No artigo Uma doença política transmitida pelos adversários contagia a periferia da esquerda lulista, publicado pelo Brasil 247, Mario Vitor Santo apresenta a tese de que há um setor da esquerda que aderiu à campanha da imprensa burguesa contra Lula. Isso até pode ser verdade, mas não é o caso da base do PT, e sim da esquerda golpista, os mesmos que contribuíram para o golpe contra Dilma Rousseff em 2016 (PSTU, correntes do PSOL, MRT etc.). Mas não são estes que o autor critica.
Diz ele: “nesta fase do mandato de Lula, muitos de seus apoiadores parecem tomados por uma espécie de síndrome de alarma, tristeza e cansaço. Irritados com o que enxergam como insuficiências do governo Lula, parecem contaminados com o discurso de seus adversários nas redes sociais e na mídia corporativa (Globo, Globo News, Folha, Estadão etc). É incrível como parcela importante se mostra caudataria desse discurso catastrofista, desse marketing da eterna crise abismal de um governo com emprego beirando recorde histórico, inflação em queda e salários em recuperação”.
Aqui aparece a contradição que leva o autor a fazer toda a análise incorreta. As pessoas que estão com a “síndrome de alarme, tristeza e cansaço” têm um motivo concreto para isso. Lula não consegue implementar a sua política, seu governo está paralisado. O movimento que elegeu Lula esperava muito mais do que o presidente está conseguindo entregar, devido à sabotagem permanente imposta pela direita. O que não muda a realidade de que a vida no País segue difícil para os trabalhadores.
Os números apresentados de inflação em queda, emprego e salários aumentando são pouco relevantes diante da calamidade que os trabalhadores se encontram. Não adianta ser um pouco melhor que o governo Bolsonaro, enquanto a situação continuar ruim, a satisfação com Lula não irá crescer. Ou seja, Lula precisa fazer muito mais e, portanto, a direita precisa ser derrotada novamente, agora com Lula no governo.
Ele segue: “gente simpática a Lula reclama das flutuações baixistas nas pesquisas de aprovação de Lula. Dedicam-se a reclamar da falta de mobilização, atribuindo ao governo um problema delas próprias. O inferno está nos outros. As queixas mais parecem ocultar ou desviar a própria passividade dos apoiadores do governo”. Apesar de ser algo mais adequado de ser feito pelo PT como partido, o governo Lula poderia, sim, mobilizar os trabalhadores. Basta ver o maior sucesso de popularidade da esquerda na América do Sul, a Venezuela. Lá o governo Maduro mobiliza permanentemente os trabalhadores, é só assim que ele consegue governar diante a gigantesca pressão dos EUA.
Então afirma: “para esse entorno dos simpatizantes da esquerda qualquer espirro dos bolsonaristas é enorme e apavorante, demandando resposta imediata. Já as tentativas ou vitórias do governo são nulas ou insuficientes”. Não fica claro o que seriam os “espirros bolsonaristas”, mas o fato é que já passou da hora de se travar um combate enfático contra o bolsonarismo. O movimento cresce cada vez mais como força política e cada vez mais ganha apoio da burguesia. Já as vitórias do governo são, sim, nulas ou insuficientes. É uma realidade e essa realidade precisa ser mudada.
Ele diz que isso leva a esquerda a apoiar a política da direita por meio da imprensa burguesa: “a reação à síndrome é desorientada e irracional. Como quase tudo está errado para eles, surgem alternativas que, na verdade, com alguma busca atenciosa, foram sopradas sem sutileza pelos ‘analistas’ da mídia oposicionista”. Esse ponto não parece condizer com a realidade. A imprensa pede mais aliança com a direita, não é isso que desejam as bases de Lula, querem exatamente o oposto, mais PT, menos Frente Ampla.
A imprensa burguesa está contra todas as medidas positivas de Lula. Contra a política internacional da aliança com os BRICS, contra o uso do dinheiro da Petrobrás pelo Estado nacional, a favor da taxação das empresas chinesas, contra as saidinhas etc. As bases do PT não querem nada disso, querem a política da esquerda, a política que foi prometida durante as eleições.
O texto toca na questão da comunicação: “há dificuldades de construir uma comunicação politicamente eficiente a partir do governo, sendo mais fácil fazê-lo da oposição. O enraizamento da direita nesse mundo digital não é fenômeno exclusivamente brasileiro, ao contrário, sendo dominado pela extrema-direita em todo o planeta”. Aqui a questão não é dificuldade nenhuma mas uma política errada. O governo não apresenta uma política combativa, nem estimula uma imprensa independente.
Ao ficar a reboque da frente ampla na política também fica na questão da imprensa. Ou seja, sua imprensa própria é chapa branca ou é muito parecida com a própria imprensa burguesa. Já os bolsonaristas têm uma imprensa agressiva e por isso crescem nas redes sociais. Mas quem deve partir para o combate real é a esquerda, e não a extrema direita.
O fim do texto mostra mais uma vez que o autor está desconectado da realidade: “vale anotar que a extrema-direita bolsonarista mergulha numa crise desde o trauma da derrota em 2022, sempre subestimada pela periferia do lulismo. Essa crise é agravada pela obrigação de fazer política, fazer alianças e concessões, o que é a própria negação da identidade fascista de existir impondo desânimo e divisões em seu campo”.
Ao mesmo tempo em que ele não enxerga a crise gigantesca que afeta a vida da maior parte da classe trabalhadora, também não vê que o bolsonarismo está em franca ascensão. Sua bússola política está completamente quebrada e ela aponta para a paralisa e não para a mobilização. Com essa política, Lula deve traçar o mesmo caminho que a direita tradicional no mundo inteiro, se desintegrar. Ele foi eleito com base na luta contra a direita, contra os golpistas e contra os bolsonaristas, e só assim poderá governar.