Segundo relatório da Defesa Civil do Rio Grande do Sul – ou o que resta dela após o governo de Eduardo Leite (PSDB) reduzir seu orçamento de R$ 1 milhão para R$ 100 mil em 2023, e para R$ 50 mil este ano – divulgado neste sábado (11), os alagamentos que assolam o estado já deixaram 136 mortos. O órgão acrescenta que estão desaparecidas 125 pessoas e o número de feridos já chegou a 756 e já são mais de 440 mil os desalojados ou desabrigados.
Nas 444 cidades que relataram problemas decorrentes dos temporais, estima-se que mais de dois milhões de gaúchos tenham sido afetados pela crise. Até agora, pouco mais de 74 mil pessoas foram resgatadas.
Segundo relato enviado exclusivamente a este Diário por Roni Silva de Azevedo, em Sapucaia do Sul há “corpos de pessoas boiando” nas águas que cobrem as ruas da cidade e “é a própria população que está fazendo o resgate das pessoas”. “Nós não temos apoio nenhum, nem do governo do estado, nem do governo do município”, acrescenta Azevedo.
O relato conduz à inevitável conclusão de que se o órgão responsável pelo resgate da população afetada não consegue organizar a distribuição de alimentos e o recolhimento de cadáveres em todo o Estado, o balanço que fazem é provavelmente muito conservador. Em outras palavras, uma parcela significativa dos 11,4 milhões de gaúchos com certeza está em apuros sem que isso tenha sido sequer registrado pelas autoridades públicas.
Essa limitação, naturalmente, não é de responsabilidade da Defesa Civil, praticamente desmantelada pelo atual governo psdbista. Leite, que agora posa para fotos com colete da organização que asfixiou com cortes de gasto, parece mais preocupado com a repressão, em conter os saques a supermercados – consequência natural da fome e da ausência de distribuição de alimentos -, do que em resolver os problemas do povo gaúcho. Diante de pedidos da direita bolsonarista para que seja editado decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), Leite disse que isso não será necessário e anunciou na sexta-feira (10) que cerca de mil policiais militares que foram para a reserva nos últimos dez anos estarão a postos para garantir a “segurança”.
“Vamos garantir reforço para a segurança nos locais mais críticos e dentro dos próprios abrigos. É prioridade a estratégia na segurança. Não vamos dar espaço para os criminosos roubarem, saquearem e atacarem. Isso será possível com reforço da Força Nacional e com policiais de outros estados”, disse o governador, que prefere esses reservistas atuando na repressão de gaúchos do que apoiando a Defesa Civil completamente desfalcada.
Governador dos bancos
Este Diário já denunciou inúmeras vezes a política neoliberal de Leite que conduziu o Rio Grande do Sul ao estado que se encontra. Por mais que a imprensa burguesa procure proteger o governador gaúcho, apoiada por setores ambientalistas da esquerda pequeno-burguesa, com declarações apocalípticas sobre o aquecimento global causado pelo homem, a calamidade em nada tem a ver com a natureza, mas com a falta de obras públicas que previnem contra esse tipo de evento climático.
Além de desmantelar a Defesa Civil, Leite foi responsável pela privatização de serviços essenciais do Estado Gaúcho. Enquanto se discute com grande alarde a privatização da Sabesp em São Paulo pelo governo do igualmente criminoso Tarcísio de Freitas (Republicanos), em julho de 2023, sem grande alarde, o governador gaúcho concluiu a privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan), vendida ao grupo Aegea. Denunciamos o início essas negociações ainda em 2021.
Leite também organizou a venda da Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica ao Grupo Equatorial Energia e a privatização da Companhia de Gás do Estado do Rio Grande do Sul, adquirida pela Compass. Segundo reportagem do portal Sul21, todas as três privatizações supracitadas foram realizadas sem ampla concorrência, agravando o crime contra o povo gaúcho, expropriado. Naturalmente, as vendas foram realizadas segundo os interesses dos banqueiros que governo o Rio Grande do Sul através de Leite. Somente em 2021, Leite já havia encaminhado 20 privatizações.
O estado de calamidade do Rio Grande do Sul demonstra a eficiência do setor privado no oferecimento de serviços à população. Não há água, não há eletricidade, os gaúchos estão entregues à própria sorte.
Responsabilidade fiscal
Diante dessa crise, o mercado financeiro, que tanto se beneficiou da política de destruição do setor pública promovida pelo governo gaúcho ao longo dos últimos anos, exige responsabilidade fiscal do governo federal. Em outras palavras, a política da burguesia para os gaúchos é que continuem organizando seu próprio resgate porque o governo federal deve se somar ao governo gaúcho e continuar alimentando os bancos. Segundo levantamento realizado pela auditoria da dívida pública, mais da metade do orçamento federal é destinada ao pagamento de dívidas (e juros das mesmas) com bancos privados. Desse orçamento, mais de 40% vem diretamente dos impostos pagos pela população brasileira, tanto pela taxação sobre sua renda como pela taxação sobre o consumo.
Na última semana, diante do reconhecimento do estado de calamidade pública no Rio Grande do Sul, o governo federal conquistou certa flexibilidade para alocar recursos ao Estado sem ferir o Lei de Responsabilidade Fiscal, lei que protege os interesses dos bancos em detrimento da população brasileira. Na quinta-feira, em movimento aparentemente não relacionado, Luis Stuhlberger, presidente e diretor de investimentos da Verde Asset, um banco de investimentos, declarou que se “penitenciava por ter acreditado que o PT teria alguma seriedade fiscal”. O ataque ao governo provocou imensa evasão de recursos do país, que ocasionou grande desvalorização do real.
A intervenção do governo federal no resgate da população gaúcha é fundamental, independentemente da posição dos banqueiros sobre os gastos excessivos. A política dos parasitas para enfrentar a calamidade no Rio Grande do Sul aparece na imprensa burguesa: contam com doações dos brasileiros que assistem angustiados a situação dos gaúchos. O sentimento de solidariedade é louvável, mas quem deve pagar por todos os danos causados é o governo gaúcho que há anos saqueia a população.
Acima disso, o dinheiro não deve ir para as mãos do governo neoliberal de Leite, que destruiu o Estado, nem para os municípios governados por políticos burgueses que não merecem a menor confiança do povo gaúcho. O governo federal deve intervir e trabalhar diretamente com a população e organizações populares que já atuam no resgate de pessoas, na ausência do poder público.
Nenhum dinheiro aos banqueiros
Dessa forma, a saída para enfrentar as enchentes não passa pelas mãos daqueles que as causaram através da destruição do patrimônio público. O caminho passa pelas organizações populares que devem ser apoiadas pelo governo federal.
Nesse sentido, reproduzimos abaixo as reivindicações dos Comitês de Luta para enfrentar a crise:
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- Organizar um comitê independente para estudar as causas das enchentes e as obras que não foram e precisam ser realizadas.
- Ver todas as necessidades de quem ficou desabrigado ou afetado, garantir abrigos para todos, além de alimentação, água, luz e auxílio médico.
- Garantir que todos tenham suas moradias reformadas ou, quando não for possível, realocadas.
- Tarifa zero para água, energia e telefone nas áreas afetadas até normalizar a situação.
- Tabelamento de preços e proibição e confisco se necessário das empresas que estocarem gêneros de primeira necessidade.
- A Polícia Militar deve ser colocada sob coordenação da defesa civil
- O governo deveria requisitar aeronaves, helicópteros, etc., para resgatar as pessoas.
- Fim da política de austeridade, déficit zero!
- Suspensão dos pagamentos de dívidas interna/externa, inclusive com o governo federal
- Suspensão da lei de responsabilidade fiscal!
- Auxilio emergencial para todos os afetados!
- Reestatização de todas as empresas privatizadas!
- Fora Leite!