A palavra árabe Nakba, que significa “catástrofe”, é hoje associada a um dos maiores crimes que a humanidade já testemunhou: a limpeza étnica palestina. Apenas entre os anos de 1947 e 1948, calcula-se que mais de 700 mil árabes foram expulsos de suas terras, como consequência da fundação do Estado de “Israel”. A catástrofe que acometeu os palestinos, assim, vai muito além do número gigantesco de refugiados: o Estado de “Israel” significou, para todo aquele povo, mais de sete décadas de assassinatos, torturas, humilhações e prisões arbitrárias.
O futebol brasileiro, guardada as devidas proporções e as devidas diferenças de conteúdo, sofre hoje também de uma catástrofe. E ela se reflete em alguns dados gerais: a Seleção não ganha um título mundial há 21 anos, seus principais jogadores estão no exterior e os clubes brasileiros estão, um a um, sendo engolidos pelas tais Sociedades Anônimas do Futebol (SAF).
A situação é ruim, mas não veio por acaso. Assim como a limpeza étnica palestina foi resultado de um plano cruel e consciente dos sionistas, a catástrofe que acometeu o futebol brasileiro também é resultado de um plano muito bem arquitetado por seu maior inimigo: o imperialismo.
O interesse dos grandes banqueiros europeus e norte-americanos em impedir que o futebol brasileiro tivesse o porte que tem hoje sempre esteve presente. Na verdade, o desenvolvimento do futebol nacional é uma história de sua luta contra os empecilhos colocados por seus inimigos. Nunca houve um incentivo para que o futebol brasileiro se desenvolvesse, muito pelo contrário. E é também muito em função disso que o Brasil acabou por criar o futebol arte. Que é o futebol arte se não o produto de uma extrema necessidade, que é a de driblar a brutalidade dos zagueiros grandalhões europeus, enganar os “esquemas táticos” burocráticos, treinados durante anos pela escolinhas de futebol estrangeiras, e iludir os atletas que são preparados desde crianças para derrotar os brasileiros?
Na luta do futebol brasileiro contra o imperialismo, ele forjou o seu maior trunfo: o Rei Pelé, o homem que desenvolveria de maneira tão magistral os dribles contra os interesses estrangeiros que acabaria por revolucionar o esporte. O homem que, ainda que brasileiro, negro e de origem muito humilde, teria de ser aceito nos mais luxuosos e elitistas palácios do mundo.
O Rei Pelé, dada a sua grandiosidade, forçou o imperialismo a esconder, durante um período, o seu ódio ao futebol arte. Pelé era querido em todo o mundo. Edson Arantes foi capaz de parar guerras, jogou futebol em todos os continentes e foi visto como um verdadeiro embaixador dos povos oprimidos. Pelé obrigou até mesmo a imprensa lesa-pátria brasileira a fingir contentamento com os títulos conquistados na Copa do Mundo.
Mas Pelé, ainda que sua importância para o futebol seja definitiva, ainda que, em nossas memórias, seja eterno, não era eterno enquanto homem. E se perdemos Edson Arantes em um 29 de dezembro como este, o Pelé jogador de futebol já havia saído de campo havia muito tempo. Natureza ingrata! O futebol, uma das artes mais sublimes, que encanta a todos que o vê, que forjou uma majestade, idolatrada em todo o mundo, que fez o Brasil ser respeitado, é ao mesmo tempo, uma das artes que menos dá tempo aos seus mestres para desenvolvê-la. Aos 31 anos, o Rei se aposentava da Seleção Brasileira. Aos 34, do Santos. Aos 37, deixava os gramados para sempre.
A saída do Rei da Seleção Brasileira não poderia ter causado um estrago maior. Se Pelé conquistou três Copas em apenas 12 anos, demoraríamos o dobro do tempo, 24 anos, para voltarmos a conquistar o mundo. A maldição agora se repete, de tal modo que, passados 52 anos da despedida do Rei da canarinho, o Brasil ainda não conseguiu dobrar a quantidade de troféus.
No Santos, a situação é semelhante. O time nunca chegou perto de ser o que foi nos dias de Pelé. E pior: um ano depois da morte do Rei, o Peixe foi, pela primeira vez em sua história, rebaixado para a Série B do Brasileirão.
No que perdemos nosso maior combatente na luta contra as forças hostis ao futebol brasileiro, aqueles que sempre odiaram a arte desenhada pelos pés de Pelé, Garrincha e Nilton Santos se sentiram à vontade para uma ofensiva contra o futebol. Pouco a pouco, expulsaram nossos craques de nossas terras, constrangendo-os a viver na Europa. Pouco a pouco, a imprensa burguesa começou sua campanha de que o futebol brasileiro estaria em seus momentos finais. Pouco a pouco, os estádios foram dando lugar às arenas e o torcedor operário foi sendo expulso das arquibancadas, sendo tratado como animais pela polícia.