Europa

Starmer anuncia reconhecimento da Palestina, porém ‘sem Hamas’

Partido palestino reagiu com moderada celebração, creditando anúncio como "resultado merecido da luta, da firmeza e dos sacrifícios", mas cobra "medidas práticas" contra genocídio

O primeiro-ministro britânico e notório sionista Keir Starmer anunciou no último domingo (21) que o Reino Unido reconhecerá oficialmente a Palestina como Estado, acompanhado pelos governos do Canadá e da Austrália. O gesto foi imediatamente celebrado por setores da imprensa internacional como um marco diplomático, mas requer uma análise mais concreta do que de fato significa.

Em seu anúncio, por exemplo, Starmer condicionou a existência de um Estado palestino soberano à extinção do Hamas, partido que governa Gaza desde que conquistou a esmagadora maioria das cadeiras no Parlamento palestino, nas eleições de 2006, mesmo com todo o apoio do imperialismo ao partido governante da Autoridade Palestina (AP), o Fatá. “Não pode haver lugar para o Hamas em qualquer governança futura na Palestina”, declarou o primeiro-ministro britânico, deixando claro que a medida não visa garantir a autodeterminação dos palestinos, mas para conseguir por manobras e golpes publicitários o que o imperialismo não conseguiu com as armas: acabar com a Resistência Palestina.

Ainda que o anúncio represente uma mudança formal nas posições desses governos, a decisão não altera em nada o status da Palestina na Organização das Nações Unidas: o país segue apenas como observador não membro, sem qualquer soberania real no organismo. A condição imposta por Starmer demonstra o caráter farsesco do reconhecimento. O imperialismo pretende usar a bandeira da “criação de dois Estados” para golpear o povo palestino, pressioná-los a se oporem ao Hamas e com isso, consolidar a ditadura sionista.

O golpe ficou ainda mais evidente com a presença do ex-presidente norte-americano Donald Trump, que visitou Londres dias antes do anúncio. Em coletiva ao lado de Starmer, Trump discordou da decisão, mas em tom amigável, encerrando a conversa com um tapinha nas costas no britânico. O gesto, mais simbólico do que qualquer declaração, demonstrou que a medida não significará atrito entre os EUA e o Reino Unido, já que se trata de uma encenação cuidadosamente controlada pelo próprio imperialismo.

A decisão dos três países se soma a uma lista de mais de 140 governos que já reconheceram formalmente a Palestina. No entanto, nenhum deles conseguiu efetivar mudanças concretas no plano internacional, pois qualquer tentativa de transformar esse reconhecimento em soberania plena é barrada pelo Conselho de Segurança da ONU, onde os Estados Unidos mantêm o poder de veto. A cada resolução em favor de um cessar-fogo imediato em Gaza, a principal potência imperialista do mundo atua diretamente para proteger seu enclave no Oriente Médio, como aconteceu na última quinta-feira (18), quando pela sexta vez bloqueou a medida apoiada pelos outros 14 membros do Conselho.

Se a manobra é um golpe, é também resultado de uma forte pressão interna sobre Starmer. O primeiro-ministro britânico enfrentava protestos massivos em várias cidades do país, com multidões enchendo as ruas em solidariedade à Palestina. Mais de um terço de seu gabinete e cerca de 130 parlamentares do Partido Trabalhista já haviam se manifestado pela medida. Além disso, pesquisas e manifestações mostraram que a população britânica, em sua maioria, apoia a causa palestina e tem desafiado a brutal repressão estatal do Reino Unido para expressar esse apoio.

O peso da história britânica na região torna o anúncio ainda mais revelador. Foi o governo do Reino Unido que, por meio da Declaração Balfour de 1917, lançou as bases para a criação do país artificial que viria a se tornar “Israel”. Durante o período do mandato britânico, leis ditatoriais usadas até hoje pelo regime sionista foram impostas contra os palestinos. O próprio imperialismo britânico admite que tem uma “responsabilidade especial” no assunto, mas seu objetivo nunca foi reparar a opressão histórica, e sim controlar a região.

O número de mortos palestinos já ultrapassa 64 mil, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, embora estimativas apontem que o número real pode ser imensuravelmente maior. Tal massacre e destruição, no entanto, não impediram que Starmer usasse sua demagogia para afirmar que busca um “Estado palestino viável” ao lado de um “Israel seguro”. Ocorre que o imperialismo chama de viabilidade é, na prática, a liquidação de qualquer força política que ofereça resistência à ocupação sionista e a submissão total da população a um governo fantoche.

Mesmo que a decisão seja apenas simbólica, não deixa de ser uma vitória parcial para os palestinos. O imperialismo não teria tomado tal medida se não estivesse acuado pela resistência heroica do povo de Gaza e pela firmeza do Hamas, que há quase dois anos, enfrenta a poderosa máquina de guerra da ditadura sionista. O reconhecimento da Palestina pelos governos britânico, canadense e australiano é antes de tudo uma manobra: procura enfraquecer a luta de libertação ao mesmo tempo em que tenta manter o controle político da região.

Ainda assim, o fato de a manobra ser necessária mostra, por outro lado, que a luta palestina começa a impor limites ao imperialismo. Ao ter de recorrer a esse tipo de encenação, o imperialismo revela que não consegue mais sustentar a mesma posição de antes. Se não é ainda uma vitória decisiva, é, sem dúvida, um avanço importante: mesmo pela via da demagogia, o inimigo se vê forçado a ceder e reconhecer aquilo que sempre negou: a existência de um Estado palestino.

Em nota publicada no canal Resistance News Network, no Telegram, o partido revolucionário palestino reagiu com uma moderada celebração, creditando o reconhecimento do Estado palestino por uma das três principais potências imperialistas do mundo como “resultado merecido da luta, da firmeza e dos sacrifícios de nosso povo no caminho para a libertação e o retorno”, mas que “deve ser acompanhado por medidas práticas que levem a uma interrupção imediata da brutal guerra de genocídio”. Eis a nota traduzida do Hamas:

Declaração do Hamas

Em nome de Alá, o Clemente, o Misericordioso.

Comentando sobre o reconhecimento do Estado da Palestina por Grã-Bretanha, Canadá e Austrália, e o anúncio de uma série de países sobre sua intenção de reconhecer o Estado palestino, nós, no Movimento de Resistência Islâmica (Hamas), afirmamos o seguinte:

  • Este reconhecimento é um passo importante para reafirmar o direito de nosso povo palestino à sua terra e locais sagrados, e de estabelecer seu Estado independente com Al-Quds como capital. É um resultado merecido da luta, da firmeza e dos sacrifícios de nosso povo no caminho para a libertação e o retorno.
  • Este importante passo deve ser acompanhado por medidas práticas que levem a uma interrupção imediata da brutal guerra de genocídio contra nosso povo palestino na Faixa de Gaza, e a um enfrentamento dos projetos de anexação e judaização na Cisjordânia e em Al-Quds.
  • Convocamos a comunidade internacional, as Nações Unidas e suas instituições a isolarem esta entidade criminosa, a interromperem todas as formas de cooperação e coordenação com ela, a intensificarem as medidas punitivas contra ela e a trabalharem para levar seus líderes criminosos de guerra aos tribunais internacionais, responsabilizando-os por seus crimes contra a humanidade.
  • O governo de ocupação fascista insiste em continuar seu desafio às leis, convenções e normas humanitárias internacionais, e comete as violações mais hediondas contra nosso povo, de acordo com políticas declaradas de genocídio, limpeza étnica e deslocamento forçado. Isso agora exige posições claras e eficazes para contê-lo.
  • A resistência e a luta de nosso povo palestino contra a mais hedionda ocupação conhecida na história moderna é um direito natural garantido pelo direito internacional. Os países do mundo devem apoiar nosso povo no enfrentamento a esta ocupação criminosa, até que lhes seja permitido exercer seu direito à autodeterminação e estabelecer seu Estado palestino independente com Al-Quds como capital.

Movimento de Resistência Islâmica – Hamas

Domingo: 29 de Rabi’ al-Awwal 1447 AH

Correspondente a: 21 de setembro de 2025 DC

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