O jornalista Hélio Schwartsman publicou, na última sexta-feira (28), o artigo De perto, todo mundo é inocente, no jornal golpista Folha de S. Paulo, defendendo que o direito não pune atos isolados, mas o “contexto” em que ocorrem. Para ele, os atos de 8 de janeiro de 2023, incluindo os de Jair Bolsonaro (PL) e da cabeleireira Débora de Santos, só se tornam crimes por causa da trama golpista contra Lula. O que o autor não explica, porém, é como um regime que julga e condena por “contexto”, e não por atos concretos previstos em lei, pode ser chamado de democrático? Schwartsman acha que isso salva a democracia, mas o argumento não resiste à lógica: o que ele defende é o arbítrio, base de qualquer ditadura.
Schwartsman escreve: “o dedo do assassino se apoiava sobre o gatilho da pistola que estava direcionada para seu alvo” e “é o contexto e não só o gesto que faz dele um criminoso”. Sobre o 8 de janeiro: “o contexto não favorece Bolsonaro, seus corréus nem a turma do 8/1” e “o que eles fizeram e deixaram de fazer se inscreve numa trama que tinha por objetivo não entregar o poder a Lula, o que basta para ressignificar suas ações e omissões como delitos contra a ordem democrática.”
Para ele, a cabeleireira que pichou uma estátua com batom merece punição não só pelo ato, mas por integrar um grupo que “tentou derrubar a democracia”. O problema é que nenhum código penal do mundo civilizado pune “contexto” — pune ações definidas em lei.
Ocorre que em um verdadeiro Estado democrático de Direito, um cidadão só vai pra cadeia por um ato concreto, previamente tipificado em lei. O dedo no gatilho citado como exemplo pelo jornalista não se transforma em crime por “contexto”, mas se o tiro sai e acerta alguém, ferindo ou matando a pessoa. A materialidade da ação é fundamental para que haja um crime.
Schwartsman mistura isso com “contexto” e acha que a intenção ou a trama por trás do ato basta para condenar. Mas o direito não pune subjetividade. No caso da cabeleireira, o ato foi passar batom numa estátua — dano ao patrimônio, no máximo.
Os 14 anos de pena propostos não vêm da ação em si, mas da interpretação subjetiva dada a ela, de que seria uma “tentativa de golpe”, algo que a lei não define como crime dela. Onde está o golpe na mão que segura o batom? Isso é julgamento por suposição, não por prova.
Bolsonaro, que estava nos EUA em 8 de janeiro, também entra na dança do “contexto”. Schwartsman diz que ele não precisava estar em Brasília pra ser culpado, porque o plano de impedir Lula já ressignifica suas ações. Mas que ações? Discursos? Reuniões? Nenhuma lei penal brasileira condena alguém por falar ou pensar em golpe — é preciso o ato. Sem ato concreto, o “contexto” vira um cheque em branco para prender qualquer um por qualquer coisa.
Esse jeito de julgar não é novidade. Na Ditadura Militar, punia-se por “contexto”: fazer uma passeata ou criticar o regime era crime se o juiz achasse que ameaçava a ordem. Não precisava de resultado — a intenção bastava.
Na Idade Média, acusavam de bruxaria pelo “contexto”. Schwartsman acha que isso protege o que se entende por um regime democrático, mas é o oposto: quando o juiz decide o que é crime baseado em “contexto” e não na lei, o direito vira ferramenta de quem manda.
O STF que julga Bolsonaro é o mesmo que derrubou Dilma em 2016 num impeachment sem base legal. Se era arbítrio ontem, por que seria “democracia” hoje?
Schwartsman quer condenações para “dissuadir” futuros golpistas, o que também foge completamente ao escopo do direito penal, que em sociedades verdadeiramente democráticas, não pune “para dar exemplo”, mas conforme a lei. Quando a lei é substituída por “contexto”, quem define os infelizes que serão reprimidos são os juízes — os mesmos de 2016, a esquerda deve sempre lembrar.
Na prática, o povo não decide nada: o STF julga, o BC controla o dinheiro, e o bolsonarismo segue nas ruas. Punir por “trama” ou “intenção” é dar poder ilimitado a quem interpreta, como na ditadura. A cabeleireira pega 14 anos por batom porque o “contexto” a fez “golpista”. Bolsonaro pode ir preso por discursos, não por atos. Isso não é lei — é vontade política.
Um regime que prende por “contexto” não tem nada de democrático. É arbítrio puro, onde a lei vira o que o juiz quer. O Brasil de hoje, com o Judiciário mandando, o BC contra o povo e o bolsonarismo vivo, não é democracia fortalecida — é ditadura com outro nome. Schwartsman pode chamar de justiça, mas é só o velho autoritarismo de cara nova.




