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Estados Unidos

O sionismo é o câncer da esquerda

Órgão dito socialista e anti-imperialista norte-americano atribui à Casa Branca um "encorajamento" às manifestações de apoio à Resistência Palestina

O órgão do Partido dos Trabalhadores Socialistas dos EUA (SWP, na sigla em inglês), The Militant, publicou uma matéria escandalosamente sionista em seu sítio, intitulada Jew-hatred, attacks spread worldwide after Hamas pogrom (Seth Galinsky, 8/7/2024), atacando grupos que convocam mobilizações em defesa do povo palestino como o também norte-americano Within Our Lifetime (“uma organização que pede a destruição de Israel”, informa) e fazendo uma defesa apaixonada da invasão sionista da Palestina, como se pode ver no trecho abaixo:

Os partidários do ataque assassino do Hamas contra os judeus em Israel lançaram uma série crescente de ameaças, ataques violentos e outras ações provocativas em todo o mundo, em uma tentativa de intimidar os judeus e qualquer pessoa que apoie o direito de Israel de existir como um refúgio para os judeus”.

É impressionante que o SWP, dizendo-se de esquerda, ignore completamente as monstruosidades causadas pelo imperialismo ao povo palestino e condene a mais do que justa reação dos palestinos a todas as barbáries que sofrem há quase cem anos, desde quando o imperialismo britânico ocupou a Palestina e começou a colonização do país árabe. Trótski (ele próprio um opositor do sionismo), jamais defendeu nada parecido com a política expressa no artigo, pelo contrário. Sua política era “contra o terror branco, o terror vermelho”, o que, adaptado para o principal conflito do planeta, poderia ser refraseado como “contra o terror sionista, o terror do nacionalismo árabe”.

Não contente com o sionismo escancarado, a matéria diz ainda que “o ódio aos judeus e os ataques contra eles já vinham aumentando em todo o mundo bem antes de 7 de outubro”, afirmação feita com a apresentação da fonte de orientação política dos “trotsquistas” norte-americanos: “conforme documentado em um novo relatório da Liga Antidifamação e da Universidade de Telavive”. É simplesmente inacreditável que um agrupamento político que se reivindica seguidor da política defendida por Trótski, oriente-se por “relatórios da Liga Antidifamação”, um escritório dedicado a promover censura e outras formas de perseguição política contra opositores do sionismo, e que, seguindo a canalhice típica da corja defendida pelo artigo de The Militant, considera qualquer coisa “antissemitismo”, incluindo este artigo de Diário Causa Operária e muitos outros seguramente.

“Os ataques se multiplicaram após o pogrom do Hamas”, continua a nota do órgão norte-americano, “quando os stalinistas e outros radicais de classe média saíram às ruas para comemorar seu ataque assassino”, destaca. Ora, com quase 38 mil palestinos mortos, dos quais mais de 14 mil são apenas crianças, salta aos olhos que o centro da preocupação de The Militant não seja a barbárie realizada por “Israel”, mas “Os manifestantes agitando bandeiras do Hamas e do Hesbolá, carregando uma faixa que proclamava: ‘Viva o dia 7 de outubro’.”

Não contente com o festival de posições reacionárias, The Militant joga a pérola principal da publicação:

Os apologistas do Hamas se tornaram mais provocativos, violentos e descarados ao atacar os judeus à medida que a guerra em Gaza progredia. Eles se sentem encorajados pelos apelos do presidente Joseph Biden e de outros governantes imperialistas [grifo nosso], apoiados pela covarde mídia liberal burguesa, para que pressionem Israel a encerrar sua guerra para eliminar o Hamas.”

Aqui, The Militant demonstra com clareza o alcance de sua disposição para defender o sionismo, empreitada para a qual qualquer loucura vale. Todas as declarações e ações dos governos imperialistas (e em especial dos EUA) são de apoio total a “Israel”, mesmo nas piores atrocidades feitas pela ocupação contra o povo palestino. Dizer que Biden encoraja defensores do Hamas não é apenas ultrapassar os limites da verdade, mas quase uma declaração de alienação patológica.

Acaso estavam os militantes do SWP dormindo enquanto o governo de seu país, o pior inimigo dos trabalhadores e dos povos oprimidos em todo o planeta, enviava armas e bombas a “Israel” para aumentar a horrorosa cifra de mulheres e crianças mortas pelos sionistas? Estariam brincando de fazer política enquanto em seu próprio país, seu governo bloqueava unilateralmente qualquer esforço diplomático para pressionar a ditadura sionista a parar o morticínio de civis que chocou a humanidade? O que estavam fazendo enquanto os EUA apoiavam o bloqueio genocida da Faixa de Gaza, impedindo a entrada de mantimentos básicos como água, eletricidade, comida e medicamentos? Seriam defensores de crimes contra civis como esse quando perpetrados pelos EUA contra a paupérrima vizinha ilha de Cuba?

A total submissão à política do imperialismo se expressa também em outra passagem, quando o autor reproduz uma mentira comum apresentada pelos sionistas para fugir aos questionamentos pelos crimes e usar o povo judeu de conjunto como escudo, o que por sinal, tanto criticam na Resistência Palestina sem no entanto provar o que dizem. Ainda sobre a manifestação ocorrida na cidade de Nova Iorque, o órgão escreve:

Um cartaz de destaque na ação dizia: ‘Os sionistas não são judeus e não são humanos: Eles são o mal do mundo’. Nos slogans desses grupos, a palavra “sionista” é simplesmente um código para “judeu”. Quanto a dizer que “os sionistas não são humanos”, não há como confundir a ameaça nazista.

Porque “sionista” seria “um código para ‘judeu’” é um mistério e The Militant claramente prefere manter as coisas assim, dado que nada mais é dito a respeito. O artigo diz que é e ponto final. Ocorre que ao falar em “judeu”, está-se falando sobre uma religião, um sistema organizado de fé, com sua doutrina, código moral, etc., ao passo que “sionismo” é um conceito político.

É o nome dado a um movimento que busca colonizar uma determinada região e fazer dela uma nação não-laica, dirigida por pessoas que professam uma determinada religião. O lugar de construção dessa nação orientada pela religião varia. Já foi os EUA, a Argentina, mas dado o interesse do imperialismo, calhou de ser não nas primeiras opções dos sionistas do século XIX, mas a pobre e atrasada Palestina, dominada pelo imperialismo britânico desde o fim da Primeira Grande Guerra, mas que só veria um fluxo impactante de estrangeiros judeus para seu interior após a Segunda Grande Guerra. Mais político, impossível.

Dado essa característica, de ser acima de tudo uma política, nem todo judeu é sionista, assim como nem todo sionista é judeu. Apoiador decisivo de “Israel”, Joe Biden é católico, assim como um dos mais notórios sionistas brasileiros: o ex-presidente fascista Jair Messias Bolsonaro (PL). Em ambos os países, a extrema direita alinhada à comunidade evangélica mais reacionária é também a principal base popular do sionismo.

A falta de limites na defesa do sionismo e o cinismo do artigo é chocante, especialmente vinda de um jornal cujo nome homenageia James Cannon, um importante trotskista norte-americano. Mostra que a cooptação da esquerda pelo imperialismo é muito profunda, o que só pode ser revertida com uma ampla mobilização em defesa da Revolução Palestina, dos partidos que compõem a Resistência e no reforço continuado à pressão mundial pelo fim dos bombardeios criminosos de “Israel”, além do fim da própria entidade colonial, único caminho para a libertação da Palestina e fim das monstruosidades sofridas pelos povos árabes na região.

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