Quando analisamos a ascensão do fascismo nos mais diversos países, há um fator sempre comum a todos os casos. Trata-se da confiança que a esquerda pequeno-burguesa deposita na ala supostamente democrática da burguesia na luta contra o fascismo.
Certamente por se achar fraca demais para isso, pela falta de confiança nos trabalhadores, a esquerda pequeno-burguesa não procura mobilizar a população, não trava ela mesma um combate aos fascistas. Em vez disso, espera que a própria burguesia, as instituições supostamente democráticas do Estado capitalista os eliminem.
Isso explica também o apoio desses setores às medidas repressivas da burguesia supostamente dirigidas à extrema direita. Essa esquerda vibra pensando que o Estado burguês vai segurar o monstro do fascismo. Sente-se aliviada, também.
Mas a história mostra que essa é uma esperança vã. Em primeiro lugar, se o fascismo cresce e toma o poder é porque ele recebeu apoio da maior parte da burguesia. Nesse cenário, aqueles representantes da burguesia que não aderiram ao fascismo simplesmente capitulam. Preferem entender-se com os elementos mais radicalizados de sua própria classe a travar qualquer luta contra eles, já que para tanto precisariam inclusive do apoio dos trabalhadores. Ou seja, quando vêem que o fascismo já tomou conta do cenário político, simplesmente aderem ou se adaptam a ele.
No entanto, ignorando toda a experiência histórica, a esquerda pequeno-burguesa insiste na política errada e, para o movimento operário e os demais explorados, profundamente criminosa, de apoiar as alas supostamente democráticas da burguesia contra a extrema direita. Essa tática é um velho integrante do repertório stalinista, uma variante da política de colaboração de classes que evoluiu das frentes populares da década de 1930 à colaboração direta com o imperialismo “democrático” norte-americano e inglês, em oposição à revolução proletária. Essa esquerda acredita que governantes e parlamentares burgueses, que falam em democracia da boca para fora, são efetivamente defensores da democracia (que na maioria dos países nem existe de fato). E isso conduz inevitavelmente à derrota.
Democracia e ditadura são apenas duas faces que assumem o Estado burguês. Assim como o fascismo é mais um recurso da própria burguesia contra a classe operária.
No Brasil isso assumiu contornos grotescos. Parte da esquerda chegou a apoiar um candidato da antiga Arena, partido da ditadura, à prefeitura do Rio, e apoiou Baleia Rossi, do MDB, do chamado “centrão” para a presidência da Câmara dos Deputados.
O que se viu no entanto, é que boa parte do próprio “centrão”, que são na verdade os partidos da direita tradicional, que domina o regime político desde a ditadura militar, acabou apoiando o candidato bolsonarista.
Esse caso mostra claramente a inviabilidade da política de frente ampla, ou seja, da frente entre a esquerda e a direita tradicional contra o bolsonarismo. É uma frente que só pode se materializar por meio da submissão completa das lideranças e organizações operárias e populares ao comando dos partidos burgueses reacionários, desejosos de voltar a comandar o Estado sem serem acossados pelo movimento de massas, nem incomodados pelos inconvenientes de um presidente de extrema direita.
Essa direita mostrou que não é contra Bolsonaro, não quer a derrubada dele e nada vai fazer contra seu governo. Pior: já deixou claro que também não pretende permitir que ninguém faça nada. Para isso, apoderaram-se da palavra de ordem de “fora Bolsonaro”, separando-a da luta contra todos os golpistas – isto é, da luta contra eles mesmos – e usam uma campanha farsesca pelo impeachment para manter cativos os elementos da esquerda pequeno-burguesa que não vêem outra saída senão a “unidade com os setores democráticos contra o fascismo”.
A esquerda se desmoraliza aliando-se com seu inimigo e, apesar de se jogar nos braços da direita, é rejeitada por ela.
A única coisa que a direita pode querer da esquerda é que esta apoie seus candidatos, seus governos, segure a população para que esta não enfrente os governos burgueses que apesar de se dizerem democráticos acabam muitas vezes sendo mais prejudiciais à população do que governos como o de Bolsonaro.
A frente ampla tem essa única função: reabilitar a direita tradicional, muito enfraquecida, para que volte a governar o País com o aval da esquerda, usando Bolsonaro como pretexto. Uma manobra comum, mas que acaba atraindo a esquerda pequeno-burguesa como para um matadouro.