As manchetes da imprensa golpista foram recheadas com denúncias envolvendo o que seriam espiões russos usando passaportes brasileiros em outros países. O tom alarmista das matérias poderia levar o leitor pouco atento a pensar que os tais espiões estariam espionando os brasileiros, ou fazendo qualquer outra coisa contra o Brasil. O assunto foi levantado no começo do mês pelo jornal britânico The Guardian, que aponta que um casal de espiões russos atuava separadamente no Brasil e na Grécia. O tom sentimentalista da manchete do The Guardian disfarça bem mal o objetivo de criação de intriga: “Pânico e dor emocional diante do desaparecimento de suposto espião russo”. Isso porque a namorada e amigos brasileiros fizeram uma campanha em busca de informações após o seu desaparecimento.
Vivendo no Brasil com o nome de Gerhard Daniel Campos Wittich, o suposto espião russo abriu uma empresa de impressão 3D próximo ao Consulado Geral dos Estados Unidos no centro do Rio de Janeiro. Uma manchete da Folha de São Paulo destacou que ele “fez negócio com a Marinha”. A primeira vista, parece que o espião teria uma relação importante com as Forças Armadas, potencialmente enganando os militares brasileiros. Quando se lê a matéria, vemos que o valor total das três encomendas para o Centro Tecnológico do Corpo de Fuzileiros Navais somou magros R$ 14,3 mil. Valor irrisório para demonstrar uma relação comercial importante.
Outro caso requentado nas manchetes faz referência a um homem preso no ano passado na Holanda e deportado para o Brasil. Sob o nome de Victor Muller Ferreira, o suposto espião estudou na Universidade John Hopkins, nos Estados Unidos, e conseguiu um estágio no Tribunal Penal Internacional, que fica na cidade de Haia, na Holanda. Acusado de uso de documentos brasileiros falsos, foi condenado a 15 anos de prisão. O subtítulo de uma matéria publicada pelo Correio Braziliense deixa no ar que o suposto espião poderia estar agindo diretamente contra o Brasil: “A Polícia Federal investiga se o espião russo Serguei Cherkasov, que fingiu ser um estudante brasileiro para entrar nos EUA e na Europa, realizou atos de espionagem também no Brasil”.
Ora, as informações apresentadas pela imprensa burguesa, diferentemente dos títulos e da abordagem, não nos levam a concluir que algo estivesse sendo feito contra o nosso país. Enquanto os Estados Unidos mantêm uma gigantesca rede de espiões, mundo afora, incluindo o Brasil, os russos respondem na medida das suas possibilidades, como estratégia defensiva. Ao contrário dos norte-americanos, os russos nunca foram pegos espionando autoridades brasileiras ou empresas estratégicas como a Petrobrás. No primeiro caso citado aqui, a proximidade com o Consulado dos Estados Unidos não deixa dúvidas de que o que estaria sendo monitorado era a ação dos espiões norte-americanos a partir de lá. No segundo caso, além da estadia no centro político dos Estados Unidos, a tentativa de se infiltrar no Tribunal de Haia mostra uma resposta às agressões do imperialismo europeu.
O fato que os supostos agentes russos tenham usado documentos brasileiros é relativamente insignificante diante do embate da Rússia com o imperialismo. Apesar de ser um país capitalista atrasado, o Brasil ocupa uma posição importante na economia mundial e por ter historicamente uma diplomacia equilibrada, o passaporte brasileiro encontra pouca rejeição internacionalmente. O que chama muita atenção é a promíscua relação entre a Polícia Federal e os espiões norte-americanos. Não é à toa que atuem com tanta energia para combater a espionagem realizada contra os Estados Unidos. Numa outra manchete da Folha de São Paulo, vemos uma tentativa de criar um clima para sabotar as relações entre Brasil e Rússia: “PF suspeita de uso sistemático do Brasil para formação de espiões da Rússia”. Ou seja, o Brasil estaria sendo usado pelos russos. Enquanto isso, a Polícia Federal colabora com aqueles que espionaram a Petrobrás e a Presidenta Dilma Rousseff.