Nessa segunda-feira, dia 9 de outubro, a filósofa Márcia Tiburi publicou, no sítio Brasil 247, coluna intitulada “A guerra ou a compaixão”. Tal qual o título, a matéria repete um monte de generalidades e bobagens identitárias para desviar o foco da origem das guerras e da exploração dos trabalhadores do mundo. “Um questionamento sobre a dor dos outros” , diz a filósofa, em estilo blasé. O início de seu texto já parte pelo identitarismo:
“Guerras são formas patriarcais de fazer política. No patriarcado as guerras servem para unir vários maus afetos num circuito destrutivo e impotente: o desejo de dominar, de subjugar, o ódio, a inveja, a disputa, a humilhação, o rancor e o ressentimento encontram um espaço comum e mutuamente produtivo.”
No momento em que a Palestina, incluindo vários movimentos de libertação, com destaque para o Hamas, inicia uma operação de guerra contra Israel e a colonização que já dura 75 anos, Tiburi tem a contribuir que “guerras são patriarcais”. Se ao menos o mundo fosse governado por mulheres, não é mesmo? Mulheres como Hillary Clinton, Kamala Harris, Victoria Nuland. Verdadeiras guerreiras, no sentido de que fazem a guerra contra os oprimidos do mundo. A afirmação de Márcia Tiburi encobre o real motivo de todas as guerras na atualidade: a dominação imperialista do planeta, dos países atrasados.
As guerras não unem interesses econômicos da burguesia imperialista parasita, mas “maus afetos” e “desejo de dominar”, entre outras generalidades, por quem parece sequer viver no mundo real. Talvez ela não saiba que as bombas que chovem sobre Gaza, o bloqueio econômico imposto a toda a Palestina, Cuba, Irã, Venezuela, tem mandantes e interesses econômicos materiais por trás de si, e não sentimentos vagos, fruto de “sujeitos patriarcais”. Os palestinos não arriscam a vida por “ressentimento”, simplesmente, o que é provável que sintam, mas para se libertarem de uma situação de absoluta repressão que os impede sequer de ter acesso a água potável: 97% da água em Gaza é imprópria para consumo. Continuemos.
“As guerras produzem lucro para a indústria das armas, mas como produto da indústria do espetáculo, elas ajudam a produzir e reproduzir o vazio mental e emocional das massas.”
Ou seja, segundo a acadêmica, as guerras são um fim em si mesmo, e não movidas para a conquista de recursos, como petróleo, urânio, cobre, lítio, ou para garantir a dominação em determinadas regiões do mundo de modo a garantir acesso a tais recursos. Apenas a indústria patriarcal das armas é que lucra. Não é que exista uma necessidade do capital de se expandir e reduzir a capacidade produtiva da humanidade, destruindo por exemplo toda a indústria do Iraque e a substituindo em parte por empresas dos EUA, e em parte simplesmente fazendo-a deixar de existir.
Não há propaganda imperialista para defender esses interesses também, de acordo com a filósofa. O que existe é uma indústria do espetáculo, que “produz e reproduz o vazio mental e emocional das massas”, mas certamente que não o “vazio mental e emocional” da autora do artigo.
“De fato, a guerra é uma mercadoria importantíssima na indústria do sofrimento e da tristeza sem a qual o capitalismo já teria sido superado.”
Novamente, subjetividades vagas. Nada de material, concreto, mas “produção de sofrimento e tristeza”. Para que serve essa bobajada? É muito simples, essa é a forma de “produzir e reproduzir vazio mental e emocional”. Leva à conclusão de que o mundo é triste porque o ser humano é assim mesmo, e não há forma real de superar tal situação, visto que a realidade não está colocada por interesses materiais que podem ser combatidos, mas por sentimentos, ideias vagas e generalidades. O que expressa e propagandeia Márcia Tiburi é a paralisia, a não luta. E ela mesma o explicita:
“A indústria da guerra é a indústria da tristeza que nos faz acreditar que a espécie humana não tem jeito, que devemos desistir de constituir uma comunidade humana feliz e justa, baseada na generosidade e na solidariedade, no respeito e no cuidado.”
“Contra a guerra, a compaixão como capacidade de imaginar o sofrimento dos outros é um sentimento cada vez mais raro que se torna, ao mesmo tempo, cada vez mais urgente. Infelizmente, a compaixão não faz parte do capitalismo. Ela foi extirpada do próprio cristianismo em sua unidade cada vez mais extremista com o capital.”
Este parágrafo acima desenvolve essa falta de perspectiva, mas se baseia numa falsidade total. Por todo o planeta a oposição à ofensiva da OTAN na Ucrânia, contra a Rússia, está colocada. Desde nos países da África que se libertaram do imperialismo, como no núcleo do próprio imperialismo: nos EUA, na Alemanha, na Itália, na França, na Inglaterra, manifestações irrompem contra o financiamento da guerra, do governo fantoche da Ucrânia.
O apoio à Palestina, contra a dominação colonial de Israel, é igualmente internacional. Por todos os cantos do mundo, tanto nos países atrasados como nos países imperialistas, e até no núcleo duro, nos EUA, grandes protestos em solidariedade à Palestina vem ocorrendo, contra o financiamento do imperialismo a Israel e contra a participação dos EUA na guerra. A filósofa ignora tudo isso, ignora que para se libertar, os explorados precisam lutar contra aqueles que os exploram e buscam explorar ainda mais. Desde a Rússia contra a OTAN, à Palestina contra Israel, o que se vê é a guerra de libertação dos explorados, não o patriarcado, o rancor, ou qualquer generalidade, mas a libertação concreta, material desses povos.
“Resta saber se somos capazes de retomar a nossa imaginação sobre a dor dos outros e buscar caminhos para eliminar o sofrimento do mundo.”
Resta saber se a autora do artigo é capaz de “retomar a imaginação sobre a dor dos outros” e apoiar a luta dos explorados, ao invés de expressar a política do imperialismo, na busca de confundir o panorama e diluir o apoio às lutas de libertação que ora ocorrem no planeta. Todo apoio à Rússia! Todo apoio à Palestina!