Afonso Teixeira

Tradutor, formado em Letras pela USP e doutorado em Linguística com tese em tradução. Tem formação como músico, biólogo e cientista político.

Inquisição identitária

Com açúcar, com afeto e a inquisição identitária

Há poucos dias, o compositor anunciou que, a pedido de feministas, não mais cantaria essa canção. O motivo seria o fato de ela representar uma mulher submissa ao homem.

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Chico Buarque de Hollanda talvez seja a figura mais importante que o Brasil já teve no terreno da música popular. Na década de 1960, compôs, a pedido da cantora Nara Leão, uma música que mostrasse o sofrimento de uma esposa dedicada ao marido. Desse pedido, surgiu a canção “Com açúcar, com afeto”, uma das mais belas canções da música popular do Brasil.

Há poucos dias, o compositor anunciou que, a pedido de feministas, não mais cantaria essa canção. O motivo seria o fato de ela representar uma mulher submissa ao homem.

É preciso dizer que aquilo que a canção apresenta é a condição nua e crua, sem floreios, da mulher proletária, aquela que sofre dentro de casa; que tolera a bebedeira do marido; que suporta a falta de dinheiro; e que está disposta a tolerar tudo, seja por amor, seja por necessidade.

O que o grupo “feminista” deseja é que a mulher seja sempre representada não como ela é, mas como ela deveria ser de acordo com esse grupo. É uma mulher idealizada, feita à imagem e semelhança de uma mulher pequeno-burguesa, com acesso à cultura, e com um certo padrão de vida que a permite a ela uma certa independência. Mas essa mulher idealizada não é, de forma alguma, uma mulher emancipada. É também uma mulher sofrida que, assim como a mulher da letra da música de Chico Buarque, não tem consciência de onde vem a opressão; sequer sabe que é oprimida.

A mulher representada na letra da música de Chico Buarque é uma mulher que luta com as armas que tem para manter a casa. É uma mulher real, que existe de fato. É a mulher de verdade.

Chico Buarque parece ser vítima dessas “feministas”. Anteriormente, a cantora Ana Carolina escreveu uma canção parodiando outra canção de Chico Buarque, “A Rita”.

Ana Carolina é a advogada da Rita. Nega tudo o que a Rita fez e põe a culpa no homem. No final da canção original, Chico Buarque termina dizendo que a Rita deixou mudo o violão dele, ou seja, com a partida dela, ele deixou de cantar por falta de inspiração. A paródia de Ana Carolina, diz, ao final: “Seu violão nunca foi isso tudo, e se hoje está mudo, por mim tudo bem.”

O violão de Chico Buarque é sim mais do que “isso tudo”. O problema é que o violão de Ana Carolina é que não é “isso tudo”. A canção de Chico Buarque mostra um homem que rompeu um relacionamento e se mostra ligeiramente recalcado. Homem da vida real. O que aconteceu com ele acontece também com as mulheres. A paródia de Ana Carolina é a palavra da mulher inteiramente recalcada, mulher pequeno-burguesa que vive num universo à parte do mundo real.

O samba agradável e ligeiro de “A Rita” não merecia uma paródia nojenta como a de Ana Carolina.

A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a posição deste Diário

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