O imperialismo está a todo vapor na sua tentativa de reescrever a história do ser humano, particularmente do período em que o capitalismo inicia seu domínio sobre o mundo a partir do descobrimento das Américas no século XV.
Não se trata, como é de se esperar, de um sistema que combate a barbárie no mundo, de nenhum movimento progressista, muito ao contrário. É uma tentativa desesperada de jogar uma cortina de fumaça diante da absoluta incapacidade do imperialismo de promover uma mínima perspectiva de crescimento da economia global, ou de conseguir um simples suspiro a fim de garantir a sua dominação. A realidade é outra: guerras de pilhagem, miséria, uma hecatombe em todas as regiões do globo.
O imperialismo, apesar dos visíveis sinais de fraqueza, não entrega os pontos. Umas de suas suas artimanhas reside justamente em promover uma gigantesca campanha ideológica, como o identitarismo, no meio da classe média de todos os países em oposição à luta de classes, a única saída progressista para a humanidade. Essa ideologia surgiu nas universitários americanas e se espalhou nos meios acadêmicos por meio de financiamentos de pesquisas e bolsas de estudo.
O identitarismo se aproveita da condição de opressão e discriminação em vivem determinadas ‘identidades’, como mulheres, negros, LGBTs etc, e busca “empoderá-las” para que assim acabe a discriminação. Um de seus métodos é reivindicar cargos de mando, ou “posições de poder”, dentro do sistema capitalista. Vimos, por exemplo, os aplausos dos identitários ao fato de os EUA terem uma mulher negra como vice-presidenta. Outros reivindicam que essas ‘identidades’ apareçam mais em propagandas publicitárias. Com indivíduos ocupando tais posições e tendo maior ‘visibilidade’, os grupos aos quais pertencem, supostamente, seriam mais respeitados pela sociedade e se conquistaria a igualdade.
Alguns setores, como os bancos, se utilizam dessas reivindicações em seu próprio proveito. Enquanto colocam essas ‘identidades’ em suas peças publicitárias, continuam uma política extorsiva de juros altos que estrangulam toda a sociedade. Com juros elevados e aumentos da dívida pública não se pode ter escolas de qualidade, saúde pública, saneamento, e isso piora como um todo a vida de negros, mulheres, LGBTs etc. Os bancos, assim, escondem suas garras e aparecem como progressistas.
Um dos mecanismos identitários de “libertação” dos oprimidos, passa pela revisão do conteúdo racista, discriminatório, de autores de obras literárias escritas em momentos diferentes da nossa história.
Se não fosse tão grave, seria até pitoresca a revisão que a imprensa de livros da Inglaterra faz com relação a um dos mais conhecidos autores de obras infantis britânicas, Roald Dahl (1916-1990). Entre os seus livros mais famosos estão A Fantástica Fábrica de Chocolate, Matilda, As Bruxas, O Bom Gigante Amigo e James e o Pêssego Gigante. Várias de suas obras foram adaptadas para o cinema, sendo que o primeiro da lista foi levado aos cinemas em 1969, é uma das obras mais cultuadas pelos amantes do cinema até os dias de hoje.
Termos como “gorda”, “estranha língua africana”, “desequilibrado”, “louco”, “branca como um lençol”, estão sendo suprimidos de suas obras, porque eticamente estariam fora da linguagem aceitável nos dias atuais.
É um absurdo. Dahl escreveu em sua época. Uma obra literária deve ser interpretada pelas emoções e sentimentos que o autor tinha à época e não aos olhos dos supostos puritanos de agora.
O mesmo fenômeno vem ocorrendo no Brasil. Monteiro Lobato, um dos maiores autores brasileiros, criador do Sítio do Pica-pau Amarelo. Responsável pelo “O petróleo é nosso”, uma das campanhas mais importantes em defesa da riqueza nacional, é objeto de revisão coordenado pela “autoridade” de uma sua bisneta. É muita audácia.
Como afirmou Trotski em seu testamento, “a vida é bela, que as gerações futuras a limpem de todo o mal, de toda opressão e que possam gozá-la plenamente”. Mas isso não vai ser por decreto, com ‘empoderamento’ de meia dúzia de pessoas enquanto o resto da população é oprimida. A única possibilidade de emancipação das ‘entidades’ é a derrota da burguesia, que só pode ser conseguida pela classe trabalhadora. A emancipação dos trabalhadores é o mesmo que a emancipação de todas as minorias.
Não podemos entrar nessa histeria moralista e identitária, toda obra tem o seu tempo. A sua falsificação é crime. Não se trata de rever nenhuma obra literária, mas compreendê-la em sua época.