No último sábado, dia 15 de março, o portal progressista Brasil 247 publicou uma coluna pelo articulista Jeferson Miola intitulada “Objetivo real com PL da anistia não é anistiar os presos do 8/1, mas provocar confronto e tumulto”. A peça objetiva ressaltar um caráter supostamente golpista dos manifestantes do 8 de janeiro de 2023, incitando a perseguição dos mesmos.
“Ainda em setembro de 2023, cinco meses antes do Bolsonaro lançar a bandeira da anistia em ato na avenida Paulista, a PGR tinha proposto um acordo de não persecução penal a 1.125 denunciados por crimes no 8 de janeiro de 2023 com penas de até quatro anos de reclusão.
“Pelo Acordo, os réus deviam se comprometer a prestar serviços à comunidade, pagar multa de R$ 5.000 a R$ 20 mil [com isenção nos casos de hipossuficiência], participar de curso de 12 horas de duração sobre Democracia, Estado de Direito e Golpe de Estado, e a não manter contas abertas nas redes sociais por dois anos. Com a adesão, também receberiam de volta os passaportes retidos.”
Ou seja, vemos que os “confrontos e tumultos” a que faz menção o título não poderiam ser estimulados caso a acusação farsesca fosse retirada. O acordo em si se configura numa aberração. Ele prevê, como indicado, entre uma série de punições alternativas ao encarceramento, algo previsto em lei para crimes não violentos, o não uso de redes sociais por dois anos.
Para além de o ocorrido no 8 de janeiro de 2023 se traduzir numa manifestação comum, com eventuais depredações que não poderiam ser imputadas a um conjunto de milhares de pessoas, a proibição do uso de redes sociais é uma restrição à liberdade de expressão que não está prevista em lei e opera em flagrante descumprimento à Constituição Federal. Aqui, a PGR propôs a “libertação” dos presos contanto que estes abram mão de seu direito de expressão por dois anos, algo digno de uma ditadura. A sequência de Miola, portanto, pode ser no mínimo caracterizada como cínica:
“Na prática, portanto, o acordo equivale à anistia nos seus efeitos, porque restituía a liberdade imediata à enorme maioria dos golpistas presos.
“Apesar, contudo, da enorme atratividade deste acordo, mais da metade dos 1.125 réus ou recusaram ou não responderam à proposta oferecida pela PGR.
“Na verdade, o objetivo real do bolsonarismo com o Projeto de Lei da anistia não é o de anistiar os condenados do 8 de janeiro de 2023, mas sim provocar confronto e tumulto no país diante da iminente condenação e prisão do Bolsonaro e do núcleo dirigente da ‘organização criminosa armada’.”
Os bolsonaristas seriam provocadores ao não aceitar a perseguição política fascista da PGR com seu “acordo” fajuto. Uma farsa para justificar outra. A própria condenação de Bolsonaro opera no mesmo sentido, sob a intenção de retirá-lo das eleições no ano que vem, e nada mais. Segue o articulista:
“A anistia foi planejada como a bandeira central da extrema-direita para o atual período. Foi lançada por Bolsonaro mais de um ano atrás, no ato da avenida Paulista no dia 25 de fevereiro de 2024.”
Essa bandeira política, no entanto, dependia e depende de que uma ala da esquerda se mantenha no apoio à perseguição política operada desde, principalmente, o Judiciário. Assim, a principal bandeira política da extrema direita, segundo o próprio Miola, depende do apoio da esquerda a uma política que não é de esquerda. Não fosse a sanha repressiva, o reboquismo da esquerda à política da burguesia imperialista, a extrema direita perderia sua principal propaganda de mobilização. Mas Miola, e o setor a que dá voz, não irão abrir mão de continuar em profundo erro político:
“O boicote ao acordo de não persecução penal evidencia o nível de radicalização política e ideológica dos extremistas.
“Com esta postura radicalizada, posam de vítimas da perseguição do STF e alimentam a estratégia do bolsonarismo para promover crise política e caos institucional com o PL da anistia que objetiva, na verdade, garantir impunidade a Bolsonaro, aos militares e a todo bando criminoso.”
Segundo Miola, portanto, não há perseguição política, ainda que seja evidente, ainda que no acordo proposto esteja incluído a retirada de todos os elementos envolvidos do debate público, das redes sociais. Seria tudo uma pose! A floresta de ilegalidades perpetrada pelo Judiciário em nome da perseguição política para o cumprimento de um determinado programa não é o que mina a credibilidade da instituição, mas apenas a pose do bolsonarismo. Seria ridículo acreditar nisso, e nem mesmo se pode crer que o próprio Jeferson Miola acredite.
