Neste exato momento, servidores de dezenas de instituições federais de ensino se encontram em greve. O motivo? O descontentamento com a proposta do governo de reajuste salarial para 2024: 0% de aumento. A justificativa? Seria preciso “equilibrar as contas públicas”.
Os servidores não são os únicos que estão sendo penalizados sob pretextos fiscais. Recentemente, o governo federal anunciou que o salário mínimo aumentará, em 2025, míseros R$90, valor que sequer repõe a inflação real.
Enquanto a esmagadora maioria da população brasileira vê seu poder de compra diminuir e as condições de vida piorar, há quem não esteja nem aí para a situação fiscal do Estado. Pelo contrário: os que mais defendem publicamente o arrocho contra os servidores e contra o conjunto da população são os que estão mais se beneficiando da máquina pública.
Já se tornou conhecido o escândalo dos dividendos da Petrobrás, no qual um punhado de especuladores que sequer moram no Brasil recebem mais dinheiro que o orçamento de um Ministério inteiro. Agora, veio a público outro escândalo: a Proposta de Emenda à Constituição 10/2023. Apresentada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, a PEC, mais conhecida como “PEC do quinquênio”, institui uma parcela mensal de valorização por tempo de serviço dos magistrados e do Ministério Público, além de outras categorias que foram incluídas depois. Em outras palavras, estabelece que, enquanto a esmagadora das categorias precisam entrar em greve, lutar e sofrer ameaças judiciais para, quem sabe, conseguir uma reposição salarial, juízes e funcionários do Ministério Público poderão ter, por lei, um aumento garantido a cada cinco anos. Tudo isso, de acordo com cálculos veiculados pela grande imprensa, poderia render um rombo de R$82 bilhões aos cofres públicos em três anos!
O próprio texto da PEC também é um escárnio contra o povo brasileiro. Dizem seus autores:
“Quando aprovamos a reforma da previdência, alongamos o tempo de serviço de todos esses profissionais, inclusive de magistrados, foi justamente no intuito de adequar essa realidade do aumento da expectativa de vida com a higidez do nosso sistema previdenciário, com o natural sacrifício – e todos colaboraram – de carreiras de magistrado, mas nós não podemos, definitivamente, permitir que as carreiras da magistratura e do MP sejam vistas como desvalorizadas.”
Ou seja, segundo os ilustres senadores, não bastou aprovar a reforma da Previdência, que consistiu no roubo da aposentadoria de dezenas de milhões de trabalhadores. Não bastou aumentar o tempo de contribuição necessário para que dezenas de milhões de operários possam se aposentar, fazendo com que muitos morram antes de fazer uso de qualquer benefício previdenciário. É preciso, agora, reparar que, segundo Pacheco e companhia, os juízes seriam os grandes merecedores de um reparo. Afinal, se os juízes e promotores ficarem sem um aumento salarial, morrerão de fome na velhice, não é mesmo?!
Em outro trecho, os autores escancaram que o que estão fazendo é, na verdade, aumentar a carga de privilégios desse setor:
“Queremos uma justiça independente, uma justiça com os melhores profissionais do mercado, queremos uma justiça imparcial. Queremos promotores e procuradores de justiça que tenham independência funcional e que se dediquem inteiramente à defesa da ordem democrática. Então, para que tenhamos, precisamos proporcionar um ambiente atrativo ou perderemos profissionais altamente vocacionados para outras carreiras que remuneram melhor ou que imponham menos sacrifícios para a vida pessoal dessas pessoas” [grifo nosso].
Acontece que o trabalho de um juiz ou de um promotor não é o trabalho ingrato de passar quatro horas do dia no transporte público e mais oito horas numa fábrica desempenhando atividades manuais. Não é uma atividade que precise de um ambiente ainda mais “atrativo”, pois a atividade judicial já é, em si, altamente burocrática. É uma atividade privilegiada, de uma casta social. Mas o que os autores da PEC fazem, ao defenderem ampliar os privilégios e ainda dizer que é preciso um “ambiente atrativo”, é admitir que os funcionários do Judiciário e do Ministério Público precisam ser cooptados.
É preciso pagá-los bem! Para quê? Para promover a “Justiça”? Acaso alguém pode levar a sério que um Congresso Nacional que, há oito anos, rasgou a Constituição e depôs uma presidenta eleita se preocupe mesmo com a “Justiça”?
A questão é simples. Os funcionários do Judiciário precisam ser bem pagos porque constituem uma burocracia. E uma burocracia com grandes privilégios sempre será um instrumento da classe dominante para manter as coisas como estão. É assim com o Judiciário, é assim com o Ministério Público, é assim com as Forças Armadas. Quanto mais privilégios, mais a burocracia será fiel a quem lhe paga. Isto é, aos capitalistas, que são os autores de projetos criminosos como a tal “PEC do quinquênio”.
Caso a PEC seja aprovada, juízes receberão 5% de aumento a cada cinco anos de serviço, além dos aumentos que serão negociados todo ano. Com a progressão de carreira, o “bônus” pode chegar até a 35% de aumento de salário. Isso tudo quando 1,6% do PIB brasileiro já é gasto com o Judiciário, contra uma média de 0,4% no resto do mundo. Isso tudo quando o Judiciário brasileiro custa mais caro que o Bolsa Família.
Colocado nesses termos, temos a seguinte situação: algumas dezenas de milhares de pessoas, que compõem o corpo de funcionários do Judiciário, são mais custosas para o Estado que dezenas de milhões de pessoas que vivem do Bolsa Família, que estão passando fome. Trata-se de uma situação social explosiva.
O trabalhador não pode ficar calado diante do parasitismo total do Estado brasileiro. É preciso reivindicar, junto ao governo, que as riquezas produzidas pelo País sejam destinadas para o interesse do povo, para a saúde, para a educação, para a geração de emprego, para a infraestrutura, e não para alimentar os inimigos do povo e do próprio governo.