O ano de 2024 promete ser conturbado para o imperialismo após sucessivas derrotas no ano passado. A tão antecipada ofensiva ucraniana de 2023 nunca aconteceu e, às vésperas do aniversário de dois anos com o conflito com a Rússia, a iniciativa está toda do lado russo; na África, golpes de Estado nacionalistas levaram ao poder setores políticos hostis à política imperialista para a região; e, finalmente, a Operação Dilúvio de Al Aqsa inaugurou uma etapa para o Oriente Médio e colocou em crise a ocupação sionista da Palestina. Nesse quadro ainda insere-se um evento histórico: graças ao alinhamento dos calendários, mais de quatro bilhões de pessoas vão às urnas este ano, pouco mais da metade da população do planeta.
Ainda em novembro do ano passado, o semanário britânico The Economist, porta-vozes do setor mais poderoso da burguesia imperialista internacional, anunciaram que aconteceriam eleições em 76 países. A contagem inclui o Brasil, onde a votação elege representantes locais, mas acontece em escala nacional.
Num cenário frágil para a dominação imperialista do mundo, uma embarcação que já coleciona inúmeros vazamentos, cada votação que se aproxima é como uma nuvem carregada no horizonte, anunciando mar turbulento e mais perigo para os donos do mundo. Se as eleições locais no Brasil serão como uma pesquisa de opinião em larga escala sobre a atuação do governo petista, as eleições que acontecem em escala global este ano servirão de termômetro para a política apresentada pelo imperialismo ao mundo.
O teste começou logo cedo, no último domingo (7), quando realizaram-se eleições gerais em Bangladeche. O país vizinho à Índia é um dos maiores produtores têxteis do mundo, tem mais de 170 milhões de habitantes, sendo foco de grandes investimentos chineses, como parte de sua Iniciativa Cinturão e Rota, mais conhecida como a Nova Rota da Seda. O atual governo bengalense, liderado pela primeira-ministra Sheikh Hasina, da Liga Awami, deve vencer as eleições diante do boicote do principal partido de oposição, o Partido Nacionalista de Bangladeche. Não devemos nos deixar enganar pelo nome, nesse caso, a Liga Awami é o partido que representa o nacionalismo burguês bengalense e sua vitória, apesar da aparência antidemocrática, é uma primeira derrota para as ambições imperialistas contra a China na região.
No final de semana seguinte, há uma eleição decisiva: as eleições gerais taiwanesas. O governo do Partido Progressista Democrático (PPD), liderado pela atual presidente Tsai Ing-Wen, apresentou como candidato à presidência o médico Lai Ching-te que, até o fechamento desta edição, aparece com 36% das intenções de voto. A política pró-imperialista, separatista do PPD aparece em risco com a aproximação de Hou Yu-ih, pelo Kuomintang, que nos últimos três meses cresceu de 21% para 31% nas pesquisas de intenção de voto. Apesar de seu papel histórico como força contrarrevolucionária durante a Revolução Chinesa, o Kuomintang é hoje o partido que mais defende a reintegração de Taiwan com a China continental. Caso saia vitorioso no próximo final de semana, deve ser mais um problema para o imperialismo em sua guerra econômica contra a China.
Em fevereiro há eleições em mais dois países de peso ainda na Ásia: Paquistão e Indonésia vão às urnas. No primeiro caso, a instabilidade é mais do que certa com a principal figura política do país, o ex-primeiro-ministro Imran Khan, impedido de participar do pleito e de fazer campanha por estar preso pelo governo militar de exceção. O chamado a votar deve reavivar as gigantescas manifestações de apoiadores de Khan que devem colocar em xeque o regime sustentado pelos militares pró-imperialistas. Já na Indonésia, as pesquisas de opinião apontam vitória fácil da coalizão Indonésia Avançada, ligada ao atual presidente Joko Uidodo, impedido de se reeleger para um terceiro mandato. Uidodo, apesar de sua política conservadora do ponto de vista dos costumes, aproximou comercialmente seu país da China ao ponto que a Indonésia é um dos principais candidatos à entrada nos BRICS. Paquistão e Indonésia têm, respectivamente, 174 e 270 milhões de habitantes.
Dos cinco membros originais dos BRICS, Rússia terá eleições presidenciais em março, que devem confirmar a popularidade do atual presidente Vladimir Putin graças à sua política de enfrentamento contra o imperialismo. Brasil terá eleições municipais, cuja importância não deve ser descartada diante da fragilidade do governo petista. A África do Sul passará por eleições legislativas, que devem ocorrer até maio deste ano a depender de decisão do presidente Cyril Ramaphosa. Prometem ser as primeiras nas quais o Congresso Nacional Africano (CNA) de Ramaphosa deve perder a maioria desde o fim do apartheid em 1994, com grandes chances de que o CNA tenha que governar em coalizão com uma dissidência à esquerda, os Combatentes pela Liberdade Econômica de Julius Malema. Finalmente, na Índia, as eleições parlamentares ocorrem entre abril e maio, ocasião em que 1,4 bilhão de pessoas devem ir às urnas escolher seus representantes.
Tempestuosas votações também devem acontecer em solo imperialista, com destaque para os próprios Estados Unidos, que elegem parlamentares e seu presidente em novembro deste ano. Nas palavras do The Economist, o candidato a enfrentar Donald Trump é um “impopular de 81 anos de idade”, o atual presidente Joe Biden. Não por acaso, Trump já foi legalmente impedido de concorrer à presidência em dois estados, o que deve dificultar sua candidatura, ao mesmo tempo que atiça a polarização já intensa na sociedade norte-americana. A única forma de controlar a crise política no centro do imperialismo mundial, porém, parece ser a perseguição política de dissidentes.
O também impopular atual primeiro-ministro britânico Rishi Sunak tem até janeiro de 2025 para convocar eleições gerais, mas a ocasião propícia parece nunca se apresentar. Em algum momento deste ano o Reino Unido deve ir às urnas numa situação muito difícil para a burguesia, diante de uma inflação exorbitante.
Finalmente, o crescimento da extrema-direita na Europa será verificado nas eleições para o Parlamento Europeu, que também acontecera este ano para a infelicidade do imperialismo.
Ainda destacam-se eleições legislativas em Portugal e na Áustria; eleições presidenciais na Venezuela, que devem selar de vez o fim da direita golpista e 18 eleições na África onde a situação para o imperialismo é muito negativa.
Há apenas um país com o qual os donos do mundo não precisam se preocupar: a Ucrânia. No ano passado, o presidente Volodymyr Zelensky fez questão de aliviar as coisas para seus patrões e cancelou o pleito, certo de sua popularidade inabalável. Uma preocupação a menos para 2024, quer dizer, se desconsiderada a guerra…





