O sítio do governo federal anunciou a participação, nesta sexta-feira (7), de Silvio Almeida, ministro dos Direitos Humanos e Cidadania do governo Lula, em um seminário patrocinado pelo IREE (Instituto para a Reforma das Relações entre o Estado e Empresa) que tem por título “Seminário Internacional sobre Segurança Pública, Direitos Humanos e Democracia”.
Segundo informou o sítio: “utilizando o espaço temporal de 1945 até a atualidade, o ministro enfatizou que o mundo vive uma ‘gigantesca crise econômica’, e que qualquer debate sobre segurança pública deve considerar a existência de desigualdade sociais. ‘A questão da segurança pública deve ser tratada sobre o prisma da economia política. E essa, talvez, seja a maior cabeça do monstro que nós temos que enfrentar’, apontou o gestor”.
No entanto, o que temos visto, principalmente por influência do identitarismo, é uma pressão cada vez maior para que se criminalize questões subjetivas, como o ódio, as ofensas, determinadas opiniões, etc.
Para Almeida, a década de 1970 impôs “uma profunda desregulamentação da economia e a destruição da proteção ao trabalho”. E é a partir desse período que os países periféricos, incluindo o Brasil, passaram a aderir a mecanismos que pressionaram as populações a se submeterem a regimes antidemocráticos como ditaduras militares enquanto o chamado neoliberalismo começou a ditar as normas “do individualismo, do egoísmo e da busca por soluções particulares para os problemas e dilemas coletivos”.
Almeida deu uma volta terrível para dizer que as “democracias” liberais passaram a patrocinar golpes de Estado e implementar ditaduras militares por todo o mundo, para garantir o controle sobre as economias dos países atrasados.
Quando Silvio Almeida diz que países, como o nosso, “passaram a aderir a mecanismos que pressionaram as populações a se submeterem a regimes antidemocráticos”, o termo ‘adesão’ dá o sentido de que teria sido um processo voluntário, o que jamais aconteceu no mundo real. A palavra ‘adesão’ mascara que houve uma repressão brutal com assassinatos de milhares e milhares de pessoas, prisões ilegais, torturas, roubo de bens, sequestros de crianças. Crimes contra a humanidade patrocinados pelos “países civilizados” que deixam até hoje marcas na sociedade.
Temos que concordar que o “neoliberalismo começou a ditar as normas ‘do individualismo, do egoísmo e da busca por soluções particulares para os problemas e dilemas coletivos’”, exatamente o que denunciamos no identitarismo, defendido por Almeida. Trata-se de uma ideologia de direita que sobrepõe a ‘identidade’ aos interesses de classe.
Os identitários lutam para colocar uma ‘mulher negra no STF’, pessoas trans no Parlamento, em ‘posições de poder’ e jamais questionam o caráter das instituições que, no fundo, defendem. O Supremo é uma corte reacionária, golpista, mas sua história remota e recente é deixada para trás. O importante é colocar ali alguma ‘identidade’.
É claro que os identitários ocultam suas posições reacionárias pregando que estão defendendo as minorias oprimidas.
Dourando a pílula
O ministro diz que “em uma sociedade na qual existe um Estado Democrático de Direito, a segurança pública é pensada como um desafio comunitário tanto no sentido de que a segurança é fluída pela comunidade quanto do ponto de vista de que sem a comunidade, não há chances de qualquer política de segurança pública dar certo”. Pois bem, a única coisa que tem fluído nas comunidades, especialmente as mais pobres, é o sangue da população.
O que vemos na fala do ministro é um discurso ensaboado. Segundo ele “Vivemos num tempo de escassez, especialmente no ocidente. E esse tempo se instaura dentro de toda a construção de uma subjetividade neoliberal, individualista, avessa a qualquer espírito de comunidade que repele a empatia”.
Porém, a escassez em si não responde a nada neste caso, pois o problema está na distribuição. Em um país onde falta tudo, como em Cuba, os índices de violência são baixíssimos, pois a maior parte do orçamento público é gasto com a sociedade. Nas ‘democracias’ existe abundância, mas ela fica nas mãos de meia dúzia de tubarões, enquanto para o povo os recursos são escassos.
O uso ‘justificado’ da violência
Antes de defender a repressão, Almeida tenta alegar que o governo deve combater a exclusão e ‘se orientar pela defesa da população, e não de interesses econômicos que desvirtuam o uso da força por parte de agentes de segurança pública. A polícia, porém, não está agindo de maneira ‘desvirtuada’, mas cumprindo o seu papel de proteger o Estado burguês.
Por isso que para Silvio Almeida “o que caracteriza a crise entre sociedade e repressão policial não é isoladamente o uso da força, mas em que circunstâncias e para que fim esse uso acontece”. Para ele “é possível utilizar tais mecanismos para defender os direitos humanos, a exemplo do combate ao crime organizado”. – grifos nossos.
Como era de se esperar, e como sempre fez a direita, o combate ao crime organizado é utilizado para justificar o uso da violência do Estado. No entanto, a venda de drogas, por exemplo, típica do ‘crime organizado’, é responsável por colocar na cadeia milhares de jovens pobres e desempregados. Que tipo de defesa de direitos humanos estamos vendo aí?
Silvio Almeida também defende que “o uso da força também terá que ser uma alternativa contra quem pretende desorganizar a sociedade ou atentar contra a soberania nacional ou dar golpe de Estado”. Essa afirmação só pode ser uma ameaça contra a esquerda e os movimentos sociais, pois seria um crime ‘desorganizar’ essa sociedade tão desigual. Trata-se de uma defesa explícita da ordem burguesa. No mais, que violência foi exercida contra aqueles que, ‘com Supremo, com tudo’, deram um golpe de Estado em 2016?
Defesa da censura e da polícia
O texto diz que “para Silvio Almeida, o discurso que estimula ações violentas – no lugar de planejamento, estratégia e cuidado com o povo –, estimula o ódio, põe a vida de policiais em risco e fortalece atividades criminosas. ‘Hoje, o Brasil precisa de uma política de segurança pública para preservar a sua soberania nacional’”.
Com o avanço do identitarismo, tornou-se comum a criminalização do discurso. Claro que a intenção é boa: proteger as minorias, os direitos humanos, etc. Na prática, ficou proibido, por exemplo, proteger os palestinos do massacre que estão sofrendo nas mãos dos sionistas, pois a crítica é logo tratada como antissemitismo. Lembrando que no Brasil uma pessoa acusada de racismo pode ser condenada a cinco anos de reclusão nesses campos de tortura que são os presídios brasileiros.
No final das contas, tirando as voltas e floreios, temos um ministro que, em nome de defender os direitos humanos, está apenas justificando o cerceamento da liberdade de expressão e defendendo a repressão.