Em uma reviravolta judicial, um tribunal em Hamburgo, na Alemanha, declarou que as conclusões da obra de Karl Marx — isto é, o socialismo científico — podem ser “incompatíveis com a ordem básica democrática livre” da nação. A decisão, revelada em detalhes de uma sentença de julho, tem o potencial de criar um precedente perigoso para todos os grupos de leitura e associações marxistas no país. A matéria, publicada pelo jornal turco Harici, expõe os meandros de um caso que, inicialmente, parecia uma vitória para os ativistas, mas que agora poderá se voltar contra eles.
A reportagem do Harici detalha o caso do Fórum Escola Marxista de Política e Cultura, uma associação de Hamburgo que opera desde 1981 e é conhecida por seus grupos de leitura anuais sobre o primeiro volume de O Capital. Em abril, o Fórum havia obtido uma vitória significativa contra o Escritório Estadual de Proteção à Constituição (LfV), que havia classificado o grupo como “extremista de esquerda” em seu relatório de 2021. O tribunal de Hamburgo decidiu a favor do Fórum , determinando que o grupo não poderia mais ser monitorado.
No entanto, o Harici revela que a razão para essa vitória está no cerne do problema. Segundo o jornal turco, a Corte absolveu o Fórum não por considerar suas atividades constitucionais, mas porque seus membros careciam de uma “atitude militante ativa” que pudesse de fato prejudicar a constituição. Ou seja, a associação foi considerada inofensiva.
A fundamentação escrita do tribunal, obtida pelo Harici, vai muito além de uma simples avaliação da atuação do Fórum. O tribunal argumentou que as atividades do grupo, focadas nas teorias de Karl Marx, são “fundamentalmente incompatíveis com a ordem básica democrática livre”. A corte de Hamburgo considera a teoria de Marx problemática em seus pontos fundamentais, afirmando que o conceito da “ditadura do proletariado” é inerentemente antidemocrático, pois “exclui inevitavelmente outros grupos populacionais do processo de tomada de decisões políticas e do exercício indireto do poder estatal”.
Essa visão contrasta com a de outras cortes alemãs, como o Tribunal Administrativo de Berlim, que, em um caso anterior envolvendo o jornal Junge Welt, afirmou que uma orientação marxista por si só não constitui um esforço para derrubar a ordem democrática.
O Harici cita o advogado do Fórum, que classificou as declarações da corte como “irresponsáveis”. Segundo Ciftci, a decisão sugere que a mera leitura de Marx é inconstitucional, e que qualquer associação que se refira a ele “poderia, portanto, se tornar um objeto de vigilância”.
O Harici também destaca a visão dos membros do Fórum. Michael Hopp, um dos membros da associação, argumenta que a corte está interpretando de forma equivocada a natureza da teoria de Marx.




