Durante a participação do Brasil na reunião do G20, o presidente Lula se deparou com uma das campanhas mais bizarras dos últimos tempos. Espalhados pela principal via de saída do aeroporto de Nova Délhi, vários painéis de publicidade foram colocados com os seguintes dizeres: “em 132 anos, o Brasil nunca teve uma mulher negra no STF”, “presidente Lula, contamos com você para indicar uma mulher negra para o STF” e “os votos de mulheres e negros foram essenciais para a eleição de Lula em 2022”.
Os painéis estão longe de serem uma iniciativa isolada. Ao mesmo tempo em que os supostos defensores da “mulher negra” organizaram essa “recepção” para o presidente da República, o comediante (sic) Gregório Duvivier também decidiu convocar um “café com juristas negras” e pressionar Lula para que participasse. A atriz global Taís Araújo, por sua vez, também emprestou sua voz a um vídeo de grande produção exigindo uma ministra negra.
Toda essa campanha, curiosamente, não acompanha qualquer tipo de movimento popular. É uma campanha tipicamente burguesa, uma campanha em que um setor minoritário procura impor o seu interesse. É semelhante, por exemplo, ao que foi feito recentemente na tentativa de aprovar o Projeto de Lei 2630, o PL das “fake news”.
A diferença da campanha em torno do PL das “fake news”, no entanto, é que, enquanto o primeiro tinha como objetivo apenas pressionar o parlamento para aprovar um projeto de lei de interesse dos grandes capitalistas, a campanha da mulher negra, além deste, tem um outro objetivo: desestabilizar o governo. Isto é, o de constranger o governo perante o seus apoiadores. Implicitamente, na campanha, está a seguinte mensagem: Lula é tão “conservador” que é necessário uma grande campanha para que ele nomeie uma mulher negra – e, talvez, mesmo assim, nem o faça.
Não por acaso, essa campanha aparece no mesmo momento em que o grande capital já mostrou sua insatisfação com o governo Lula, especialmente em sua política externa. E a imprensa nacional, porta-voz do imperialismo, segue servilmente à campanha, acrescentando ainda um ataque feroz às posições anti-lavajatistas do presidente, A campanha supostamente “esquerdista” – que, no fundo, é profundamente reacionária – seria, portanto, uma peça a mais na engrenagem golpista que se forma contra o governo.
A campanha, contudo, é apenas a repetição da história recente. Nos anos anteriores ao golpe de 2016, a burguesia organizou campanhas semelhantes e cooptou setores da esquerda para elas. A campanha Não Vai Ter Copa, encabeçada por Guilherme Boulos, e a campanha contra a usina de Bolo Monte tiveram um importante papel em mobilizar setores da esquerda contra o governo Dilma Rousseff, que seria derrubada futuramente.
A campanha da mulher negra, portanto, traz maus presságios. É sinal de que vem golpe por aí, e a burguesia já está a todo vapor cooptando setores da esquerda para seus próximmos movimentos.