Há cerca de 45 dias, mais precisamente no dia 7 de março, a Petrobrás anunciou que, no ano de 2023, obteve o maior lucro líquido de sua história, um total de R$124,6 bilhões. Naquele momento, conforme noticiado pela Agência Brasil, “a estatal brasileira ficou atrás apenas da petroleira estadunidense Exxon em volume de fluxo de caixa livre em 2023, que é o dinheiro líquido à disposição da companhia”. Apesar disso, no dia 8 do mesmo mês, as ações da empresa caíram em 10%, o que foi atribuído por analistas da burguesia à decisão da estatal de adiar o pagamento dos dividendos extraordinários (R$43,9 bilhões) aos acionistas minoritários da Petrobrás, decisão que foi tomada ainda no dia 7.
Ainda naquele momento, Jean Paul Prates, à frente da diretoria da empresa, enviou ao Conselho de Administração uma proposta para que apenas 50% dos dividendos extraordinários fossem retidos temporariamente, enquanto o restante fosse pago aos acionistas. Alexandre da Silveira, ministro de Minas e Energia, por outro lado, se opôs à proposta de Prates.
No Conselho, seis dos 11 integrantes apoiaram a proposta de Silveira, que propôs a retenção do valor total dos dividendos extraordinários em fundo de reserva, de forma que eles pudessem ser utilizados tanto para o pagamento dos acionistas, quanto para cobrir prejuízos.
Os dividendos extraordinários são um pagamento extra que as empresas fazem aos acionistas. No caso da Petrobrás, eles tendem a ser destinados aos acionistas minoritários, que são capitalistas membros da burguesia imperialista. O acionista majoritário da empresa é o governo brasileiro.
Mal a decisão de reter os dividendos extraordinários foi tomada, e os principais jornais da imprensa burguesa passaram a atacar o governo Lula, publicando matérias para afirmar que a Petrobrás estaria em crise. Isto quando a estatal obteve o segundo maior lucro de sua história, em uma conjuntura de redução de 18% nos preços internacionais do barril de petróleo.
As duras críticas e ataques da imprensa e do “mercado”, em função da decisão do Conselho da empresa de não pagar dividendos extraordinários para os acionistas é “compreensível”, se considerarmos a natureza do produto com o qual a estatal gigante trabalha: o petróleo.
Como já foi dito, o lucro líquido da Petrobras em 2023 chegou a R$ 124,6 bilhões, o segundo maior registrado na história da empresa, superado apenas pelo montante do ano anterior: R$ 188,3 bilhões. Para se ter dimensão da importância que tem a Petrobrás para o Brasil, somente no ano passado, a companhia pagou R$ 240 bilhões em tributos à União e demais entes públicos. Para efeitos comparativos, em 2023, o bolsa família, que tira da fome extrema 55 milhões de brasileiros, custou R$ 175 bilhões, valor correspondente a 70% do que a Petrobrás pagou de impostos.
A direção da empresa tomou a decisão de não pagar os dividendos extraordinários, como vinham sendo pagos nos anos anteriores. Foram anunciados R$ 14,2 bilhões em dividendos para o último trimestre de 2023, dentro do modelo de pagamento mínimo da companhia. Não é que a empresa não vá pagar dividendos relativos a todo 2023, ela simplesmente decidiu não pagar os extraordinários, o que vinha fazendo nos anos anteriores.
No entanto, passados quase dois meses após a decisão do Conselho de Administração da empresa, de não pagar os dividendos extraordinários, o governo Lula, sob intensa pressão da direita congressual, secundado pelo trabalho sujo e calhorda da imprensa golpista, anunciou na sexta-feira, dia 19 de abril, a mudança no entendimento sobre pagamento de proventos extraordinários por causa da pressão fiscal (leia-se, pressão política).
Em se tratando de valores, os 50% referentes aos dividendos extraordinários de 2023 (R$43,9 bilhões) representam nada menos do que R$22 bilhões, que irão parar no bolso dos parasitas sanguessugas da maior estatal nacional.
Em busca de explicações e justificativas técnicas para o golpe dos dividendos, a direção da estatal emitiu comunicado onde diz que: “considerando cenários dinâmicos, como a evolução do Brent, do câmbio e outros fatores, o CA entendeu, por maioria, serem satisfatórios os esclarecimentos e atualizações sobre a financiabilidade da Companhia no curto, médio e longo prazo e da preservação da governança, de modo que: (i) eventual deliberação pela Assembleia Geral Ordinária (“AGO”), marcada para o dia 25/04/2024, distinta da proposta da Administração de 07/03/2024, que a distribuição, a título de dividendos extraordinários, até 50% do lucro líquido remanescente (após as alocações às reservas legais e o pagamento de dividendos ordinários), não comprometeria a sustentabilidade financeira da Companhia”. Por fim, a Petrobrás esclarece que “a presente manifestação não caracteriza mudança da proposta da administração divulgada em 07/03/2024, que permanece válida e vigente”. Uma declaração falsa, pois a decisão de 7 de março é clara no sentido de não pagar os dividendos extraordinários a título de qualquer valor.
O governo Lula, acuado por todos os lados e de todas as formas pela pressão da direita e da extrema direita, envereda-se pelo perigoso caminho da concessão cada vez maior aos capitalistas e seus representantes, aos inimigos do povo e da esquerda e ao imperialismo.
Neste sentido, a política de “déficit zero” do ministro da Economia, Fernando Haddad, (política essa do “mercado” e do FMI, que alguns dias se pronunciou elogiando a política fiscal de redução máxima dos gastos públicos do governo argentino do direitista Javier Milei) parece não valer quando os capitalistas reclamam seu quinhão. Haddad mantém a chave do cofre escondida somente para os trabalhadores, como se vê agora na recusa em atender as demandas salariais dos servidores públicos em greve (executivo federal, universidades e institutos federais), que estão a mais de oito anos sem um único reajuste sequer em seus minguados salários. Fica a pergunta ao senhor ministro: por que somente os parasitas do Estado são atendidos em suas demandas? O cofre é único e o tesouro nacional é um só. Se tem dinheiro para distribuir para os acionistas especuladores da Petrobrás, tem que ter dinheiro também para as necessidades dos trabalhadores do Estado, dos servidores públicos, professores, etc.
A direita golpista e reacionária está agindo em todos os terrenos, impondo diversas derrotas ao governo, seja nas ruas, ou institucionalmente, no parlamento, no judiciário, etc.
Na próxima semana, Lula irá se reunir com os chefes mafiosos das duas casas parlamentares (Arthur Lira, presidente da Câmara, e Rodrigo Pacheco, do Senado). Vem aí mais pressão, mais “faca no pescoço” do governo. As demandas de Lira e Pacheco são as mesmas de sempre. Chantagem, pressão e exigências que irão emparedar ainda mais o governo, já demasiadamente acuado e sem condições para agir, para tocar minimamente as questões do dia a dia da administração pública.