A classe média ou pequena-burguesia tem grande importância na luta política que se desenvolve no Brasil e no mundo. Por ser uma classe que não é determinante na produção econômica, a classe média não tem uma linha política própria. Ela liga seu destino a uma das classes sociais fundamentais da sociedade em luta, a burguesia ou o proletariado.
Em todos os processos revolucionários vitoriosos, a classe média se deslocou para a esquerda e apoiou o movimento revolucionário. Por outro lado, ela também pode se tornar um alicerce da reação fascista. Nos países atrasados, a revolução precisa contar com o apoio da pequena burguesia, particularmente o campesinato. Mas ela também tem importância fundamental nos países de capitalismo desenvolvido, principalmente de intelectuais. O movimento estudantil universitário também é uma força decisiva em ambos os casos.
A polarização política ocasiona uma cisão na classe média e demarca dois campos, um setor mais avançado que evolui à esquerda e outro mais atrasado que se desloca à direita.
Para sair vitoriosa contra a direita e a burguesia, a esquerda precisa do apoio da pequena burguesia, seja ela agrária ou urbana, como estudantes, intelectuais, artistas, profissionais liberais. O problema é que a política dos partidos da esquerda brasileira – PT, PCdoB, PSOL etc. – tem servido como um meio de afastar a classe média dos trabalhadores. A política antidemocrática que apoiam faz com que aqueles setores sejam lançados no colo da extrema-direita bolsonarista.
O presidente fascista Jair Bolsonaro (ex-PSL, sem partido) se utiliza de uma retórica demagógica que apela para os interesses materiais da pequena burguesia. Ele busca aparecer como defensor dos empregos, alerta para a falência generalizada das pequenas empresas em virtude de políticas de lockdown. Além disso, Bolsonaro, um defensor do golpe militar e da ditadura, tenta se travestir como o defensor dos direitos democráticos, como ir e vir, liberdade de expressão, armamento do povo. Claro que para o fascista se trata de garantir a voz da extrema-direita e censurar a esquerda, ou armar apenas uma minoria de seus apoiadores (latifundiários, bandos fascistas, ou pessoas que já têm permissão para a posse de armas). Mas, mesmo assim, apresenta-se como um representante da pequena burguesia.
Na questão das redes sociais, Bolsonaro posa de defensor da liberdade de expressão . A esquerda, pelo contrário, afirma sua defesa da censura com o pretexto de combater as “fake news” e coloca nas mãos do Poder Judiciário o poder de regulação daquilo que deve ou não ser dito. Na época das revelações da Vaza Jato, o presidente fascista, que busca aparecer como defensor da liberdade de expressão, disse que o jornalista Gleen Greenwald deveria “pegar uma cana no Brasil”. Percebe-se, portanto, que sua defesa da liberdade de expressão é por mera conveniência, uma vez que ultimamente o alvo primário e público da censura tem sido a extrema-direita, o próprio Bolsonaro e sua base.
A esquerda deveria ter um programa econômico para a pequena burguesia. As políticas de lockdown, que aprofundam a situação de crise econômica, jogam uma parcela dos pequenos empresários no colo de Bolsonaro. Ao invés de propor o fechamento total a todo custo alicerçado na repressão administrativa e policial, a esquerda deveria propor uma política de fechamento do comércio com contrapartida aos pequenos comerciantes, sem levá-los à falência. O dinheiro necessário para financiar a política de saúde pública deve vir dos bancos e grandes capitalistas, através de pesada tributação. Nunca é demais destacar que bancos lucram dezenas de bilhões de reais, isso em um país mergulhado em uma profunda crise econômica e social, com mais de 14 milhões de pessoas no desemprego e sem quaisquer perspectivas de vida.
O lockdown não quebra os bancos, que continuam ganhando dinheiro com especulação, empréstimos a juros e aplicações financeiras (nem é preciso dizer que também não combate o coronavírus). Os grandes capitalistas nunca pararam suas empresas, uma vez que têm poder político e influência para se esquivar de cumprir a lei. Os trabalhadores, são obrigados a se aglomerar diariamente no transporte e depois nas fábricas para encher o bolso dos patrões.
Os pequenos comerciantes, trabalhadores por conta própria e lojistas não têm como escapar da aplicação da lei, o que significa que alguns dias sem atividade os levam ao endividamento e à beira da falência.
Abandonar a classe média nas mãos da extrema-direita significa, na prática, fortalecer o perigo de uma ditadura militar fascista. O desespero e a exaltação com a destruição econômica, que afeta diretamente a pequena burguesia, faz com que ela fique vulnerável à demagogia fascista. Jair Bolsonaro busca se aproveitar dessa situação e atrair, para si, estes setores.
Não é apoiando aqueles que tanto os trabalhadores como a pequena burguesia sabem que são os maiores bandidos e picaretas políticos do País – isto, é, a direita tradicional, como o PSDB, MDB e DEM – que a esquerda irá angariar apoio popular para fazer frente a Bolsonaro. É preciso uma política independente que proteja os setores de classe média, cada vez mais empobrecidos, atacando os grandes capitalistas – os grandes inimigos do conjunto da população.
Para combater e triunfar sobre a direita e a burguesia, é imprescindível o apoio da pequena burguesia à classe trabalhadora. Somente esta última pode dar uma solução para o problema da instabilidade e do terrorismo econômico imposto pelo grande capital, e deve indicar o caminho às demais classes oprimidas da sociedade. Isto é, a esquerda tem que atrair a classe média sobre a base de um programa de reivindicações transitórias, que contemple os interesses econômicos das camadas intermediárias.
A classe média é fundamental para o triunfo da luta dos trabalhadores pela derrota do golpe, a derrubada de Bolsonaro e mesmo a expropriação do capital e transformação socialista da sociedade. Para isso, a esquerda precisa esclarecer essa camada social e trazê-la para o seu lado, com um programa que atenda às suas necessidades materiais que são, em certa medida, muito parecidas com as da classe trabalhadora, tendo em vista que a crise capitalista produz um empobrecimento crescente da classe média e joga cada vez mais elementos pequeno-burgueses para as fileiras da classe operária.