Imprensa brasileira

Uma defesa cínica dos crimes do imperialismo

Diante de ameaças externas como a OTAN na fronteira russa, qual líder não armaria e mobilizaria sua nação? Acadêmico quer convencer a esquerda de que isso é fascismo

Vicente Ferraro, em artigo na Folha de S. Paulo publicado no último dia 26, afirma que o Brasil sofre de uma visão “russofílica” que romantiza a Rússia como vítima e ignora suas atrocidades na Ucrânia. Vejamos o que diz o autor:

“No Brasil temos um número considerável de russianistas (pesquisadores e jornalistas que estudam a língua, história e política da Rússia), mas pouquíssimos ucranianistas. Quando começou a guerra, as principais análises sobre o conflito foram feitas por russianistas, muitas vezes alicerçados em perspectivas e fontes pró-Kremlin, sem conceder espaço às vozes ucranianas. Há uma visão “russofílica”, em que a Rússia é percebida sempre como a vítima, e nunca como algoz —a despeito de sua expansão territorial, colonização, deportação de minorias e etnocídio nos últimos séculos (vide a sua imensidão).”

Ora, exceto por raros opositores do imperialismo, como este Diário Causa Operária, a imprensa monopolista e até a esquerda dita radical – destacadamente os “trotskistas” – têm tratado o conflito na Ucrânia como uma agressão injusta da Rússia, repercutindo a propaganda do imperialismo liderado pelos EUA. Dizer que faltam “vozes ucranianas” é uma tentativa tola de sensibilizar sobretudo a esquerda.

Além disso, o argumento ignora que, desde o golpe de 2014, orquestrado pelos EUA, a Ucrânia é dominada por um regime fantoche onde quem manda é o governo norte-americano, não os ucranianos. Nada mais natural que seja o imperialismo norte-americano e europeu a “voz ucraniana” na guerra, visto que esse é o setor realmente dominante e que tem interesses no conflito.

Ferraro critica também uma suposta “romantização” da Rússia como herdeira de um “passado soviético idealizado”, acusando Putin de alinhamento com a extrema direita e o neofascismo.

Putin mantém laços com partidos de extrema direita nos países desenvolvidos, como a Frente Nacional na França ou os trumpistas nos EUA, mas não por afinidade ideológica. Trata-se de uma aliança pragmática contra um inimigo comum: o imperialismo neoliberal dos monopólios globais. Hoje, quem enfrenta essa ordem não é a esquerda, mas setores da extrema direita. Nos EUA, Trump, em 40 dias de governo até março de 2025, já desafiou o establishment com tarifas contra importados, cortes no USAID – máquina de golpes de Estado – e ataques à política identitária, medidas que contrariam os interesses imperialistas.

Na Europa, a extrema direita, como na Hungria de Orbán, também resiste à ditadura Dos monopólios, apoiando-se em uma política nacionalista contra a a OTAN e a União Europeia.

No Brasil, a operação militar russa na Ucrânia também apresenta características similares. A extrema direita bolsonarista a criticou, alinhada à política pró-imperialista, ao passo que o presidente Lula, ainda que veladamente, se opôs à política imperialista ao evitar condenações diretas a Moscou. Isso mostra que o apoio a Putin não vem de uma nostalgia soviética, mas de uma rejeição ao domínio dos monopólios – rejeição que une setores distintos contra o mesmo opressor.

Ferraro quer convencer o leitor que a esquerda não deveria apoiar Putin pelo enfraquecimento do Partido Comunista Russo nos anos 1990 ou por supostas “similaridades com o nazifascismo”. Seus exemplos, contudo – mobilização nacionalista, exaltação militarista, expansionismo – são frágeis. Qual líder, diante de ameaças externas como as da OTAN na fronteira russa, não armaria seu povo ou mobilizaria a nação? Acusar Putin de “nazifascismo” por isso é tão absurdo quanto chamar qualquer resistência anticolonial de fascista.

O autor lista traços como “controle dos meios de comunicação” e “defesa da família tradicional” contra a “decadência ocidental”, mas omite o contexto. Os “valores ocidentais” que Putin enfrenta são os movimentos identitários como o LGBT e o feminismo, instrumentos do imperialismo, financiados por ONGs e entidades como a USAID para desestabilizar governos adversários.

Resistir a isso não é “neofascismo”, mas sobrevivência contra golpes. Ferraro ignora que a Ucrânia pós-2014 é um laboratório dessa tática, com um regime sustentado por Washington e dominado por grupos nazistas reais (não o imaginário do autor), como o Batalhão Azov e o Pravyy Sektor, que idolatram colaboradores de Hitler como Stepan Bandera.

Ao denunciar uma suposta “romantização da Rússia”, Ferraro romantiza o imperialismo e seus representantes, como o ex-presidente norte-americano Joe Biden, que armou o golpe de 2014 e transformou a Ucrânia em uma cabeça de ponte da OTAN. Se o nazismo fosse sua preocupação genuína, ele condenaria esses grupos abertamente nazistas, não Putin.

Sua crítica ao governo russo – com clichês como “execução de opositores” e “capitalismo oligárquico” – é um engodo para dar verniz esquerdista a uma posição alinhada ao imperialismo. A guerra na Ucrânia não é uma cruzada de Putin por poder, mas uma resposta a décadas de cerco, que Ferraro minimiza ao negar a ameaça real à Rússia. Enquanto ele chora as “atrocidades russas”, silencia sobre as do regime de Quieve e seus patrões em Washington. É uma defesa cínica do verdadeiro opressor global.

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