Segundo os editoriais da última semana da imprensa burguesa, vai se tornando visível a costura de um acordo entre os setores da burguesia para desinflar o ministro do STF, Alexandre de Moraes. Moraes está sendo desinflado. Matérias deste sábado (27), uma publicada no jornal Folha de S. Paulo e intitulada STF: contestação a Moraes aumentam e políticos, STF e governo querem nova postura, e outra publicada em O Estado de S. Paulo, intitulada Está faltando pudor, expressam esse fato.
A Folha abre sua matéria com a seguinte colocação:
“O acúmulo de atritos envolvendo o ministro Alexandre de Moraes ampliou o alcance dos questionamentos sobre os limites da atuação do magistrado no STF (Supremo Tribunal Federal).
Integrantes do Congresso, do governo e da corte que costumam oferecer respaldo às ações de Moraes agora admitem reparos e reconhecem, nos bastidores, a necessidade de ajustes”
Curiosamente, o jornal da burguesia oculta o fato de que também deu tanto respaldo, se não mais, que “integrantes do congresso, do governo e da corte”, ao ministro que agora é jogado aos leões.
“Essas autoridades mantêm apoio ao ministro e destacam a relevância de sua atuação na defesa das instituições. Elas afirmam, no entanto, que uma mudança calculada e gradual de postura seria importante para baixar a temperatura de recentes embates protagonizados por Moraes”, continua a matéria.
A movimentação se apresenta como se fosse uma baixa honrosa, como o empregado presenteado com uma placa dourada, com seu nome, em agradecimento pelos anos de serviço, antes de ser chutado para fora da empresa, antes que possa se aposentar.
É o fim da era do Ministro-Imperador do Brasil. A burguesia acendeu uma luz vermelha para o “xandonismo”. A referida ampliação de atritos nada mais é que o fato de que está acontecendo com Alexandre de Moraes o que aconteceu com o Sérgio Moro.
Um juiz é escolhido a dedo e recebe respaldo para cometer todos os tipos de ilegalidades. Foi assim com Sérgio Moro, Alexandre de Moraes, Joaquim Barbosa, que não são alçados a postos de decisão para cumprir um papel político determinado. Com rédea solta e autonomia, eles avançam, não raras vezes, sem preocupações com o resultado de suas ação.
“Junto com a balança e a venda, a toga preta simboliza a uniformidade, a isonomia, a sobriedade da Justiça. Todo servidor deve seguir os princípios da administração pública – impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, legalidade –, mas, se aos juízes cabe um figurino, é porque devem não só segui-lo, mas representá-lo. Não basta ser íntegro, é preciso parecer”, afirmou O Estado de S. Paulo, antes de criticar as viagens dos ministros do Supremo à Europa, para participar de congressos de cunho político, ou até mesmo para jogos da Champions League, com direito a ingressos para o torneio de Roland Garros, bancado por advogados e empresários de toda a sorte.
Ainda assim, não são os luxos e penduricalhos que finalmente fecharão a conta de Alexandre de Moraes. Na verdade, o deslize que será o estopim da grande rifa que premia sua cabeça é ter tocado no que existe de mais próximo de Deus na América Latina: os militares. O ex-general Hamilton Mourão já havia mandado um aviso há algumas semanas atrás: “no caso das Forças Armadas, os seus comandantes não podem se omitir perante a condução arbitrária de processos ilegais que atingem os seus integrantes ao largo da Justiça Militar“.
Ao tocar no interesse dos militares, ele tocou num ponto intocável, o que desencadeou a postura de dar um basta no poder do STF.
Houve no Superior Tribunal Militar (STM), no último dia 10 de abril, uma celebração que condecorou vários notórios bolsonaristas que atacam frequentemente o STF, instância que está acima do STM. Dentre os condecorados estava Silas Malafaia, entre outros. Mesmo que algumas das figuras homenageadas tenham sido apontadas antes de Moraes proibir a participação de investigados em cerimônias do Exército, Marinha e Aeronáutica, em 8 de março, caso a intenção fosse outra que comprar uma briga com o STF, eles teriam tirado os bolsonaristas de vista e mantido um pacto de normalidade.
O bolsonarista Guilherme Fiúza foi outro dos agraciados com a insígnia de “distinção” pela Justiça Militar. Fiúza já chamou ministros do STF de “hipócritas”, dizendo à época da pandemia que “tem um autoritarismo na Corte” e que o “Judiciário se desmoraliza sozinho”. Logo após o ato de 8 de janeiro, o comunicador foi alvo de decisão judicial que bloqueou seus perfis em redes sociais por alegação de que estaria divulgando discursos antidemocráticos.
Segundo o regimento da Ordem do Mérito Judiciário Militar, que define quem é eletivo a ser condecorado com tais honrarias, “os agraciados deverão ter atributos de condutas moral, ética, pessoal e profissional idôneas, compatíveis com os valores cultuados pela JMU [Justiça Militar da União]”.
O que efetivamente ocorreu foi a sinalização pelo STM de que os militares são intocáveis e que eles iriam acabar com a brincadeira de Moraes no STF.
A esquerda, por sua vez, se mantém no papel burlesco, apoiando a censura, exaltando Alexandre de Moraes, clamando pela repressão policial para qualquer um que seja, como se realmente a esquerda dominasse o Judiciário e pudesse fazer uso dele a seu bel-prazer.
A única coisa que se mantém oculta nessa história, por ora, é o que isso tudo significa em relação a Jair Bolsonaro e ao bolsonarismo, em geral. Isso ainda não está claro, pois ainda está em curso o processo de Bolsonaro e outras pendências do período de alta dos mandos e desmandos de Alexandre de Moraes.
Muitos setores de direita apontam que o ato do Bolsonaro no Rio de Janeiro não teria sido tão grande porque Jair Bolsonaro já teria se safado e saído bem da história com a queda do Alexandre de Moraes, o que é difícil de acreditar, já que as contradições na história de todo esse conflito ainda não foram todas eliminadas.
Isso ainda não encontrou conclusão, tendo em vista que Bolsonaro está recorrendo de sua inelegibilidade, recurso que a Procuradoria-Geral da República negou, mesmo tendo em vista a pressão social e um aparente pacto da burguesia para reabilitar Bolsonaro ao mesmo tempo em que ocorre um refluxo das operações de Alexandre de Moraes.
Está em curso uma aliança internacional entre a extrema-direita e a direita imperialista. No Brasil, essa aliança não tem nenhum obstáculo. Nos EUA, o imperialismo tem como obstáculo acabar com a Rússia. Bolsonaro não tem nada a ver com a Rússia, e apresenta alinhamento ao imperialismo na questão Palestina, e com a repressão dos movimentos estudantis. Somado a isso, a política poderosa do sionismo aproxima Bolsonaro do imperialismo norte-americano.
A ideia de que haveria um conflito insuperável entre a burguesia e o imperialismo se apresenta, cada vez mais, como o que sempre foi: uma fantasia. Porque eles são aliados, têm propósitos comuns e a situação internacional é de alta gravidade. O imperialismo vai precisar unir todas as forças para se defender e se manter numa situação que é cada vez mais dramática.
O imperialismo não consegue enfrentar a China, tentou encurralar os russos e fracassou, e agora até o Irã aparece como um adversário difícil de ser superado. Nesse quadro de crise do imperialismo, uma reaproximação do bolsonarismo com a burguesia tradicional é algo plenamente viável.