Segundo o “Relatório de Acompanhamento Específico da Secretaria de Administração Penitenciária 2022”, 61,22% dos presos do estado de São Paulo se declaram pretos ou pardos. Embora o número já seja surpreendente, torna-se ainda mais chocante com o fato de que 40% da população brasileira se declara preta ou parda.
Ocorre que, embora este fato seja amplamente discutido nos meios acadêmicos da esquerda pequeno-burguesa, o debate é feito de forma superficial e sob um viés academicista e identitário que tem como consequência objetivos idealistas e reformistas da questão.
A esquerda identitária não consegue enxergar que o número absurdo de pessoas pretas e pardas presas não se trata de um “racismo estrutural”, (que não existe) e muito menos sua solução se dará por meio da inserção do negro na sociedade burguesa e acadêmica por meio de cotas ou por uma reforma cultural que magicamente fará com que as futuras gerações sejam mais progressistas e menos racistas, com os membros do judiciário e policiais prendendo menos negros.
Este conto de fadas ignora que a verdadeira oposição na sociedade é entre o capital e o trabalho, não entre negros e brancos, e quando um negro ascende socialmente a tendência não é que ele aplique medidas progressistas para outras pessoas pretas, mas que ele perpetue a opressão, e um exemplo disso é a defesa de medidas punitivas feita pelas própria militância negra identitária. Bom, como os próprios dados demonstram, defender aumento de pena e criar novos crimes só faz matar e prender pessoas negras.
Tratar do assunto é ainda mais problemático quando lembramos da loucura identitária chamada “lugar de fala”. É impossível discordar da esquerda pequeno-burguesa sem que haja uma chamada para o fato de que se você é branco não deve falar sobre o assunto, ou pior, sua opinião é oportunista, já que no discurso deles, negar o racismo estrutural e incluir a questão de classe no tema é basicamente ser um racista que não quer perder seus privilégios.
É essa mesma parcela da esquerda que embora diga que “todo camburão tem um pouco de navio negreiro”, preocupa-se mais com coisas secundárias, como a representatividade do negro no entretenimento. E quando discute fatos importantes, como cotas raciais nas universidades e concursos, recusa-se a ver que é uma medida paliativa e insuficiente, preferindo cantar vitória, afinal, “vai ter preto no topo sim” ou “a casa grande surta quando a senzala aprende a ler”.
Ou seja, não vêem que só existe “topo” enquanto existe uma base, e essa base está sendo torturada, morta e marginalizada na cadeia, o novo tronco para o negro brasileiro. A casa grande não chora quando a senzala aprende a ler porque a burguesia continuará sendo detentora dos meios de produção.
A falta de uma perspectiva revolucionária faz com que a esquerda ache que a forma não importa, isto é, que não é a democracia burguesa e o direito que possibilita a barbárie chamada sistema prisional, mas que é o racismo dos membros do governo ou meras leis equivocadas. Diante disso, a esquerda pequeno-burguesa tenta compensar tamanha ignorância teórica como um disco arranhado: repetindo frases de efeito e seu discurso identitário e academicista que nada faz pela classe trabalhadora, muito menos pela parcela mais marginalizada, os presidiários negros.