O Estado de Israel está massacrando os palestinos em Gaza, promovendo uma limpeza étnica de dar inveja aos nazistas. A obrigação de qualquer pessoa de esquerda é denunciar esses crimes de Israel e dar apoio incondicional à resistência palestina. Incondicional.
Mas parte da esquerda ainda se perde em considerações ideológicas – verdadeiras ou falsas. Essas considerações dogmáticas, diante de um conflito dessa magnitude, leva a posições políticas bem reacionárias. Esse é o caso de um texto publicado pela corrente interna do PSOL chamada Esquerda Marxista.
Logo no início de seu texto, chamado “Guerra e Paz na Palestina – sobre o caráter de Israel, do sionismo, do Hamas e da Autoridade Palestina”, a Esquerda Marxista parece mais preocupada em criticar o Hamas do que os genocidas israelenses.
“Durante 40 anos a Irmandade Muçulmana jogou bombas no governo egípcio dizendo que queria derrubá-lo. O Fatah fez a mesma coisa por décadas na Palestina contra o regime de Israel. O Hamas continua a mesma política. É um fracasso total. Foi para todos eles. (…) Na Palestina, a única luta que chegou a colocar na parede o sionismo foi a Intifada, um levante de massas. As massas revolucionárias armadas com pedras fizeram mais danos aos sionistas e abalaram Israel. O que a ‘luta armada’ e terrorista de homens bombas e foguetes do Hamas nunca fez.”
O texto faz uma consideração completamente anormal dos métodos de luta das organizações palestinas. Segundo a Esquerda Marxista, apenas a luta de massas é capaz de obter algum sucesso. Certo, muito bonito. O que o dogmatismo não os deixa ver é que a existência de grupos como o Hamas é uma expressão desse levante de massas. Se a intifada foi importante do ponto de vista dos danos a Israel, ela foi ainda mis importante para fazer as massas palestinas compreenderem que com apenas pedras seria impossível derrubar Israel.
E é por isso que hoje, ao invés de pedras, os palestinos têm condições de atacar com armas e até mísseis. Por mais debilitado que seja seu arsenal se comparado ao de Israel.
Segundo os gênios revolucionários da Esquerda Marxista, os palestinos deveriam estar até hoje jogando pedras em Israel. Quem sabe um dia as pedras não começam a furar tanques e derrubar foguetes.
É uma posição que, além de dogmática, é ridícula.
Pior ainda, a Esquerda Marxista avalia como um “fracasso total” a ofensiva do Hamas. É uma colocação fora da realidade. A ação do Hamas desencadeou a maior crise internacional e revolucionária das últimas décadas.
Vamos colocar uns dirigentes da Esquerda Marxista lá na Palestina com suas pedras e vejamos – se eles realmente tiverem coragem de jogar pedras – se eles são apazes de provocar uma crise dessa envergadura.
A ação do Hamas, nesse sentido, foi um sucesso político. O povo palestino é massacrado constantemente e o que o Hamas fez foi conseguir uma ação que demonstrou a fraqueza do regime israelense. A vitória militar é difícil e é preciso esperar, mas a vitória política do Hamas já aconteceu.
“Os marxistas sabem muito bem que a luta que pode ajudar a resolver os problemas imediatos e históricos dos povos e dos explorados e oprimidos é a luta de massas. Nenhum tipo de luta conspiratória, terrorista ou isolada, vanguardista, pode chegar a um bom termo. Há muito tempo o marxismo já derrotou politicamente o blanquismo, o terrorismo individual, as correntes carbonárias. Além disso, todas estas milícias islâmicas são capitalistas, medievais em seus preceitos de sociedade e de vida, reacionárias em toda a linha. O fato de que se enfrentem com o imperialismo e diversos regimes locais não quer dizer que não sejam elas próprias tão ou mais obscurantistas e medonhamente reacionárias quanto os atuais regimes da região.”
Os marxistas acreditam na luta das massas. Isso é fato. Mas há muitas maneiras de se cegar à luta das massas e há muitas maneiras em que essa luta de massas se expressa. Ela pode se expressar, por exemplo, na constituicão de um grupo “terrorista”, com o apoio de dezenas de milhares de pessoas, que inclusive venceu as eleições no país. Estamos falando do Hamas.
O Hamas é uma organização de massas.
Quando a Esquerda Marxista diz que nenhum tipo de “luta conspiratória” pode chegar a um “bom termo” ela demostra completa ignorância da história. Vamos apenas pegar um exemplo muito famoso: a Revolução Cubana. Na tese da Esquerda Marxista, os guerrilheiros liderados por Fidel e Che não chegaram a um “bom termo”. E nós que pensávamos que a Revolução Cubana tinha até expropriado a burguesia…
O dogmatismo impede de enxergar a realidade. Mas nesse caso, o dogmatismo serve como cobertura para uma posição covarde e até reacioário movida pelo medo de apoiar o Hamas e os grupos armados que estão heroicamente resistindo em Gaza.
E por fim, o trecho final da citação revela o reacionarismo da Esquerda Marxista. Para eles, os grupos islâmicos são “capitalistas e medievais”, uma colocação bastante estranha para um grupo tão dogmático. Mas é muita canalhice atacar o Hamas como capitalista sendo que o grupi conta com o apoio das amplas massas do povo palestino. Eles pode não ser socialistas, mas para que serve a acusação de que seriam capitalistas? E qual capitalismo é esse numa região onde toda a população é esmagada?
A posição da Esquerda Marxista é vergonhosa. E o mais impressionante é o gran finale: segundo a Esquerda Marxista, os grupos que resistem na palestina são “tão ou mais obscurantistas e medonhamente reacionárias quanto os atuais regimes da região”. É uma colocação extremamente calhorda. Será que esses grupos são tão obscurantistas quanto o Estado de Israel? Fica a dúvida.
A posição da Esquerda Marxista é a de um grupo que está profundamente dominado pela ideologia imperialista. Para o grupo, inclusive, o imperialismo não é tão ruim assim, o Hamas é até pior…