A esquerda pequeno-burguesa está condicionada a enxergar as coisas apenas eleitoralmente. A crença na democracia burguesia a torna incapaz de perceber que na realidade não existe democracia e que o povo só consegue as coisas na base da força. A eleição, nesse sentido, não passa de uma expressão na superfície dessa força.
Mas, apegada a cargos e posições no Estado, a pequena burguesia tem dificuldades de entender a política do ponto de vista da mobilização das massas.
A questão da luta pelos direitos políticos de Lula esbarra nesse problema.
Uma parte da esquerda está procurando o seu próprio lugar ao sol, ou seja, seu cargo, ou pelo menos avançar alguns degraus rumo a um cargo. Por isso, diz que defende Lula mas não necessariamente defende a candidatura de Lula, pois acredita que teria condições iguais de disputar a presidência. Um delírio, mas é o que esses setores da esquerda pensam. Fica bem explícito na declaração de Guilherme Boulos que afirmou, sobre a decisão do PT de lançar uma campanha Lula/Haddad, que era preciso discutir um “projeto de unidade”. Independente da consideração – que nós achamos errada – sobre a decisão do PT sobre Haddad, fato é que Boulos está delirando se acha que do ponto de vista eleitoral teria cacife para decidir de igual para igual com Lula e o PT sobre a candidatura em 2022.
Outra parte da esquerda acredita que embora seja importante lançar Lula, caso ele não possa se candidatar, é preciso repetir o erro de 2018 e lançar alguém no lugar. Seria como se o juiz de uma partida de futebol, declaradamente torcedor do time adversário, decidisse a escalação do seu time e você aceitasse, de cabeça baixa. No mundo real ninguém aceitaria tal arbitrariedade, mas a esquerda, que vive no mundo da fantasia chamado “democracia”, abaixa a cabeça e aceita as imposições do juiz.
As duas ideias mostram o nível de ilusão que a esquerda tem nas instituições do regime golpista. Ela acredita que fazer política é seguir essas instituições. Para a esquerda, política não é uma luta de interesses. E bom explicar o que significa lutar, já que a palavra ficou vazia de tanto que a esquerda usa para fazer demagogia. Trata-se de força, quem tem mais força, ganha, ou no ditado popular, quem pode mais chora menos.
Até agora, quem pode mais é a burguesia. Ela mobilizou a extrema-direita, deu o golpe, prendeu Lula, fraudou a eleição de 2018 e elegeu Bolsonaro. Ela dá as cartas no jogo institucional. Em geral é assim, com o golpe piorou.
O que restaria para a esquerda é mudar essa situação “podendo mais” do que pode hoje. E para poder mais, ou seja, para ter força nessa luta, é preciso mobilizar o povo. Mobilizar o povo não significa participar da eleição, pedir voto e aceitar, de cabeça baixa, o jogo do seu inimigo, como fizeram em 2018.
A eleição não deve ser nada mais do que um instrumento para uma mobilização real, que é a força que a esquerda precisa. Para que isso ocorra, é preciso em primeiro lugar mobilizar em torno daquilo que a direita mais se esforça para tirar do jogo político: Lula.
A luta pelos direitos de Lula e consequentemente por sua candidatura não é um problema meramente eleitoral. A eleição é secundária, é apenas uma alavanca. A candidatura de Lula, que até o momento é tudo o que a direita não quer, é colocar o regime político em xeque, chamando o povo a fazer isso em torno do direito de Lula ser candidato e ser votado.
Se a direita disser não. É preciso denunciar a fraude e chamar o povo a se mobilizar. Criar um movimento cuja principal preocupação seja a força da mobilização e não a busca delirante por um voto e um cargo.
Esse é o problema central da luta contra o golpe. Da luta contra Bolsonaro e todos os golpistas.