Tem ganhado força nas redes sociais a agitação em torno do movimento “sem anistia”. Sobretudo agora, com o julgamento farsa de Bolsonaro, isso tem se tornado cada vez mais notório. Apesar desse burburinho, não há a menor chance de isso se tornar uma campanha de massas, e mais significativo ainda é que os setores da esquerda à frente dessa iniciativa não percebam que seu fracasso é inevitável.
O primeiro motivo pelo qual o fracasso é uma certeza é que o julgamento dos réus do 8 de janeiro é impopular. Ninguém acha normal aplicar 14 anos de cadeia a uma pessoa que pichou uma estátua com batom, ficando esse papelão ridículo circunscrito apenas a despreparados como André Janones, que não só considera isso algo razoável como pediu inclusive penas maiores para a mulher que fez isso, mostrando que às vezes o ridículo parece não ter limites.
O segundo motivo são as arbitrariedades judiciais e notórias ilegalidades cometidas no processo. Os vídeos divulgados por Alexandre de Moraes sobre a delação de Mauro Cid deixam absolutamente claro que a ilegalidade é o padrão desses inquéritos. Ameaçar prender a esposa, filha e pai do réu durante um inquérito caso ele não fale o que o juiz quer ouvir é algo totalmente ilegal. Isso sem falar que Xandão negou o acesso à totalidade do processo pela defesa dos acusados, uma barbárie jurídica absoluta. A esquerda não se dá conta de que tais flagrantes ilegalidades já pavimentam o caminho para uma anulação total desse processo, tal qual foi a Lava Jato? Quando a burguesia quiser, todo esse processo irregular será prontamente cancelado.
O terceiro motivo é que os golpistas de 2016 são aliados desse movimento sem anistia, dentre eles o próprio Alexandre de Moraes. Como é possível combater um suposto golpe com golpistas? No máximo, você está preparando a situação para que os golpistas mais experientes te deem um novo golpe mais tarde. No meio de toda essa perseguição, não há qualquer movimento ou sequer menção a processos contra os golpistas de 2016, o que já deixa claro que o “sem anistia” não os alcançará e que eles continuarão impunes.
Por fim, o quarto motivo é que nesse movimento não há uma pauta reivindicatória de reformulação das forças armadas. Não há uma tentativa de mudar a doutrina militar, nem seus mandachuvas. Vale notar que atualmente há 360 generais na ativa e mais de 5 mil na reserva, e não é a investigação de meia dúzia de militares que vai mudar algo. Lula teve uma chance de ouro de mudar significativamente a estrutura das forças armadas imediatamente após o 8 de janeiro, uma vez que havia amplo apoio político para isso, mas não atuou em consequência. Isso pavimentou o caminho para que as forças armadas sigam intocadas e funcionando normalmente como um antro golpista, mais uma vez apontando o fracasso do “sem anistia”.
A esquerda está completamente perdida. Em vez de reivindicar pautas como a eleição dos juízes para o STF, o fim da censura e a ampliação da participação popular nas decisões políticas, insiste em apoiar medidas ditatoriais que apenas ampliam a força do estado capitalista que nos rege. O resultado desse processo é óbvio: cedo ou tarde todas essas condenações serão anuladas e o “sem anistia” se transformará em uma anistia irrestrita para todos os golpistas, de ontem e de hoje. O problema é que até lá o aparato de repressão estatal estará muito mais forte e apenas aguardando um direitista tomar posse dele, para, aí sim, empreender uma perseguição total contra a esquerda. Nessa hora, burburinhos de redes sociais não resolverão nada, e os que pedem “sem anistia” irão se esconder debaixo da cama como em 2016.