O carnaval é de todo o povo brasileiro. E se é assim, ele é da maioria do povo, ou seja, dos negros, dos mestiços, dos brancos pobres.
Não é de hoje que a presença das classes médias nas escolas de samba e no carnaval, em geral, é criticada. A crítica nem sempre é justa: o samba e a cultura popular brasileira só pode ser entendida como uma síntese do morro com o asfalto, do rural com o urbano, do negro com o branco e, por que não, dos trabalhadores com setores da classe média.
É assim e sempre será assim.
Apesar disso, não devemos fechar os olhos para a realidade. Se a classe média, em alguns casos, contribuiu para o desenvolvimento do samba e do carnaval, em outros serviu como verdadeira chaga.
De todos os venenos de classe média, o identitarismo certamente é um dos mais nocivos. Essa ideologia, que invade o samba tendo como via de transmissão a pequena-burguesia pseudo-intelectual, tem seu nascedouro nos países imperialistas.
A revista Veja deu a seguinte notícia no dia 16 de janeiro: “A fantasia racista da Portela, que gerou a primeira polêmica do carnaval”. Para os mais desatentos ou desmemoriados, trata-se de uma revista de direita, pró-imperialista e que teve a participação mais abjeta no golpe de Estado. Em suma, a Veja é uma imprensa anti-povo, ferrenha defensora do que é mais nocivo ao povo e aos trabalhadores.
Por que, então, essa revista estaria tão preocupada com o “racismo”? Notem que o tom da manchete da revista é “fantasia racista” e não, o que seria mais normal para uma imprensa, “fantasia considerada racista”.
É assim porque quem considera racista a fantasia da Portela é a burguesia, não é o povo da Portela, não são os sambistas, as passistas, os foliões. Nada disso! É a burguesia mais inimiga do povo – portanto racista – que afirma categoricamente: “A fantasia racista da Portela”.
Comemorando 100 anos neste carnaval, uma das mais tradicionais escolas de samba do Brasil deveria ter simplesmente ignorado a opinião da burguesia.
Claro que, como dissemos acima, essa opinião se infiltra pela classe média que deve ter aprontado uma verdadeira histeria nas redes sociais contra o “racismo” da fantasia. Mas o melhor remédio para essa histeria é ignorar.
É um espetáculo grotesco vermos uma escola de samba centenária, criada e sustentada por tantos negros, mestiços e brancos pobres, ser acusada de racista por uma corja de patricinhas que só estão repetindo a opinião da revista Veja e coisa muito pior.
Para piorar, a fantasia em questão era uma alusão ao personagem Macunaíma, de Mário de Andrade. Não basta atacar a Portela, atacam também a literatura nacional.
Para quem já se acostumou com a histeria identitária nem precisaria dizer que a fantasia não tem absolutamente nada de racista. O suposto racismo seria porque um boneco do Macunaíma foi representado preto demais, talvez. Com as mãos e os lábios brancos. Sabe-se lá. Não há lógica no mundo identitário.
A Portela acabou cedendo à histeria e modificou sua fantasia. Mau sinal. Esperamos que o identitarismo, essa praga ideológica, desapareça o mais rápido possível, antes que ela acabe com o carnaval.