Em entrevista ao site da Pública, a deputada estadual em São Paulo pelo Psol, Erica Malunguinho, revela uma confusão profunda sobre a situação política do País. Essa confusão fica exposta nas ideias defendidas pela deputada sobre a luta dos negros no Brasil.
Segundo ela, a esquerda deve “colocar como centro das discussões o debate racial, porque é isso que fundamenta as desigualdades nesse projeto de nação brasileira. Classe é uma consequência de raça em territórios como o Brasil. Esse debate precisa ser fundamento, e não recorte. Não pensar em raça como um fator determinante para as desigualdades nos fragiliza e constantemente nos distancia da maioria da população”. Vejamos o que significa tal ideia.
Para Malunguinho, a classe social estaria subordinada ao problema da raça, ou seja, logo de início é preciso dizer que, segundo essa concepção, não importa se existe por exemplo, um negro burguês ou a serviço da burguesia, ele fará, antes de qualquer coisa, parte de uma parcela explorada da população. Segundo essa ideia, o capitão do mato que agredia os escravos e normalmente eram mestiços, são tão oprimidos quanto os escravos. Se tudo é um problema de “raça”, só pode ser esta a conclusão lógica.
Mas este poderia ser apenas um exemplo distante. Trazendo para os dias atuais, um político burguês de extrema-direita seria tão oprimido quanto um operário negro e mais oprimido do que um operário branco. Com esse raciocínio, seremos obrigados – pelo menos em alguns casos – a defender a burguesia contra um operário. Tudo vai depender da raça de cada um.
Alguns setores da esquerda pequeno-burguesa entendem o oposto de Malunguinho: que só deve ser defendido o negro operário, essa é uma concepção igualmente errada. O negro sofre com o racismo independente da classe social que ele faça parte, mas essa opressão tem o fundamento econômico, não o contrário. Dito de maneira mais clara, a luta pela libertação dos negros é uma luta pela libertação de todos os negros, mas esta defesa não pode ser abstrata como quer a deputada do Psol.
A ideia exposta por Erica Malunguinho tem a vantagem de tornar claro um problema típico da ideologia identitária. Ao colocar como “determinante” a questão da raça, ela esconde que a opressão do negro está baseada na exploração econômica do negro, primeiro durante a escravidão e depois ao ser introduzido como parte da classe operária, inclusive a parte mais pobre da classe operária. Sem que se quebre esse fundamento econômico, não haverá libertação definitiva do negro.
No fundo, a ideia de que a raça se sobrepõe ao problema econômico, ou seja, ao problema de classe, é uma ideologia reacionária, mesmo que os que a defendem possam não ter consciência disso. Em outro trecho da entrevista fica evidente o porquê disso: “outra mestra nossa, a Suely Carneiro, diz ‘entre esquerda e direita, sou preta’. Não estou dizendo que jogo para qualquer lado. É mais do que óbvio que o que me faz estar nesse lugar à esquerda são construções do processo político que de alguma forma se aproximam da luta negra e dos questionamentos da negritude”. A frase “nem esquerda nem direita, os negros” é exatamente a versão identitária da velha política direitista do “nem esquerda nem direita”.
Dessa maneira, Malunguinho abre uma concessão para a direita que até poderia ser defensora dos negros, quem sabe? Já a esquerda, segundo ela, se “parece com a direita” em alguns pontos na questão da raça.
A política, para a deputada do Psol, é uma abstração. Não existe classe social, nem esquerda e direita, só uma abstrata questão racial, que ela não sabe em que se fundamenta. Se a questão de classe está subordinada à racial, ou seja, se a questão racial não se fundamenta em um problema econômico, onde ela se fundamenta? São apenas abstrações sem nenhum fundamento na realidade.
A política da direita, ou seja, da burguesia é a principal inimiga dos negros. Dizer que a questão racial estaria “acima de esquerda e direita” é esconder esse fato e desarmar o povo negro na luta contra a direita.
A luta dos negros só pode ser efetiva quando ele se junta à classe operária. No Brasil, isso é ainda mais importante, já que a esmagadora maioria da classe operária brasileira é negra. Erica Malunguinho acusa a esquerda se “distanciar da maioria da população” por não adotar a sua política racial. Na realidade é exatamente o contrário. É a política da deputada do Psol que está distante da maioria da população, pois concebe uma ideologia sectária, que está em desacordo com os interesses materiais dos trabalhadores.