No dia 06 de Março de 1817, foi deflagrada a Revolução Pernambucana, também conhecida como Revolução dos Padres. O evento resultou de uma complexa movimentação das classes sociais, inclusive das elites locais, e teve um caráter, sem dúvida, progressista para a conjuntura da época.
Ante a ameaça napoleônica à península ibérica, a família real portuguesa abandonou Lisboa e estabeleceu-se no Rio de Janeiro. A manobra repercutiu profundamente na política nacional, consolidando o deslocamento do eixo econômico brasileiro do nordeste para o sudeste. Salvador (BA) perdera o posto de capital para o Rio de Janeiro em 1763, no auge da atividade extrativista em Minas Gerais. Assim, toda a população do nordeste, das elites ao povo (e, sobretudo o povo) foram preteridos com maior evidência.
Os efeitos deste deslocamento foram asseverados quando, em 1716, uma grande seca atingiu Pernambuco, afetando a produção de algodão e açúcar, os principais insumos da região. Ao mesmo tempo, a população via com perplexidade o aumento de impostos pagos à coroa para sustentar seus luxos. Em uma década como capital do Império, o Rio de Janeiro havia sido completamente reestruturado para acomodar a parasitária realeza.
Contudo, além de toda a conjuntura política nacional, é fato que os ideais emancipatórios iluministas, já experimentados pelas revoluções norte-americana, francesa e haitiana, tiveram papel central nos rumos do movimento revolucionário. A descontente elite nordestina, com o apoio da massa popular que nada tinha a perder – já que nunca vivera em condições favoráveis – passou a ansiar pelo que havia de mais avançado na época: a independência em relação à capital do império (o Rio de Janeiro) e a proclamação de uma República.
Em paralelo, o vácuo deixado pela fuga da família real portuguesa causou enorme descontentamento nas elites lusitanas que permaneceram na antiga metrópole. Assim, findado o domínio francês na península, lá também surgiram movimentos republicanos de caráter revolucionário e antimonarquista. No mesmo ano da Revolução Pernambucana, inclusive, teve início a Conspiração de Lisboa, que serviria de base para, em 1820, eclodir a Revolução Liberal do Porto.
A REVOLUÇÃO
Foi neste cenário conturbado, em que a burguesia buscava se estabelecer mundialmente como classe dominante, pondo fim aos regimes absolutistas, que um grupo de pernambucanos se opôs ferrenhamente à coroa. Compostos majoritariamente por militares, padres e burgueses – com destaque ao comerciante Domingos José Martins, aos padres João Ribeiro, Frei Caneca e Miguelino, e ao militar Domingos Teotônio Jorge, os revoltosos ocuparam a capital Recife e, consequentemente, o Governo de Pernambuco.
Após, tomado o estado pela revolução, os insurgentes se apoderaram do tesouro pernambucano e declararam, pela primeira vez em território nacional, a República. Houve a convocação de Assembleia Constituinte, estabelecimento da laicidade do Estado, além da tripartição de poderes. A manutenção da escravatura foi objeto de intensa discussão, tendo prevalecido o grupo dos escravocratas.
Tais medidas, à vista da atualidade, parecem simplórias. Afinal, o que se buscava à época, o era estabelecer aquilo que, hoje, os revolucionários comunistas pretendem derrubar: um Estado burguês. Contudo, no início do século XIX, ainda vigia em grande parte do mundo os Estados monárquicos absolutistas, que representavam um verdadeiro empecilho ao avanço capitalista.
A revolução pernambucana executou uma tarefa grandiosa para o seu tempo. A título de comparação, seria como hoje, em plena ditadura do capital, um estado brasileiro de grandeza intermediária declarar-se uma República Socialista.
REPRESSÃO BRUTAL
A reação da coroa foi brutal. Por terra, as tropas portuguesas avançaram da Bahia rumo a Pernambuco. A marinha, vinda do Rio de Janeiro, bloqueou o principal porto da região. Havia articulações ousadas dos insurgentes para conseguir apoio dos Estados Unidos da América e da França, prevendo, inclusive, a libertação de Napoleão Bonaparte do exílio, com seu estabelecimento em Recife. Contudo, não houve tempo hábil. Em 19 de Maio, após sucessivas derrotas, o governo provisório foi debelado e os revolucionários, presos ou mortos. Formou-se um tribunal militar para julgar as lideranças, muitas das quais foram condenadas à pena capital pelo crime de lesa-majestade.
Além disso, uma ordem real deu autonomia à Comarca de Alagoas, recompensando os ruralistas que se mantiveram fiéis à coroa e diminuindo consideravelmente o território pernambucano.
Contudo, apesar de derrotada, a Revolução Pernambucana permaneceu vitoriosa nos desígnios da História. Afinal, seus ideais prevaleceram e moldaram, ainda que de forma distorcida, todo o período de domínio burguês. Além do mais, o fato prova de maneira cabal que o caráter revolucionário e aguerrido do povo brasileiro.