que desde sua primeira vitória eleitoral, em 2017, o insosso banqueiro elege-se não sob a base da popularidade do programa neoliberal, mas pelo golpe do “barrar o fascismo”. Chama atenção ver como Assis simplesmente esquece todo o histórico da era Macron para dizer que “a estratégia [abdicar da disputa em favor do melhor colocado nos distritos eleitorais onde houvesse um candidato da extrema direita] funcionou” e que o presidente fora “flagrantemente derrotado”.

Em primeiro lugar, a esquerda anular-se eleitoralmente, e colocar o enfrentamento ao Reagrupamento Nacional (RN, o principal partido da extrema direita francesa) é um golpe que vem sendo aplicado pelo imperialismo desde 2002, com a eleição de Jacques Chirac. O que um estrategista mais atento observaria é que a manobra vem perdendo força paulatinamente.

O fato de ter dado certo nas duas eleições de Macron e na queda de braço recente com Le Pen mostrou um Macron hábil em manipular a esquerda que o odeia, evidenciando que o presidente francês está tudo menos “flagrantemente derrotado” e não importa o que diga a suposta “regra do jogo”. Se a esquerda francesa capitula e cai nos golpes do Eliseu, o que ela demonstra, acima de qualquer coisa, é fraqueza, razão do tratamento dado por Macron ao FI. Por isso ele “regateia entregar o poder para a esquerda”, como reconhece a autora, mesmo demonstrando uma incapacidade impressionante de concatenar os fatos observados.

A mais importante lição a ser feita é a que Assis expressa de maneira inconsequente ao dizer que “só o enfrentamento pela esquerda iria produzir um governo que desse conta do cenário atual e da ameaça da ultradireita”. O que ela destaca como vitória, a submissão e a nova derrota da esquerda ao macronismo, mostra uma concepção muito limitada do que seria o “enfrentamento pela esquerda”, que, aqui, deveria se traduzir em uma ação do FI independente, sem nenhum compromisso com o Eliseu, com nenhum setor da burguesia, seja a ala pró-Le Pen, seja a que apoia Macron.

Sem uma esquerda independente da burguesia, o “enfrentamento” enaltecido não será outra coisa além de mecanismo para a manobra dos setores mais poderosos da direita. E golpes. “Aqui, na Inglaterra, na França” e em todo o planeta.

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