Ascânio Rubi

Ascânio Rubi é um trabalhador autodidata, que gosta de ler e de pensar. Os amigos me dizem que sou fisicamente parecido com certo “velho barbudo” de quem tomo emprestada a foto ao lado.

Cultura Woke

Porre identitário

Verborragia da intelectualidade identitária é... um porre.

“Eu acho tudo isso um saco. Hoje tudo é racismo, preconceito e assédio. A equipe com que trabalho me chama de ‘neguinha’, de uma forma amorosa e carinhosa. Estou há mais de 40 anos na televisão, já fui paquerada, mas nunca me senti assediada moralmente”. Essas foram palavras de Glória Maria, repórter da Rede Globo falecida no último dia 2, ditas em 2017 durante entrevista ao site Glamurama. A publicação, especializada na vida de ricos e famosos, assunto que sempre rendeu audiência nos salões de cabeleireiro, levou a jornalista ao escrutínio das redes sociais.

Muito criticada, Glória, aparentemente, ainda não estava familiarizada com o novo código de conduta de celebridades: o discurso identitário. Continuou ela: “O assédio é algo que te fere, é grosseiro, desmoraliza. Existe uma cultura hoje [de] que nada pode. Tem que ter uma diferenciação, não dá para generalizar tudo. O politicamente correto é um porre. Acredito que o politicamente correto é o caráter, a honestidade. Esse mundo [em] que a gente está vem muito da amargura das pessoas, não aceito”. Até então, a jornalista, que fazia suas reportagens de turismo de aventura e usava sua simpatia para apresentar programas na TV Globo, ao que tudo indica, não havia “despertado”, coisa que viria a acontecer um pouco depois, quando a própria emissora passou a empunhar a bandeira do identitarismo (ou cultura woke).

Em outro momento, chegou a questionar a celebração do Dia da Consciência Negra. Compartilhou uma imagem do ator Morgan Freeman ao lado da frase: ”O dia em que pararmos de nos preocupar com Consciência Negra, Amarela ou Branca e nos preocuparmos com Consciência Humana, o racismo desaparece”. Segundo o site Pragmatismo Político, “para justificar a sua opinião, a jornalista ainda emendou: ‘O preconceito racial é marca nas nossas vidas! Mas não tenho que mudar minhas ideias por imposição de quem quer que seja!'”.

Por ocasião de sua morte, no entanto, Glória Maria foi exaltada em toda a imprensa por seu pioneirismo na luta antirracista de caráter identitário. Foi logo alçada ao posto de representante da mulher negra: “Fui uma adolescente negra nos anos 90 e ver a imagem daquela mulher negra, de pele escura, numa posição de destaque, entrevistando grandes nomes, me trouxe uma noção de pertencimento”, disse Djamila Ribeiro, em texto publicado na Folha de São Paulo.

Segundo a filósofa e modelo da grife Prada, “a presença de Glória Maria na mídia hegemônica ajuda a transcender muitas barreiras simbólicas”. A garota-propaganda do uísque Johnny Walker acrescenta: “Ela representava um signo positivo, uma possibilidade de existência vitoriosa, digna, humana. Uma força imagética que ajudou a quebrar, como afirma Audre Lorde, o espelho de imagens distorcidas”. Para sintetizar, “Gloria Maria transcendeu a busca, foi uma das mais lindas afirmações metafísicas da liberdade”.

De resto, poupemos o leitor da verborragia dos intelectuais identitários. Glória Maria, vista de outro ângulo, faria uma espécie de contraponto a todo esse discurso. Não se obrigou nem parece ter sido obrigada a aparecer no vídeo com cabelos alisados, chegou a cargos altos na Globo, viajou o mundo inteiro a trabalho e fez inveja a um séquito de colegas de profissão de todas as cores e sabores. Ainda que ela tenha sido uma exceção, não lhe foi concedido o lugar de exceção.  A imprensa toda fez uso de sua imagem como símbolo das políticas identitárias, mesmo que ela própria, do alto dos Himalaias ou na corda bamba entre dois balões em lento voo no céu, achasse tudo isso um porre.

* A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião deste Diário

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