O jornal O Estado de S. Paulo publicou um artigo assinado por Bret Stephens para o New York Times chamado O que significa, na prática, a ‘Palestina livre’ dos discursos.
O texto é um amontoado de calúnias contra o Hamas e contra os estudantes norte-americanos que estão realizando importantes manifestações a favor da Palestina.
Segundo o autor, os “palestinos tiveram certa medida de autogoverno na Cisjordânia desde que Yasser Arafat entrou na Faixa de Gaza, em 1994. Israel retirou seus colonos e soldados do território em 2005.”
Eis aqui a primeira mentira do texto. “Israel” nunca tirou, de fato, os colonos e soldados dos territórios palestinos. Há milhares de palestinos presos pelos israelenses por motivos dos mais arbitrárias. O Exército de Ocupação invade regularmente os territórios para assassinar e sequestrar os palestinos. Além do mais, o que o autor chama de autogoverno é uma ditadura imposta pela Autoridade Palestina, na figura de Mahmoud Abbas, uma ditadura que é cúmplice da política de ocupação. Tanto é assim que na Cisjordânia há uma dura repressão contra as manifestações atuais.
O autor continua: “os líderes israelenses ofereceram repetidamente a criação de um Estado palestino — ofertas que Arafat e Abbas rejeitaram.” Mais uma mentira. Ele não sabe que os Acordos de Oslo foram assinados por Arafat? Foram assinados e desrespeitados. Os setores mais esclarecidos previram que os acordas seriam ruins para os palestinos e que “Israel” não respeitaria. Foi exatamente o que aconteceu. Mas o fato é que Arafat, como representação dos palestinos na época, aceitou o acordo.
“Acusações sobre o bloqueio econômico israelense tendem a ignorar alguns fatos: Gaza também faz fronteira com o Egito; grande parte da ajuda internacional concedida a Gaza para a construção de infraestruturas civis foi desviada para a construção dos túneis do Hamas; e o Hamas usou Gaza para iniciar cinco guerras com Israel em 15 anos.”
Aqui, a calúnia se junta com a mentira. Gaza fazer parte do Egito não muda nada. O autor ignora primeiro que o imperialismo e os sionistas pressionam o Egito a não abrir as fronteiras; segundo, que o Egito é um regime ditatorial, pró-imperialista, ou seja, não é um real aliado dos palestinos.
A alegação de que o Hamas desviou ajuda internacional a construção de túneis e estruturar a defesa militar dos palestinos, além de caluniosa é infantil. O autor não demostra essa calúnia, que é mentirosa. O Hamas governa Gaza como qualquer outro grupo político faria numa situação de pressão e bloqueio. Se o Hamas não administrasse nada em Gaza para o povo e gastasse “apenas” em questões militares dificilmente eles seriam eleitos, ainda que a maioria do povo apoie a luta da resistência.
A calúnia é tão grosseira que ignora que a própria criação do Hamas se deu como um grupo religioso para fazer caridade. Está na própria essência do Hamas ações não militares.
A acusação é infantil porque um grupo que governo um território ocupado, sob bloqueio do invasor, sob intensa pressão militar desse invasor, tem todo o direito de investir em estrutura de defesa e militar.
Todas as acusações do autor contra o Hamas é pura calúnia. E autor não faz nenhuma questão de provar, como a afirmação de que o Hamas “derrubou completamente a Autoridade Palestina em Gaza após uma breve guerra civil e então eliminou toda a oposição política por meio de uma campanha de assassinato, tortura e terror.” Quais foram esses assassinatos, a tortura e o terror? Se aconteceram, o que provavelmente é mentira, quando, como e em que situação aconteceram? Para caluniar, basta acusar sem provas.
O Hamas derrotou o Fatá de Abbas pelas eleições. Logicamente, para o imperialismo, eleição boa é só aquela que ele controla. Mas, ao menos o autor deveria provar que a vitória do Hamas não foi democrática. Mas como provar isso se a popularidade do grupo até mesmo na Cisjordânia governada por Abbas aumenta cada vez mais?
Mas o autor não se cansa de caluniar: “A inexistência de uma democracia palestina talvez não deva surpreender. O regime estabelecido pelo Hamas não é meramente autocrático”. E, mais à frente, citando dois jornalistas: “Os líderes do Hamas, apesar de alegar representar o povo de Gaza, não tolerariam nem mesmo um sopro de dissidência”.
Sem entrar propriamente no problema da estrutura do regime político em Gaza, a afirmação de que o Hamas impõe uma ditadura autocrática. Ignora, por exemplo, que o Hamas, apesar de ser um grupo islâmico, admite Cristãos em suas fileiras. Que o Hamas está numa frente única com outros grupos que inclusive não compartilhem da sua ideologia religiosa, como é o caso da Frente Popular pela Libertação da Palestina (FPLP), grupo que se reivindica marxista, portanto, ateu.
“Um Estado palestino independente, convivendo lado a lado com Israel, melhoraria sua governança interna? Se o Hamas tomar o controle, não — o que quase certamente ocorrerá se o grupo não for absolutamente derrotado na atual guerra. E se os manifestantes alcançarem seu objetivo maior — ou seja, uma Palestina ‘do rio até o mar’?”
Como base em que o autor afirma que o Hamas não teria condições de governar um Estado palestino? Baseado nas mentiras e calúnias que ele apresenta para pressionar os estudantes que se mobilizam aos milhares nos Estados Unidos.
Para convencer os estudantes, que são atualmente muito influenciados pelo identitarismo, nada como lançar mão de uma calúnia envolvendo LGBTs: “Em 2016, o Hamas torturou e matou um de seus próprios comandantes, Mahmoud Ishtiwi, sob suspeitas de ‘torpeza moral’ — um código para homossexualidade. ‘Parentes afirmaram que Ishtiwi lhes disse que ficava pendurado horas a fio, dia após dia’, escreveram Diaa Hadid e Majd Al Waheidi, do Times. Se o caso aconteceu, difícil saber. O que sabemos é que as fontes são o sionismo e o imperialismo.
Mas o autor não se preocupa em saber exatamente como é a postura do Hamas sobre os LGBTs. O assassinato de LGBTs é o procedimento oficial do grupo, é o modus operandis do Hamas? Ninguém se preocupou em saber. E podemos dizer que não é.
Por fim, para tentar arrematar os corações dos confusos, o autor do texto apela:
“Nós sabemos algo sobre as intenções do Hamas graças à declaração final de uma conferência que o grupo realizou em 2021 a respeito de uma Gaza ‘libertada’. Qualquer judeu considerado ‘combatente (…) deve ser morto’; judeus que fugirem podem ‘ser deixados em paz’ ou ‘processados’; indivíduos pacíficos podem ser ‘integrados ou receber um prazo para partir’. Finalmente, ‘judeus escolarizados’, com habilidades valiosas, ‘não devem ter a saída permitida'”.
Aqui, a canalhice completa. O autor cita “uma conferência”. E que conferência seria essa? Quem participou?
Independentemente se o conteúdo está certo ou não, o documento citado, totalmente fora de contexto, não leva em conta, por exemplo, que se trata de propostas de um grupo de base do Hamas para serem levadas à direção central. Ou seja, sequer é a posição do Hamas.
A posição do Hamas sobre os judeus é muito clara. Eles repetem isso exaustivamente, mas a imprensa imperialista e sionista não ouvem para poder caluniar. O Hamas quer a convivência com os judeus, como era antes do Estado sionista. Não há no programa do Hamas nenhuma hostilidade a judeus simplesmente por serem judeus.
O artigo do New York Times revela que o sionismo está derrotado no terreno da luta política. As enormes mobilizações contra o genocídio israelense, como a dos estudantes norte-americanos, acabou de vez com o sionismo. Eles precisam abandonar as velhas calúnias rebaixadas, como as de que denunciar o genocídio é “antissemitismo” e partir para outro tipo de debate, que também não dará resultado.