“O inimigo continua recebendo golpes de nós, e o que está por vir será ainda maior”. Essa frase impactante é parte do discurso feito por Abu Obeida, porta-voz das Brigadas al-Qassam, braça armado do Hamas, no dia 10 de dezembro. Naquela ocasião, Obeida explicou como as forças de defesa de “Israel” estavam tendo dificuldades em derrotar as forças terrestres do Hamas.
“Em 10 dias, nossos combatentes conseguiram confrontar as forças inimigas em várias frentes antes do cessar-fogo nas regiões norte, central e sul”, atestou o porta-voz das Brigadas al-Qassam. “Nossos combatentes destruíram com sucesso mais de 180 veículos militares em 10 dias, incluindo blindados, tanques e escavadeiras (…) realizamos um número significativo de operações contra as forças de artilharia fora dos assentamentos, envolvendo forças dentro de edifícios e emboscadas contra forças de infantaria (…) realizamos dezenas de operações de franco-atirador e detonamos um campo minado (…) nossas operações resultaram em um grande número de fatalidades e feridos confirmados [das forças sionistas], e nossos combatentes retornaram em segurança às suas bases após cada operação”.
A declaração de Abu Obeida é, em primeiro lugar, um balanço militar do conflito entre “Israel” e os combatentes palestinos. Um balanço que, para quem não está diretamente envolvido no confronto, é extremamente difícil de fazer, diante da falta de informações e, principalmente, da manipulação de informações.
A diferença do balanço militar feito por Obeida para o balanço feito pelo governo israelense é que o primeiro é perfeitamente verossímil, enquanto o segundo não tem lastro na realidade. Segundo as Brigadas al-Qassam, “Israel” não está tendo êxito em invadir a Faixa de Gaza – pelo contrário, está sofrendo várias baixas. Há motivos para crer nisso? Sim. Segundo apologistas do governo sionista, “Israel” estariam em uma caça implacável contra o Hamas, destruindo túneis e acabando com a infraestrutura do grupo islâmico. Há motivos para crer nisso? Não.
O jornal sionista Haaretz já divulgou que o governo israelense reconheceu que 1,3 mil soldados estariam gravemente feridos. Considerando que esse é o número oficial, o número real deve ser muito superior. Ao mesmo tempo, David Orin Baruch, diretor do cemitério Monte Herzl e responsável pelo enterro dos soldados israelenses mortos nos combates em Gaza, afirmou que estavam sendo organizados dezenas de funerais todos os dias.
“Estamos passando por um período em que a cada hora há um funeral, a cada hora e meia um funeral […] Fui solicitado a abrir um grande número de sepulturas. Apenas no cemitério Monte Herzl, enterramos 50 soldados em 48 horas”, disse Baruch.
Destaque-se ainda que “Israel” foi incapaz de comprovar que tenha conquistado um pedaço sequer do território da Faixa de Gaza que é hoje controlado pelo Hamas.
A declaração de Abu Obeida é, em segundo lugar, um balanço político do conflito. Os “golpes” que estão sendo desferidos pelos combatentes islâmicos vão muito além das balas que perfuram os corpos dos soldados israelenses. No que diz respeito à opinião pública mundial, “Israel” já perdeu a guerra. Nunca antes, em toda a história do enclave imperialista, houve tantas e tão numerosas manifestações em todo o planeta contra o sionismo.
As manifestações vêm ocorrendo em todos os continentes, sem exceção. E não há, em nenhum país, uma mobilização pró-“Israel” com a qual possa ser comparada. Pelo contrário: a única oposição às manifestações vêm dos Estados que são cúmplices do genocídio sionista. Vêm da imprensa imperialista venal, que reproduz as falsificações produzidas pelo Mossad e pela CIA. Vêm da Polícia Federal e do Judiciário brasileiros, que foram pilares no golpe de 2016 e que são peças-chave para a perseguição dos inimigos do regime político.
O 7 de Outubro consistiu em um ponto de inflexão na opinião pública mundial em relação a “Israel”. E a mudança é tão significativa que está impactando até mesmo o regime norte-americano – isto é, o país mais importante do planeta. A situação é tão grave que, segundo a imprensa local, o secretário de Estado norte-americano, Anthony Blinken, teria dado um ultimato de “poucas semanas” para que “Israel” terminasse a guerra. Ao mesmo tempo, Benjamin Netanyahu afirmou que não irá cessar os bombardeios até que “extermine o Hamas”, sendo que seu ministro da Defesa, Yoav Gallant, teria pedido “meses” aos Estados Unidos para conseguir derrotar os combatentes islâmicos. É inegável, portanto, que os aliados históricos estão “batendo cabeça”. E o motivo é claro: os Estados Unidos, que passarão por eleições presidenciais em 2024, querem que o conflito se encerre, de modo a reduzir a pressão popular sobre seus governantes, enquanto o governo sionista não conseguirá cumprir sua promessa de “exterminar o Hamas” em pouco tempo.
A declaração de Abu Obeida é, por fim, profética. Ela anuncia que há coisa “pior” por vir para “Israel”. Não há como negar que, aqui, a luta política se mistura com a tradição religiosa de todos os povos do Oriente Médio.
A luta dos oprimidos é, em primeiro lugar, um dever, de acordo com o livro do Islã, o Corão.
“Combatei, pela causa de Deus, aqueles que vos combatem; porém, não pratiqueis agressão, porque Deus não estima os agressores” (2:189).
“Matai-os onde quer se os encontreis e expulsai-os de onde vos expulsaram, porque a perseguição é mais grave do que o homicídio. Não os combatais nas cercanias da Mesquita Sagrada, a menos que vos ataquem. Mas, se ali vos combaterem, matai-os. Tal será o castigo dos incrédulos” (2:190).
Para o Islã, não combater os opressores é, inclusive, imoral:
“Não reparastes (ó Mohammad) nos líderes dos israelitas que, depois da morte de Moisés, disseram ao seu profeta: Designa-nos um rei, para combatermos pela causa de Deus. E ele perguntou: Seria possível que não combatêsseis quando vos fosse imposta a luta? Disseram: E que escusa teríamos para não combater pela causa de Deus, já que fomos expulsos dos nossos lares e afastados dos nossos filhos? Porém, quando lhes foi ordenado o combate, quase todos o recusaram, menos uns poucos deles. Deus bem conhece os iníquos” (2:246).
Para o povo árabe, para quem sua terra teria 40 mil profetas, a vitória final contra o inimigo é, há muito tempo, esperada. E ela não apenas aumenta a determinação daqueles que lutam, pois lutam por uma causa justa, mas também por todo o povo árabe, que hoje habita dezenas de países e, assim, preparam uma rebelião generalizada contra os seus opressores.
“A quem, pois, combater pela causa de Allah e for morto ou for vencedor, concederemos magnífica recompensa”, promete o Corão (4:74).
Fato é que, independentemente do Islã, a vitória nunca esteve tão próxima. A profecia de Abu Obeida, neste sentido, vai muito além que um discurso encorajador. Ela é concreta, ela parte do que acontece neste momento. Há muito por vir contra o Estado de “Israel”.
A crise política é o indicativo de que “Israel” já está “com a língua de fora”, exausto. Ao mesmo tempo, seu principal apoiador enfrenta crises em todo o planeta, em todos os continentes, de tal forma que, em algum momento, pode abandonar o Estado que ele mesmo criou, assim como hoje faz com o regime de Kiev, fruto de suas conspirações no Leste Europeu.
Mas, não esqueçamos: o Hamas não luta sozinho. Ao seu lado, estão milhões de irmãos muçulmanos, que não apenas apoiam o Hamas, ajudando a esconder seus combatentes, ludibriando as forças sionistas e sabotando os invasores. O Hamas hoje é apoiado por forças paramilitares poderosíssimas. O Hesbolá, com 200 mil combatentes, é tido como o maior exército paramilitar do planeta, tendo, inclusive, armas mais poderosas que o Exército brasileiro. E o Hesbolá está de corpo e alma na luta pela destruição de “Israel”.
Em seu discurso histórico, proferido no dia 3 de novembro, naquilo que muitos consideram o ingresso oficial do Hesbolá na guerra contra “Israel”, o líder do partido libanês, Hassan Nasrallah, sintetizou o espírito solidário do povo muçulmano e a disposição de lutar até a vitória:
“Nós parabenizamos todos os mártires que ‘caíram’, os civis, as mulheres, homens, velhos e jovens. Nós os parabenizamos por esta transição massiva para o Paraíso, onde não há opressão israelense ou arrogância norte-americana. Sem matanças, sem massacres, sem perseguições. E é com esta firme convicção que nós os parabenizamos e às suas famílias. Dizemos: não há batalha mais justa do ponto de vista jurídico, ético ou religioso, que aquela contra os ocupantes sionistas. Esta é uma batalha contínua. Lutar nesta batalhe é o mais óbvio, o mais honesto e o mais nobre serviço a Deus. Isto é o que deve ser estabelecido em primeiro lugar”.
Não há como ignorar, ainda, os bravos ataques dos Ansar Alá, os Hutis, aos navios israelenses ou que tenham o enclave imperialista como destino. A ação assustou tanto o imperialismo que sua imprensa tem dito que o grupo iemenita poderá afetar a economia mundial. Em discurso firme, o líder do grupo criticou duramente os governos árabes – os “iníquos” dos quais o Corão fala – por não apoiarem os seus irmãos:
“Instamos os países árabes a nos permitirem uma guerra direta com Israel e os EUA. Se os árabes querem ser uma plateia aplaudindo os norte-americanos, que aplaudam. Se querem dançar sobre os restos das vítimas, que dancem, mas não devem se unir à guerra norte-americana contra nós”.
A ação bastante ofensiva dos iemenitas, bem como as declarações firmes do Hamas mostram que os combatentes árabes não estão em uma posição de se render e baixar a cabeça para o imperialismo. Pelo contrário: são atitudes de quem está vendo que seu inimigo não é o que diz ser, que é muito mais fraco do que procura dizer que é. Não é à toa, portanto, que o Hamas se negou a negociar um “cessar fogo” parcial com “Israel”: o Hamas sabe que quem quer negociar é o inimigo, enfraquecido, em uma tentativa de se recuperar para continuar a oprimir o povo árabe.
Que o pior esteja por vir, para os Estados Unidos e “Israel”! Que o Hamas continue a executar sua magnífica sinfonia, cuja abertura foi a Operação al-Aqsa, e que continua sendo conduzida magistralmente por seus dirigentes! E que a história – como só ela é capaz de fazer – nos entregue, no ano que vem, aquelas belas surpresas, como foram os golpes nacionalistas na África deste ano e como foi a expulsão das tropas norte-americanas pelo Talibã em 2021!