O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou na segunda-feira (3) a suspensão total da ajuda militar à Ucrânia, interrompendo o envio de mais de US$1 bilhão em armas e munições já encomendadas ou em trânsito. A decisão foi tomada após uma discussão pública com o ditador ucraniano Vladmir Zelenski na Casa Branca (sede do governo norte-americano), em encontro ocorrido na última sexta-feira (28), marca um aprofundamento da ruptura entre os dois mandatários e sinaliza uma mudança drástica na política norte-americana para o conflito no Leste Europeu, que já dura três anos.
Essa medida afeta desde sistemas de defesa aérea Patriot até munições de artilharia, foi celebrada pelo Crêmlin (sede do governo russo) como um passo rumo à paz, enquanto líderes europeus correm para tentar preencher o vácuo deixado pelos norte-americanos.
Essa suspensão foi formalizada nas primeiras horas de terça-feira (4), segundo fontes da Casa Branca ouvidas por agências de notícias como Reuters e Associated Press. Um funcionário norte-americano, sob anonimato, revelou que Trump justificou a suspensão como parte de uma “revisão” para garantir que os recursos estejam alinhados com o que ele chama de “solução” para o conflito. “O presidente está focado na paz”, disse a fonte à rede norte-americana CNN, enquanto outro funcionário apontou que a medida é uma resposta direta ao que Trump considera “mau comportamento” de Zelenski.
O republicano, que assumiu o cargo em janeiro, já vinha adotando uma postura mais branda em relação à Rússia desde o início de seu mandato. A crise entre Trump e Zelenski explodiu durante uma reunião tensa no Salão Oval da Casa Branca, onde o norte-americano cobrou do ucraniano mais gratidão pelos US$67 bilhões em ajuda militar fornecidos desde 2022 — valor que, somado à assistência econômica, chega a US$120 bilhões, segundo o Instituto Kiel para a Economia Mundial.
“Ele pode voltar quando estiver pronto para a paz”, escreveu Trump no Truth Social enquanto Zelenski ainda estava na Casa Branca, onde permaneceu por apenas 2h20 antes de ser expulso sem a costumeira entrevista coletiva. O estopim foi a recusa do ucraniano em aceitar concessões em um possível acordo com Putin, a quem chamou de “assassino” durante o encontro, exibindo fotos da guerra iniciada há três anos com a invasão russa.
Zelenski, por sua vez, reagiu à suspensão da ajuda na terça-feira, 4, com uma proposta de cessar-fogo parcial publicada no X. Ele ofereceu liberar prisioneiros russos e suspender ataques de longo alcance contra infraestrutura civil e energética, desde que a Rússia faça o mesmo.
“É hora de consertar as coisas. Queremos que a cooperação futura com os EUA seja construtiva”, escreveu, classificando o incidente na Casa Branca como “lamentável”. O ucraniano também se disse pronto a trabalhar “sob a forte liderança de Trump” para um acordo final, sinalizando uma tentativa de apaziguar o norte-americano após dias de críticas republicanas por sua “ingratidão”.
O impacto imediato da decisão norte-americana é incerto, mas analistas estima-se que os estoques atuais de armas, como munições de artilharia e mísseis Patriot, podem sustentar a linha de frente por alguns meses. “Temos uma margem de segurança de cerca de seis meses sem ajuda sistemática dos EUA”, declarou Fedir Venislavskyi, membro do Parlamento ucraniano, à RBC-Ucrânia.
O primeiro-ministro ucraniano Denis Shmyhal afirmou que Quieve já produz 30% de seus armamentos e planeja chegar a 50% até o fim do ano, mas reconheceu: “nossa existência está em jogo.” A dependência de sistemas avançados como HIMARS e ATACMS, usados para ataques de longo alcance, e da inteligência via satélite — incluindo a rede Starlink de Elon Musk —, porém, permanece um calcanhar de Aquiles.
Na Europa, a suspensão gerou alarme e promessas de ação. Ursula von der Leyen, chefe da Comissão Europeia, anunciou em Bruxelas um plano de €150 bilhões (cerca de US$158 bilhões) em empréstimos para impulsionar a defesa europeia, enquanto países como Reino Unido, Alemanha e França intensificam o envio de munições e caças F-16.
Ainda assim, especialistas como Nathalie Tocci, do Instituto de Assuntos Internacionais de Roma, alertam que os europeus carecem da capacidade de substituir totalmente os EUA em áreas cruciais como defesa aérea. “Entre o momento em que conseguirmos suprir essas lacunas e agora, a Ucrânia pagará um preço”, disse ela. A Polônia, ponto de trânsito para armas, já sente o peso da decisão, com seu primeiro-ministro lamentando uma “situação mais difícil”.
O Crêmlin, por meio do porta-voz Dmitri Peskov, saudou a medida como “a melhor contribuição para acelerar o fim da guerra”. Peskov destacou que a pausa pode “empurrar o regime de Quieve para o processo de paz”, mas pediu esclarecimentos sobre os detalhes. Já Putin, que não respondeu diretamente à proposta de cessar-fogo de Zelenski, tem exigido a exclusão da Ucrânia da OTAN e a redução do poder militar dos vizinhos.
Enquanto isso, Trump mantém em aberto um acordo para explorar minerais ucranianos, como terras raras, como forma de os EUA recuperarem parte dos bilhões investidos. “É um grande negócio para os americanos”, disse ele na Casa Branca, prometendo atualizações em seu discurso ao Congresso na noite de terça-feira.
O vice-presidente J.D. Vance reforçou à rede norte-americana Fox News que tal acordo seria “uma garantia de segurança melhor do que 20 mil tropas de algum país que não luta há décadas”. Zelenski, apesar da briga, confirmou que Quieve segue disposta a assinar esse pacto, mas o clima de desconfiança persiste.
Os números impressionam: desde 2022, os EUA forneceram 300 veículos Bradley, 1,3 mil blindados, mais de 5 mil Humvees, 200 obuses de 155 mm com três milhões de projéteis e mais de 100 mil coletes à prova de balas, segundo o Departamento de Estado. O total de ajuda aliada à Ucrânia chega a US$136 bilhões, com os EUA respondendo por quase metade. Agora, cerca de US$9 bilhões em equipamentos pagos, mas não entregues, estão paralisados, conforme estimativas do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. Analistas como Michael Kofman, da Carnegie Endowment, notam que a Ucrânia se adaptou, produzindo drones e blindados próprios, mas a perda de sistemas americanos de ponta pode ser um golpe no médio prazo.
A reação em Quieve foi de revolta misturada com pragmatismo. “Isso é uma Pearl Harbor política”, disse Oleksandr Merezhko, chefe do Comitê de Relações Exteriores do Parlamento ucraniano, comparando a suspensão ao ataque japonês de 1941. Soldados na frente, como o tenente Oleh, em Chasiv Yar, lamentaram, apelando à fantasia: “justo quando começamos a desgastá-los, nossas armas são cortadas.”
Já o Parlamento ucraniano emitiu um apelo a Trump, elogiando os EUA enquanto implorava para que o regime não fosse abandonado. Nas ruas, clipes de promessas norte-americanas passadas circulam como símbolo de traição.
Enquanto Trump pressiona por um cessar-fogo, a suspensão da ajuda militar expõe as fissuras do bloco imperialista e a fragilidade da estratégia que sustentou a Ucrânia contra a Rússia. Após três anos de um conflito que custou centenas de bilhões, arruinou economias europeias e mobilizou EUA e União Europeia contra os russos, o corte sinaliza um ponto de inflexão.
A ditadura mundial, liderada pelo imperialismo norte-americano, pode estar diante de uma derrota monumental: sem o suporte dos EUA, a Ucrânia enfraquece, e a Rússia, que invadiu para barrar a expansão da OTAN, emerge mais forte do que quando iniciou o conflito. O mundo, assim, se aproxima do fim da guerra — mas não como o imperialismo planejara.