Na Argentina, os espetáculos para estrangeiros, com as tradicionais apresentações de dançarinos de tango, com uma profunda penetração na cultura do país, é, dentre as várias danças, uma das mais importantes, e é um bom exemplo do impacto da pandemia no setor, que sofre agora pela suspensão provocada pela quarentena. Essas apresentações costumavam render muito mais do que as milongas para moradores locais. Mas, mesmo as milongas, tradicionais espaços de encontro dos fãs do tango, estão fechadas por tempo indeterminado.
Alguns professores dão aulas on-line, seja para dar vazão ao amor pelo estilo ou para garantir uma renda mínima em dinheiro. Mas nem todos têm a mesma sorte. Ofelia Saavedra, 35, que tem uma vida dedicada à dança, e, em especial ao tango, foi entrevista pela jornalista Sylvia Colombo e disse que:
“Estamos cientes de que o tango vai ser uma das últimas coisas a se reativar depois da pandemia. Não dá para prescindir do contato íntimo ao dançar, muito menos do público para acompanhar os shows ou para frequentar as aulas. E nem me fale de dançar com luvas ou máscaras. Se for assim, é melhor não dançar”, conta a organizadora de milongas Liliana Furió.
“A única coisa que alguns estão fazendo hoje é oferecer aulas por videoconferência. Mas a maioria deles e do pessoal de produção dos espetáculos está sem trabalho”, conta.
O secretário-geral do governo da Cidade de Buenos Aires, Fernando Straface, disse que “a retomada do turismo brasileiro é essencial”. “É um dos nossos públicos principais. Lamentamos muito a situação sanitária do Brasil e esperamos que a pandemia seja superada e que os voos retornem”, diz. O governo da Argentina decretou que o país está fechado para voos comerciais até setembro, no mínimo.
Se a situação dos trabalhadores argentinos já era difícil antes da pandemia, mesmo diante do “pacote de emergência” do presidente Alberto Fernández – um paliativo para combater a destruição provocada por Macri de entrega ao FMI, Banco Mundial etc, e que levou ao empobrecimento do povo, agora, com as novas medidas de apoio à economia informal, principalmente ela, a informal, que também abarca os dançarinos, na sua maioria profissionais sem vínculo empregatício, e que é responsável, junto com os demais trabalhadores informais, por quase 40% do mercado de trabalho na Argentina, o governo ofereceu um bônus mensal de 10.000 pesos (cerca de R$ 780) enquanto a quarentena durar.
Veja que a política não difere da encampada pelo governo brasileiro, podendo se dizer que é até muito pior, já que a era Macri é anterior ao golpe no Brasil, e aprofundou a crise por lá há bem mais tempo. Uma ajuda emergencial como essa nesse cenário não daria para muito, mas não deixaria morrer de forme. Sem dúvida, é uma típica política burguesa, e que deixam os trabalhadores sempre no fio da navalha, enquanto todas as reservas do governo são destinadas aos capitalistas, suas empresas e bancos. Em crises como estas, os capitalistas (principalmente os do monopólio) engolem os demais de pouco expressão, e arrebentando os pequenos empreendedores, muitos deles trabalhadores se aventurando em pequenos negócios com um pouco que conseguiu juntar, mais um crédito conseguido em uma nova dívida com um banqueiro safado, que leva dele boa parte do lucro, quando tem um.
Mas os bailarinos, se conseguem se organizar, se mobilizam contra toda a exploração que têm de suportar. Aqui, neste caso, estão mobilizados e, por meio do Movimento dos Bailarinos de Tango, que reúne 400 trabalhadores informais, pedem que o governo direcione verbas que estavam reservadas a festivais internacionais de tango e que pressionem as casas que fecharam suas portas a pagar seus salários, mesmo que parcialmente. É quase um pedido de esmola pelo amor de deus. Apesar de uma política ruim, não deixa de ser uma tentativa para salvar muitos que estão sem nenhum rendimento. Principalmente nesta fase de isolamento social em que não podem exercer sua profissão, ou, os que exercem, não têm públicos.
Entre os clubes de Buenos Aires, estão fechados o Madero Tango, o Bar Sur, a Esquina Homero Manzi, o La Ventana, o La Viruta, e também o La Catedral.
Os dançarinos que se apresentam em espetáculos, apesar do glamour, não dispõem de uma situação confortável, pelo contrário. Vivem como profissionais liberais, e têm que arcar com o ônus dos encargos sociais todos, seguros, não têm piso salarial garantido, e sobrevivem ganhando um percentual do que faturam as casas noturnas, na sua maioria, ou dos cachês de apresentações em feiras ou pelas ruas mais movimentadas em palcos improvisados.
Tirando os corpo de balés mais famosos, ou os de baile dos teatros municipais, e que representam uma grande minoria no total de profissionais ligados à dança, não se esquecendo também os da produção e da técnica, sem os quais também não haveria espetáculo, não há uma política que garanta qualquer direito trabalhista, mínimo que seja, defendida pelo governo de Fernández. A ajuda emergencial é muito pequena e deixa os bailarinos expostos e correndo risco de vida.