Não tem jeito, basta a Copa do Mundo começar e o assunto mais falado no mundo é o futebol. Se no mundo “desenvolvido” é assim, imagina nos países oprimidos. No Brasil, então, terra do futebol arte, dá para ver nas cores pelas ruas. Camisas de clubes e da seleção tornaram-se a vestimenta mais popular, mesmo para ir ao trabalho.
É natural. O futebol faz parte da cultura popular, é certamente uma das maiores expressões dela junto com as músicas como forró, samba, pagode, sertanejo, funk, arrocha, calipso, carimbó, cada um com sua predominância regional; a culinária como feijoada, moqueca, maniçoba, polenta, baião de dois, etc, as bebidas como cerveja, cachaça, licor, vinho, café etc. Talvez até maior que estas pois, o futebol é uma paixão nacional, muitas destas expressões são regionais. Mas, a questão aqui é outra. Vamos guardar esse debate para uma próxima.
O tema aqui é, enquanto o povo trabalhador aprecia e comemora a seleção e o futebol na Copa, há um setor da sociedade que, mais uma vez, faz questão de se apartar do povo e chegar a torcer contra.
Essas pessoas, em grande medida, fazem parte da burguesia e essa posição antipopular já faz parte do seu “dia a dia”, naturalmente, por ser uma questão de classe. Para esses, tudo que tem relação com o povo pobre e trabalhador é desprezível e deve ser ignorado e combatido. Por outro lado, o trabalhador, em geral, conhece essa lógica desde sempre, pois ela acaba se manifestando nos diversos aspectos de sua vida, seja na escola, no trabalho, nas relações com o Estado etc, vez que estes são, em última instância, instituições controladas pela classe dominante.
Contudo, o que vem causando espanto para alguns é o fato de que há setores da esquerda fortemente empenhados exatamente na mesma campanha antipopular, característica da direita, contra o futebol, a copa e contra os jogadores da seleção, em particular o seu principal jogador, Neymar.
Esta polêmica vem sendo tratada aqui no DCO em vários artigos, buscando inclusive, esclarecer aos militantes e pessoas realmente preocupadas com a organização e luta da classe trabalhadora contra a burguesia – sim, e nesse caso, futebol tem tudo a ver – e vou me deter aqui a uns dos argumentos colocados pelos ditos esquerdistas ao atacarem a seleção: o futebol é “alienação, é a política do pão e circo para o povo” etc.
Luta de classes
Em primeiro lugar é preciso dizer que essa é um pensamento estreito e extremamente superficial que ignora completamente a luta de classes em que vivemos, uma dos fundamentos do marxismo e realmente ajuda a compreender o movimento dos agentes da sociedade.
O futebol é um esporte e como tudo neste mundo é controlado pela classe dominante. Mas, por outro lado tudo o que é produzido na sociedade é feito em quase sua totalidade pela classe operária, por trabalhadores. Isso inclui a produção material e as artes. O que nos leva à conclusão óbvia de que, assim como, a burguesia explora o trabalhador para extrair a mais valia, na lógica da produção material, a mesma lógica é aplicada na expressão artística. Ou seja, o trabalhador da arte, incluindo os esportes e o futebol, é claro, é mais um agente explorado pela classe dominante. Ainda que, em alguns pouquíssimos casos, este seja relativamente bem remunerado para isto.
Assim como um trabalhador especializado que numa indústria pode ganhar relativamente bem ele não se tornará, dono daqueles meios de produção, nem controlará aquele “mercado”. Do mesmo jeito um músico, um atleta, um jogador de futebol pode ganhar muito bem, até milhões e não se tornará dono daquele “mercado” nem poderá minimamente desafiar os que realmente dominam, ou seja, continuam sendo explorados, apesar de bem remunerados em relação à grande maioria.
Ou seja, o futebol assim como as demais expressões culturais populares são artes do povo, feitas pelo povo, mas que, naturalmente, dentro da sociedade capitalista, é controlada e explorada pela burguesia. Entretanto, como numa empresa há uma disputa entre trabalhadores e patrões, nestes setores da arte, também há uma disputa. E essa disputa envolve desde os espectadores, até os próprios artistas. Logo, o desenvolvimento do futebol nas ruas, nas várzeas, nos campos de pastos do país se dá contra os interesses da burguesia, pois esta tanto é responsável pela situação de pobreza que vive a grande maioria da população brasileira, por exemplo, como também combate duramente qualquer tentativa de ascensão de um pobre a uma melhor condição de vida.
O futebol brasileiro cresce, na verdade, como uma erva daninha que cresce em meio a uma luta feroz e uma disputa acirrada por recursos. E em última instância essa luta está sendo muito bem sucedida, pois o futebol brasileiro – (leia-se futebol jogado, praticado e apreciado pelo povo pobre brasileiro) – é uma vitória da pobreza contra a opressão da burguesia. E o fruto dessa pobreza sai da favela, do chão de terra e vai para o mundo, mostrar o que criou em casa e ensinar o resto do mundo como se faz.
Ou seja, o futebol brasileiro é, na verdade, uma retumbante vitória do povo trabalhador brasileiro contra a burguesia local e internacional, que nunca quis inclusive, que este se tornasse um esporte popular (basta conhecer a história do futebol no começo do século passado). Assim, ao contrário de alienação, o futebol é uma expressão da luta de classes no Brasil, em primeiro lugar, e em vários países oprimidos do mundo, e uma das poucas vitórias desse povo.
Desta forma, para aqueles que insistem em se posicionar contra a seleção, contra o futebol brasileiro, se colocando ombro a ombro com a burguesia, diria que assim como outros assuntos ligados à política nacional e a luta dos trabalhadores, é preciso ir à fundo e fazer uma discussão cuidadosa. E sim, o futebol, assim como o restante da cultura popular, tem papel fundamental nesta luta. Porque, como diz uma certa música dos anos 80 “a gente não quer só comida, …quer bebida, diversão e arte”
Ou vamos deixar tudo para a burguesia? E o trabalhador merece só o chicote mesmo?
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*As opiniões dos colunistas não expressam, necessariamente, as deste Diário.