No último domingo, dia 2 de junho, a Folha de S.Paulo publicou um editorial intitulado “País ganha com menos partidos no comando”. O tema é comumente utilizado para restringir o direito de organização no Brasil, como a própria Folha apresenta. A base para tais posições é a confusão deliberada entre o que seria um partido e o que seria uma legenda. Vamos aos argumentos:
“Embora o Brasil tenha 29 partidos, não mais de sete deles dominam o cenário político nacional. Esse grupo concentra 80% das cadeiras do Congresso e 70% dos governos estaduais e das bilionárias verbas eleitorais, além de ser maioria em prefeituras, câmaras municipais e Assembleias Legislativas.
São eles, pela ordem de cadeiras na Câmara, PL, PT, União Brasil, PSD, MDB, PP e Republicanos”.
Aqui temos a primeira confusão estabelecida pela Folha: a avaliação dos partidos e de sua relevância por um desempenho eleitoral. A farsa deste argumento o próprio jornal golpista refuta:
“O excesso de siglas é pernicioso. Dificulta a formação de coalizões estáveis —sendo, portanto, empecilho à governabilidade— e ainda confunde o eleitor: quais as diferenças ideológicas entre a União Brasil e o PP, por exemplo?” (grifo nosso).
O trecho grifado é o que entrega o problema real. Independentemente de desempenho nas eleições, em que o dinheiro é a regra determinante, a questão real é a ausência de diferenças programáticas entre os partidos existentes. A variedade do que são na realidade legendas eleitorais tem por função disfarçar este fato, tanto entre os partidos burgueses como entre os partidos da esquerda pequeno burguesa.
“Ademais, as legendas enfrentam dificuldades para criar identidade política. Não à toa, em vez de serem enumerados os partidos que formam o mais influente grupo parlamentar do centro à direita, ele é nomeado pelo termo ‘centrão’.”
A menos que os líderes de partidos que hoje ganham com a fragmentação tenham êxito em alguma manobra, o movimento de redução deve continuar, já que as exigências da cláusula de desempenho, que asseguram ao partido o direito a financiamento público e propaganda oficial, aumentarão até o pleito de 2026.”
Apesar de nomear o “centrão” como principal expoente do problema, no que pareceria uma iniciativa voltada a combater este setor do atraso na política nacional, de representantes de oligarquias regionais, latifundiários e oportunistas de toda sorte, a chamada cláusula de desempenho, apontada como meio para tal, ao invés disso, impede e afasta setores de adentrarem na política institucional e no debate público do País ainda mais, tenham um programa político estabelecido ou não. É na prática uma política ditatorial, de censura, e que afeta em especial a esquerda.
“Por muito tempo, os caciques frustraram a adoção de regras antifragmentação. A primeira tentativa é do início dos anos 2000, mas foi derrubada em 2006 pelo STF.
“Vale observar que o Brasil já abraça uma versão extremamente diluída das barreiras. Na maioria dos países que contam com esse tipo de mecanismo, partidos que não obtêm o mínimo estipulado de votos não obtêm representação no Parlamento; por aqui, ficam apenas sem financiamento público e tempo de rádio e TV.”
Ou seja, a Folha quer que aqueles sem o poder econômico necessário não apenas deixem de receber fundos, em desproporção aos partidos já estabelecidos, que já dispõe de mais recursos, e que não consigam alcançar o público nacional através de ínfimas participações nos monopólios de rádio e televisão, como busca impedir que elejam representantes de maneira absolutamente antidemocrática. O mínimo de votos para se obter uma representação no parlamento deve ser o número de votos necessário para eleger um candidato. Para a Folha, contudo, não deve ser assim. Seria preciso haver um “mínimo estipulado de votos”, seja lá que aberração ditatorial isso signifique.
Ao passo em que argumenta por uma facilitação do processo representativo ao supostamente defender uma vinculação de candidaturas a determinados programas políticos mais acabados ao colocar a questão do número de partidos, não é esse o objetivo da Folha. Tal qual seu apoio à ditadura militar, o veículo visa um maior controle do regime político pela burguesia, impedindo a população de formar suas organizações e de eleger representantes como desejar. Exemplo claro da vigência de um regime já antidemocrático foi a incapacidade, pelos entraves institucionais, de Jair Bolsonaro, candidato à presidência que obteve dezenas de milhões de votos, em legalizar um partido próprio.