Temos visto, ao longo deste ano, diversos episódios de cerceamento à liberdade de expressão. O STF tem se comportado como um censor. Recentemente, a Corte Suprema brasileira proibiu o deputado Daniel Silveira de dar entrevistas. A que ponto chegamos! Um poder não eleito proíbe um parlamentar eleito de expressar sua opinião.
Obviamente não concordo com as opiniões desse deputado. Mas estou bem ciente de que pau que bate em Chico da ala direita baterá bem mais forte no Chico da ala esquerda. Em nenhum momento podemos esquecer que o STF nada fez para impedir a derrubada de Dilma e a prisão ilegal de Lula. Tudo para que Lula não pudesse concorrer às eleições para as quais ele estava em primeiro lugar nas pesquisas. O STF está se tornando um poder judiciário, executivo e legislativo. E, pior, um poder não eleito. Como disse Rui Barbosa: “A pior ditadura é a ditadura do Poder Judiciário. Contra ela, não há a quem recorrer”. Cito-lhe a frase, mas digo que há, sim, a quem recorrer: aos trabalhadores. Só eles têm a força para fazer recuar as instituições da burguesia, inclusive o Judiciário.
Uma das lutas históricas da esquerda é a luta pelas liberdades democráticas. Ouvi muito essa palavra de ordem dita pelos dirigentes de esquerda da década de 80. Vi muitas faixas “pelas liberdades democráticas”. É verdade que se trata de uma reivindicação que se situa ainda nos marcos do capitalismo. Mas ela é fundamental para que as organizações dos trabalhadores se defendam dos ataques que podem vir das instituições burguesas, como o Judiciário e as autoridades executivas. No entanto, temos uma esquerda que festeja decisões autocráticas, as quais certamente se voltarão contra a própria esquerda. Vou dar apenas um exemplo: não temos mais campanha eleitoral verdadeira no Brasil. É proibido colar cartazes, é proibido fazer showmícios, e a campanha dura poucas semanas, praticamente restringindo-se à famigerada “propaganda eleitoral” que o povo não assiste. Tudo para garantir que o eleitor vote desinformado. Dessa forma, fica mais fácil para a burguesia enfiar algum candidato sorridente goela abaixo do povo.
O Judiciário brasileiro fechou os olhos quando o então juiz Sérgio Moro impediu que Lula disputasse o pleito, quando ele que estava em primeiro lugar nas pesquisas. Depois, o STF decidiu pela suspeição de Moro. Mas o estrago monumental já tinha sido feito. Agora, novamente Lula está na dianteira. É muito provável que tentem impedi-lo de concorrer, de novo. Ou então que aprovem um semipresidencialismo, o que constituiria um golpe dentro do golpe.
Essa mesma esquerda que festeja o judiciário censor, também se regozija com a censura praticada pelas maiores empresas capitalistas do mundo: Google e Facebook. Misteriosamente, essa esquerda pequeno-burguesa não protesta quando a censura é contra a luta do povo. O twitter suspendeu a conta do presidente do Irã. Motivo: ele elogiou a vacina cubana. O YouTube tirou do ar vídeos do ativista Jimmy Dore. Motivo: ele denunciou a farsa dos “ataques de gás na Síria”. Aliás, vários setores de esquerda estadunidense que fazem oposição ao Partido Democrata e ao presidente Biden estão sendo alvo predileto da censura do YouTube. O Twitter suspendeu contas do governo da Venezuela. Em todos esses casos, a esquerda pequeno-burguesa fingiu que não era com ela.
Tudo isso é um ataque enorme contra as liberdades democráticas, ataque promovido por conglomerados da internet. A esquerda – com exceções – quer dar a esses conglomerados o poder de serem os juízes que decidem o que pode e o que não pode ser dito. A luta histórica pelas liberdades democráticas cedeu lugar à falta de princípios.
Uma parte dessa esquerda identitária, como vimos, é ligada ao governo dos EUA. Há quem receba dinheiro de entidades ligadas a outras entidades, por sua vez ligadas a outras entidades. Quando seguimos o fio de meada (siga o dinheiro, como dizem os estadunidenses nesses casos), chegamos a organizações totalmente conectadas a Washington. Eles são pagos para promover o tal identitarismo, uma pretensa defesa da mulher, do negro, do cidadão LGBT. Mas não vimos essa gente defender Dilma quando ela estava sendo atacada de todos os lados. Ao contrário, essa esquerda se uniu aos ataques contra a presidenta. Eu não me esqueci do “não vai ter Copa”.
Agora, temos o ataque dos diretores do site DCM – Diário do Centro do Mundo – contra o companheiro André Constantine. Para eles, pouco importa se ele é negro, favelado e militante da esquerda. Eles querem atacar quem não comunga de suas concepções identitárias. Primeiro, cancelaram a participação do companheiro Rui Costa Pimenta nas transmissões ao vivo. Não satisfeitos, acusam o companheiro André de um crime. Ah, esse identitarismo não resiste a 5 minutos de questionamento.
Tudo bem, o DCM tem o direito de escolher quem participa das transmissões ao vivo. O portal é deles, e a eles cabe a decisão. Mas nós temos o direito de julgá-los a partir das decisões que eles tomam. “Dize-me com quem andas, e dir-te-ei quem és”, diz o chavão. E é um ditado bem verdadeiro. Ou, poderíamos dizer, “dize-me quem não queres ao teu lado e dir-te-ei quem és”. O mesmo site que entrevista figuras como Alexandre Frota, Danilo Gentili e outros expoentes da direita prefere não ter em suas transmissões o dirigente de um partido revolucionário. Faz sentido.
O que eles não têm o direito de fazer é esse ataque contra o companheiro André Constantine. Solidarizo-me totalmente com André, alvo de um ataque sórdido de um grupo que está, pelo visto, conectado com Guilherme Boulos, o funcionário da folha golpista e do tal instituto IREE. Os diretores desse instituto são figuras ligadas ao golpe contra Dilma.
É preciso lembrar que o PSOL, PCdoB e a ala direita do PT queriam a direita golpista nos carros de som dos atos de luta. É aquele raciocínio raso de que “quanto mais gente melhor”. Mas não é assim. PSDB, PDT e PSB em geral votam a favor de todas as desgraças que o capitão manda para o Congresso. Eles não são aliados. Entendo que uma parte dos militantes que comungam dessas posições direitistas o fazem na melhor das intenções. Porém, é preciso dizer que nem todos têm essas boas intenções. Há dirigentes da esquerda que recebem dinheiro para fazer o que fazem. E não negam isso, confirmam publicamente suas relações com os tais “institutos”.
Vou repetir o que o companheiro Rui Costa Pimenta já disse em várias ocasiões: a burguesia vai tentar impedir que o PT retome o governo em 2023. Eles estão preparando um golpe dentro do golpe. Não tenhamos ilusões. Teremos que garantir nas ruas o direito de Lula concorrer. E não conseguiremos isso se cedermos à esquerda que quer proibir faixas e palavras de ordem de “Lula Presidente”.
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