A privatização de parte do setor elétrico em vários países, incluindo a compra de distribuidoras de energia elétrica pela Enel, veio acompanhada da perda acentuada na qualidade do serviço, com quedas frequentes de energia e interrupções no serviço.
No Brasil, diversos episódios pelo país demonstram que a gestão e o serviço são precários, e não fruto de problemas localizados. Em Goiás, problemas com a frequência e a duração das interrupções de energia se tornaram uma constante, prejudicando tanto pequenas como grandes empresas, o que levou a perdas econômicas e reclamações generalizadas sobre a eficiência da nova administração privada. Em São Paulo, um episódio em dezembro de 2023 afetou severamente o cotidiano da população, impactando desde o funcionamento de comércios e serviços até a rotina doméstica dos cidadãos, destacando a gravidade dos problemas operacionais enfrentados pela Enel. Um levantamento do Datafolha revelou que 62% dos moradores de São Paulo atribuem à Enel a responsabilidade pelas frequentes quedas de energia na cidade. Este dado mostra que a população está insatisfeita com o serviço prestado pela empresa após sua privatização, refletindo preocupações com a qualidade e a confiabilidade do fornecimento de energia.
Esses problemas muitas vezes são atribuídos à transição de gestão e à reestruturação operacional que normalmente acompanham a privatização. Mas, disfarçados no discurso de jargões corporativos, estão a precarização do trabalho, o aumento da terceirização do serviço e a demissão em massa de trabalhadores mais experientes da empresa.
De fato, a queda brutal na qualidade do serviço pela diminuição dos investimentos e qualificação do quadro de trabalhadores pode explicar o aumento dos ganhos em todo o mundo. A empresa anunciou no final de março que em 2023 o lucro total dos países onde atua dobrou em relação a 2022. A despeito disso, não vem pagando as multas por queda no serviço aqui no Brasil, que estão na ordem de R$ 300 milhões. Isto é motivo para a abertura de processo disciplinar pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), que pode resultar em quebra de contrato.
Esta seria uma das poucas formas de retomada da empresa, já que uma cláusula no contrato encarece em cerca de 230% o valor de compra em relação ao inicial, inviabilizando uma possível negociação. Assim, essa quebra de contrato é a oportunidade de retomada da empresa pelo setor público, que deveria oferecer todos os serviços em áreas estratégicas, como o caso da geração e distribuição de energia. França, Alemanha, Holanda e Reino Unido precisaram reestatizar as empresas de serviços como água, gás e energia para garantir o mínimo de qualidade à população. Está na hora do Brasil fazer o mesmo.