Ainda não atingimos a marca de 60 dias de governo Lula, mesmo assim, a oposição já prepara um núcleo golpista. No parlamento, o objetivo é claro: minar de todas as formas possíveis o nascente mandato petista. Os responsáveis são os suspeitos usuais: PP, PL, dentre outros partidos da antiga base bolsonarista. No entanto, há a possibilidade de um importante partido da base aliada ensaiar um “abandono do barco” ainda no segundo mês de governo.
A linha principal do ataque no Poder Legislativo se concentra na criação de uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), encabeçada pelo deputado Evair de Mello (PP-ES) — um dos deputados que votaram favoráveis à intervenção militar no Rio de Janeiro — o aliado de Bolsonaro, disse: “Estamos organizando uma agenda legislativa da oposição e também um evento para os 100 dias de governo Lula”.
Na última sexta-feira, o deputado federal bolsonarista André Fernandes (PL-CE) anunciou ter atingido as assinaturas necessárias para a abertura do inquérito. O parlamentar afirmou que angariou o apoio de 172 deputados e 32 senadores para seu requerimento de CPI, número suficiente para que o pedido vá adiante. Segundo Fernandes, há no grupo de apoiadores integrantes do MDB e do União Brasil, duas siglas que fazem parte do governo.
Como afirmado no início do artigo, um importante partido da base aliada parece ensaiar um “abandono do barco”. O não revelado é que: para além do importante partido “aliado” do presidente — o MDB — também temos o União Brasil que, mais previsivelmente, se afasta da base aliada de Lula na primeira oportunidade.
Claro, é salutar que apontemos de onde essas informações saem: da boca de um deputado bolsonarista, com todas as razões existentes para criar uma fissura na base governista. O único partido da base aliada que possui parlamentares categoricamente se colocando contra o governo é o União Brasil. No entanto, é tão difícil assim conceber que o MDB seria capaz de trair o governo Lula e buscar pactuar com a oposição golpista? Para quem acompanhou o golpe de 2016, a resposta é um sonoro “não”. O objetivo da CPI “dos atos antidemocráticos” tem por objetivo concentrar fogo no governo Lula, mirando em seu ministro Flávio Dino, por não ter tomado as precauções necessárias para impedir a invasão do dia 08 de janeiro. Joga-se assim a culpa dos acontecimentos no colo do governo.
Planos dentro de planos.
Além do ataque principal, que parece vir da CPI, outras frentes de batalha se anunciam no horizonte: projetos para reverter as regras mais rígidas para o registro de armas de fogo, além de um texto que busca reverter indicações como a da ex-presidenta Dilma Rousseff para o Banco dos BRICS estão sendo preparados pela oposição. O plano da CPI que, até então, não tinha vingado por falta de adesões, voltou a ganhar projeção após os atos de ocupação de terra em São Paulo no Carnaval.
A ideia dos parlamentares da oposição seria incluir as invasões da Frente Nacional de Luta – FNL — uma dissidência do MST — no mesmo requerimento em que pediam a apuração das condutas do ministro da Justiça no caso da invasão do Planalto em 08 de janeiro. A medida seria apenas a primeira dentre outras que os congressistas passaram a estudar, motivados pela criticada relação do MST (e outros movimentos de luta pela terra) com o PT.
Um dos parlamentares que ainda não havia assinado o pedido de abertura da CPI até o momento, por exemplo, era David Soares (União-SP). Este alterou sua posição quando soube dos atos de ocupação em SP. “A partir do momento em que o MST faz essa ação coordenada, isso despertou raiva de muita gente, inclusive em mim. Porque isso afeta diretamente o agronegócio. Aí sabe-se lá o que vai acontecer”, disse o deputado.
O que está por trás da movimentação
O que temos aqui é a pressão de uma das alas burguesas infiltradas no governo Lula, que tenta afastar o PT de sua base, neste cenário específico, tentam apartar o Partido dos Trabalhadores do segmento camponês, de produção familiar, que é vinculado aos movimentos sociais do campo.
Os partidos mais destacados dessa pressão, ironicamente, são antigos aliados: o União Brasil e o PL. Enquanto um pressiona dentro do governo, o outro age pela oposição. Além disso, como já apontamos em matéria anterior, os setores da direita neoliberal tradicional e fisiológica (como o MDB) tentam forçar o governo Lula a abandonar suas promessas de campanha, a abandonar sua base social e evitar confrontos com o programa neoliberal ortodoxo surgido de Temer e continuado por Bolsonaro. Segundo esses “aliados”, o foco de Lula deve ser o espantalho do bolsonarismo, a defesa de uma democracia em abstrato, a “desradicalização” e “moralização” da política que, enfim, lograria salvar a República de 1988.
A grande questão, como já investigamos à exaustão, é justamente que: enquanto a disputa política permanecer nos salões palacianos de Brasília, a burguesia brasileira e seus serviçais estarão com a vantagem do “mando de campo”. É apenas por meio da ativação das bases sociais, da classe trabalhadora em uma mobilização permanente na defesa de seus interesses, que a balança de poder será afetada, pressionando o presidente a um raio de ação mais amplo e profundo para a esquerda.