Uma verdadeira aula de política está sendo dada pelo deputado federal de extrema-direita Matt Gaetz nos Estados Unidos. Não me levem a mal, não concordo com sua política ou objetivos, estando do outro lado, diametralmente oposto, mas política é uma arte, e como arte é praticada por ambos os lados do plenário. Para ser ainda mais justo, não somos os primeiros da esquerda a comentar este momento virtuoso da política, nos Estados Unidos diversos setores estão comentando o caso e as lições a serem tiradas dele.
Para os que não acompanham a política norte-americana, o que foi feito pelo deputado? Simples, ele faz parte de uma bancada dentro da bancada do Partido Republicano, de parlamentares de extrema-direita, o grupo, liderado por Gaetz acaba de levar abaixo, pela primeira vez na história dos Estados Unidos, um presidente da Câmara. Nunca antes na história daquele País um presidente da Câmara ficou sem terminar o mandato.
Como ele fez isso? Com grandes números de votos e negociatas tradicionais na política brasileira? Não. Gaetz tinha apenas 8 votos, ele virou a política do seu país de ponta cabeça com 8 votos. Vamos explicar em detalhes.
O Congresso é dividido em dois partidos, 222 deputados do Partido Republicano e 213 deputados do Partido Democrático. Quando os republicanos formaram maioria nas eleições, foi dado a eles o privilégio de eleger o presidente da câmara. A ala mais pró-imperialista do partido nomeou Kevin McCarthy como candidato, então o bloco liderado por Gaetz mostrou que sabe fazer política. Eles mantiveram a candidatura de McCarthy refém durante 15 votações, usando seus 8 votos. O regimento interno exige que o presidente da câmara tenha que ser eleito com maioria absoluta. Gaetz lançou uma candidatura avulsa, e com seus oito votos manteve o Congresso dos Estados Unidos refém. Finalmente ele cedeu, e elegeu McCarthy, mas não sem concessões pesadíssimas da maioria dos 222 deputados de seu partido. A principal delas é que o presidente da Câmara possa ser derrubado pelo pedido de um único deputado.
No momento da eleição do presidente nós já vimos o princípio de Arquimedes, “dai-me uma alavanca e movo o mundo”, quando a política tem um sentido claro e busca se colocar no centro do conflito de duas forças poderosas, um pequeno grupo pode levantar o mundo.
Do momento da eleição do presidente da Câmara, a espada de Damocles estava colocada na sua cabeça, ele era refém de oito deputados. Quando McCarthy fechou um acordo com os democratas, a bancada de extrema-direita se rebelou e cortou-lhe a cabeça.
A esquerda norte-americana, ao ver este quadro de alavancagem brilhante, repreendeu os parlamentares da esquerda democrata por não terem feito o mesmo quando tiveram a chance. Apenas dois anos antes a esquerda democrata teve a oportunidade de tomar o partido refém numa manobra similar, com mais votos até, e exigir que o Partido fizesse pesadas concessões, mas se absteve de fazê-lo. Aí vemos a diferença entre uma esquerda pequeno-burguesa e identitária, sem sangue nas veias, e uma direita burguesa, mas radical e decidida a pôr tudo abaixo para se ver vitoriosa. É um problema de classe e de mentalidade.
A mentalidade da pequena-burguesia (classe média) de esquerda é de uma obediência canina às instituições e ao regime político, querem ser aceitos pela grande burguesia que eles cinicamente chamam de “regime democrático”. A extrema-direita nascida de uma das duas classes fundamentais da sociedade, um setor menor dos capitalistas, mas capitalistas de qualquer forma, não liga para esses absurdos retóricos. Não liga se a imprensa irá linchá-la, se irá gerar incomodo em outros setores do capital, não liga para a opinião de ninguém. Para ser justo, eles aprenderam isso conosco, com o marxismo, mas o marxismo de outra época. Nisso reside sua força política. É radical, tem uma política ancorada nos interesses de sua classe e isso lhe dá força. Nisso reside o apoio que eles detém fora da classe capitalista também, as pessoas seguem uma política forte e decidida, por mais reacionária que seja.
A esquerda operária deve se espelhar, literalmente, neste modus operandi. Se tornar um oposto da extrema-direita, mas não esquecer estas lições valiosas da arte política. Uma greve ou ocupação de terras ou até de prédios públicos colocada no lugar correto, na hora correta, sem ligar para o que ninguém diz e defendendo de forma radical os interesses do proletariado pode mover montanhas. Um pequeno partido, que seja barulhento e com uma política decidida, ancorada nos interesses das amplas massas, pode mobilizar várias vezes o seu tamanho. A política permite muito, contanto que saibamos como utilizá-la. O PCO já tem feito isso e tem movido massas várias e várias vezes maior que si, de um lado do plenário e de outras, a sua direção tem mostrado uma perspicácia única e alavancar os grandes pesos da sua situação política, é preciso ver esse exemplo norte-americano como uma confirmação do método, e ver que é possível fazer muito mais.