Nesta terça (25), o presidente Lula, no seu programa semanal “Conversa com o presidente”, defendeu o fechamento de “quase todos” os clubes de tiros particulares do país, deixando “aberto aqueles que são da Polícia Militar, do Exército e da Polícia Civil”. A declaração colocou na ordem do dia a discussão a respeito do direito ao armamento da população, além de expor a confusão que gira em torno dela.
Particularmente dentro da esquerda em geral é predominante a posição em defesa do “desarmamento”. Explicaremos mais adiante que esse “desarmamento”, na verdade, não consiste num desarmamento geral da população. Por outro lado, os “armamentistas” seriam os bolsonaristas e a extrema-direita. E a posição do PCO? Onde fica? Estaria o PCO ao lado dos bolsonaristas nessa questão?
A título de exemplo da confusão que reina sobre o caso, basta citar a participação do deputado federal do PT-PR, Tadeu Veneri, no programa Live CNN desta quarta (26). Discutindo justamente a declaração do presidente, o deputado afirmou: “A extrema-direita defende que a população esteja armada. O PCO também defende que a população esteja armada, e ambos parecem uma ferradura, em que um está numa ponta e o outro na outra, mas muito próximos. O PCO defende que as favelas, os movimentos armados rurais… que toda a população seja armada. Já eu acredito que não seja a mesma coisa que defende a extrema-direita. Mas [a extrema-direita] defende que uma parcela da população esteja armada.”
O deputado recorre à conhecida “teoria da ferradura” para afirmar que o PCO e o bolsonarismo teriam, se não as mesmas, pelo menos posições parecidas na questão do armamento da população. Nada mais falso.
Está inscrito no programa do PCO a defesa do direito ao armamento geral do povo. Herdeiro das tradições e conquistas revolucionárias desde as revoluções burguesas dos séculos XVI, XVII e XVIII, em especial a Revolução Francesa, o PCO considera que a defesa das liberdades democráticas, entre as quais figura o direito ao armamento, é parte essencial da luta pelo socialismo. O direito ao armamento, nesse sentido, é um item fundamental de um conjunto de direitos no qual estão presentes também a liberdade de expressão, o direito de manifestação, o direito de associação, as garantias do devido processo legal (como a presunção de inocência, o juiz natural etc.), entre outros.
Num país de capitalismo atrasado, em que as tarefas da revolução democrática nunca foram efetivamente realizadas do ponto de vista histórico, não é possível falar em defesa dos interesses dos explorados sem desenvolver seriamente uma luta em defesa dos direitos democráticos.
“Democracia”, para os revolucionários, é sinônimo de governo do povo. Defende-se a liberdade de expressão, o direito de associação e manifestação, o direito ao armamento para que o povo tenha poder sobre a entidade política que paira acima dele, o Estado. Um povo que não desfrute nem possa exercer os direitos democráticos é um povo escravizado.
A maioria das organizações da esquerda parece ter esquecido completamente o ABC da política progressista (para não dizer política revolucionária).
O deputado petista afirma que a posição do PCO e dos bolsonaristas, na questão do armamento, estariam próximas. Ele próprio encontra dificuldade de demonstrar essa proximidade, já que afirma que o PCO “defende que as favelas, os movimentos rurais… que toda a população seja armada”, ao mesmo tempo em que reconhece que isso não se trata da mesma coisa que defende a extrema-direita. Na verdade, não só não são a mesma coisa, como são coisas essencialmente diferentes.
Basta refletir com atenção para verificar que a proximidade, com efeito, se dá entre a posição atual da maioria da esquerda e os bolsonaristas. Ambas as posições partem de uma mesma premissa: apenas uma pequena parcela da população tem direito ao armamento. Embora divirjam quanto à dimensão dessa parcela, tanto essa esquerda quanto os bolsonaristas negam o direito geral, o direito democrático ao armamento a toda a população. Podemos afirmar tranquilamente que a defesa do direito democrático ao armamento no país é uma exclusividade do PCO.
Não é agradável dizer, mas não se pode deixar de destacar que a posição do petista é ainda mais reacionária e antidemocrática do que a dos bolsonaristas. Para o deputado, o direito ao armamento deve ser um privilégio exclusivo das “forças de segurança”, isto é, apenas os policiais e militares devem ter esse direito. Tem-se aqui a posição dos “desarmamentistas”. Não se trata, evidentemente, de que todos estejam desarmados, mas que o armamento seja um privilégio de uma reduzida casta. No final das contas, os “desarmamentistas” também são armamentistas, e dos piores.
Posição mais antidemocrática não é possível. Para essa esquerda, o direito ao armamento pertence apenas aos órgãos de repressão do Estado, à PM, à ROTA, ao BOPE, às Guardas Municipais, às forças militares. Trata-se justamente dos órgãos responsáveis pela repressão, pelo esmagamento, pelas chacinas contra o povo. É como se “democracia” fosse o estado em que o povo está completamente à mercê, indefeso, ante o braço armado do Estado. Um Estado cujo braço armado não só é controlado pela burguesia, como também, na atual conjuntura, dominado pelos bolsonaristas. Maior ironia também não é possível.
A esquerda acusa o PCO de ter uma posição parecida com a dos bolsonaristas, mas, ao mesmo tempo, defende que apenas as instituições dominadas pelo bolsonarismo podem ter direito às armas. Trocando em miúdos: apenas os bolsonaristas podem estar armados. Eis onde desemboca a posição antidemocrática das principais organizações de esquerda.
A posição do deputado petista, assim como da quase totalidade da esquerda, é não somente falsa, como absolutamente antidemocrática e ditatorial. Povo desarmado é o oposto de democracia.