Debate com a Esquerda Marxista

A posição marxista sobre as penas e as leis

Ao defender que determinados crimes merecem a punição "exemplar" pelo Estado burguês, nada mais estamos do que reafirmar a posição moral da direita

O debate sobre a questão do estupro veio a tona recentemente em dois casos ocorridos no País. O primeiro caso foi a campanha contra o jogador Robinho, condenado em primeira instância na Itália, acusado pela participação em um caso de estupro coletivo. O segundo foi o do empresário que se livrou de uma acusação com várias provas pelo estupro de Mariana Ferrer.
A corrente interna do PSOL, chamada Esquerda Marxista, publicou matéria em seu sítio debatendo as posições políticas apresentadas pelo PCO, por meio de sua imprensa. O debate gira em torno principalmente em relação a qual seria a política correta diante do crime de estupro, o que passa, logicamente, por uma discussão sobre o caráter do Estado burguês e da Justiça.
Vejamos o que diz a Esquerda Marxista sobre o problema:

seguindo a lógica dos argumentos, seria então um erro lutar para condenar e prender quem mata e manda matar um militante de esquerda (como Marielle), ou uma juíza que escreve na sentença que está condenando um negro “em razão de sua raça”, cometendo claramente o crime de racismo.

Nestes casos e em outros, incluindo os casos de estupradores, defendemos sim a prisão dos que cometeram estes crimes. Não porque consideramos que a polícia ou a justiça burguesa salvará nossas causas. Mas porque travar este combate pode mobilizar uma base, inclusive contra a justiça e a polícia, demonstrando todo o caráter de classe dessas instituições. Nesse combate, evidenciar que enquanto milhares são presos sem julgamento ou por pequenos crimes, ou simplesmente por lutar contra os interesses da burguesia, ricos e poderosos saem ilesos até quando existem provas de que cometeram graves crimes.

Embora afirme concordar com a concepção marxista sobre a Justiça burguesa, a esquerda marxista fica no meio do caminho. A Justiça é uma máquina de repressão contra o pobre, mas no caso de determinados crimes – estupradores, ataques contra militantes de esquerda etc – devemos usar essa máquina.
Pedir a prisão das pessoas pelo Estado burguês nunca foi uma política dos socialistas. O movimento operário faz campanha, denuncia e chama as massas a se mobilizarem, mas não pede o fortalecimento da máquina de repressão burguesa. No exemplo do assassinato de Marielle: será que a tarefa central seria pedir que o peso do Estado seja utilizado para punir os assassinos da vereadora? Primeiro, isso resolveria o problema? Segundo, qual o efeito real dessa política caso fosse bem sucedido?
Há “criminosos e criminosos”?
Outro argumento usado pela Esquerda Marxista é o de que “há criminosos e criminosos, e o que nos interessa são sempre os interesses de classe envolvidos, em especial, o que atrapalha ou o que ajuda a elevar o nível de consciência e organização do conjunto da classe trabalhadora na luta pelo socialismo.”
A ideia de que haveria crimes melhores ou piores é exatamente a armadilha na qual toda a esquerda pequeno-burguesa tem caído ao tratar o problema do estupro. Isso porque qualquer crime é meramente um problema moral, e portanto não há um valor universal para o crime, variando de acordo com a sociedade e a época. Podemos achar que determinado crime seja detestável mas isso não significa que essa mesma apreciação seja válida em outros tempos e outras sociedades. Portanto, ao medirmos o crime pela nossa própria moralidade nada mais estaremos fazendo do que entrando de cabeça na posição da direita, que é justamente uma posição moral. Nós podemos considerar o estupro um crime mais grave do que outros, mas isso não pode servir para tratá-lo de maneira diferente. As causas fundamentais de qualquer crime são as mesmas e o tratamento deveria ser o mesmo.
Para a burguesia, assim como para a esquerda pequeno-burguesa, o crime deve ser tratado moralmente e portanto com o rigor da lei. E assim, caímos novamente no problema: o rico sempre dará um jeito de se livrar dessa punição e quem vai sofrer serão os pobres, não importa de qual crime estamos tratando aqui.
A confusão da Esquerda Marxista fica ainda mais clara com a comparação da Justiça burguesa com a Revolução bolchevique de 1917. Diz o artigo:
Vale também recordar que após a Revolução de Outubro de 1917, na URSS, Trotsky organizou o Exército Vermelho de forma disciplinada, inclusive autorizando a punição de estupradores em suas próprias fileiras. O estupro não era visto como algo menor, mas era extremamente condenado, e tido inclusive como prática recorrente do Terror Branco, das forças imperialistas reacionárias.
A comparação é absurda. Em primeiro lugar porque na guerra, o estado de coisas funciona de maneira diferente. As condições são excepcionais e eram essas condições que Trótski e o Exército Vermelho enfrentavam. A disciplina é condição para a vitória do exército e esse regime de exceção tem um sentido prático muito claro.
Em segundo lugar, é preciso ter claro que o regime de Lênin e Trótski não é a mesma coisa do Brasil de Bolsonaro e Sérgio Moro. O regime brasileiro é contrarrevolucionário, o regime soviético era revolucionário. Dar poder ao primeiro é pura e simplesmente fortalecer a política de duros ataques contra o povo, não importando quais são as justificativas morais envolvidas nisso.
A posição da Esquerda Marxista é centrista. Fica no meio do caminho ao procurar se diferenciar da posição de tipo inquisitorial dos identitários mas sem romper totalmente com a concepção moral sobre o crime, o que afasta o grupo da posição marxista sobre o problema: a defesa intransigente dos direitos democráticos e de um sistema penal que seja mais humano, que não seja um verdadeiro moedor de carne da população pobre.

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