Recentemente, o “governador” gaúcho, Eduardo Leite, veio a público admitir que não tomou medidas para precaver as enchentes em seu estado porque priorizou dar dinheiro para os bancos. Na mesma entrevista, disse ainda que pretendia liderar a “reconstrução do Rio Grande do Sul”. Juntando uma informação à outra, tem-se uma verdadeira ameaça contra a população: não bastasse o estrago que causou na vida das pessoas, Leite quer se valer da desgraça para amaldiçoar ainda mais a vida do povo gaúcho.
Usar catástrofes para aprofundar as medidas neoliberais não é novidade. O furacão Katrina, que devastou Nova Orleans, nos Estados Unidos, em agosto de 2005, não apenas causou destruição física e sofrimento humano, mas também precipitou uma transformação radical no sistema educacional da cidade. Naomi Klein, em seu livro A Doutrina do Choque: A Ascensão do Capitalismo de Desastre, apresenta um relato detalhado de como a crise provocada pelo desastre natural foi utilizada como uma oportunidade para implementar reformas neoliberais, especificamente a privatização das escolas públicas.
O furacão Katrina atingiu a costa do Golfo dos Estados Unidos em 29 de agosto de 2005, causando rupturas nos diques que protegiam Nova Orleans e submergindo a maior parte da cidade. Mais de 1.800 pessoas morreram, e centenas de milhares foram deslocadas. A infraestrutura da cidade, incluindo o sistema escolar público, ficou em ruínas. Antes do furacão, as escolas de Nova Orleans já enfrentavam desafios significativos, como baixo desempenho acadêmico, corrupção e falta de recursos.
Em meio ao caos e à devastação, os economistas neoliberais viram uma oportunidade para reestruturar o sistema escolar de Nova Orleans de acordo com seus interesses. Klein argumenta que a desorientação e o trauma coletivo criados pelo furacão facilitaram a implementação de políticas que, de outra forma, enfrentariam forte resistência.
As principais medidas foram:
- Fechamento e Substituição de Escolas: muitas escolas públicas foram fechadas permanentemente. Em seu lugar, surgiram escolas charter, financiadas com recursos públicos, mas operadas de forma privada;
- Mudanças Legislativas: o estado da Luisiana transferiu o controle da maioria das escolas públicas de Nova Orleans para a Recovery School District (RSD), uma entidade estadual, facilitando a conversão das escolas em charters;
- Financiamento e Apoio: fundos federais e doações privadas, frequentemente de defensores do neoliberalismo, apoiaram a mudança. Fundações como a Bill & Melinda Gates Foundation e a Walton Family Foundation foram influentes nesse processo.
As reformas exacerbaram as desigualdades existentes. Bairros pobres foram os mais afetados pelo fechamento de escolas públicas. Muitos professores foram demitidos, e as novas escolas charter frequentemente contrataram professores menos experientes, resultando em uma ruptura na continuidade educacional e comunitária. A privatização trouxe ainda preocupações significativas sobre a falta de responsabilidade pública. As escolas charter, operadas por entidades privadas, não estão sujeitas às mesmas normas de transparência e prestação de contas que as escolas públicas tradicionais.